2011 agosto at Blog Ayrton Marcondes

Arquivo para agosto, 2011

O espírito de corpo

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Pode ser chover no molhado, mas temos o dever à indignação em relação à atitude dos deputados que negaram a cassação do mandato da deputada Jaqueline Roriz (PMN-DF).  Todo mundo assistiu ao vídeo no qual a deputada foi flagrada recebendo dinheiro do pivô do recente escândalo do mensalão do DEM no Distrito Federal. Entretanto, esse fato não bastou para que seus pares a punissem. Agarrados ao incrível argumento de que o fato ocorreu antes de Jaqueline ser eleita deputada, votaram contra a cassação.

Esse “o passado não importa” é aviltante. Um deputado compareceu indignado à tribuna para discursar, dizendo que se alguém tiver cometido algum crime antes de ser eleito, ato de pedofilia, por exemplo, isso não importa o que é um absurdo. Dedução correta, lógica, mas que não resolve o problema.

O comentário geral em toda a mídia é o de que prevaleceu o espírito de corpo. Os deputados que votaram contra a cassação olharam para os seus passados e temeram que algum fato comprometedor fosse descoberto e resultasse em cassações. O oposto a esse raciocínio é imaginar que os deputados que preservaram o mandato de Roriz estivessem realmente convictos de que o passado não importa o que é ainda pior.

Por detrás dessa ultrajante situação está um sistema corporativista que visa preservar a si mesmo acima das circunstâncias. Por outro lado, deve-se lembrar de uma enorme parcela do eleitorado brasileiro da qual o mínimo que se pode dizer é que vive em estado permanente de alienação. Trata-se da massa pública manipulável através de promessas e discursos vazios, pessoas que reelegem parlamentares cujo passado de tramoias foi anteriormente exposto publicamente. Parlamentares que renunciaram a seus cargos para não serem cassados retornam à Câmara sem a menor dificuldade nas eleições seguintes, eleitos que são pelos seus currais eleitorais, cativos de sua eloquência, promessas e favores.

O pior, porém, é dizer tudo isso, repetir o que afinal todo mundo sabe e concluir que o cidadão comum nada pode fazer dado que a única atitude a seu alcance é a de punição pelo voto. Mas seria preciso que essa punição fosse coletiva para que os pratiquem crimes sejam afastados da política. Infelizmente esse tipo de solução carece de amadurecimento de grande parcela de eleitores o que não se espera em curto prazo. Isso somado ao fato de que os brasileiros não são dados a protestos deixa a situação exatamente como está, ainda que revoltante.

Tempo para leitura e os pockets

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Sempre tenho pela frente uma lista de livros para ler, alguns novos, outros lidos há muito. Vez ou outra me lembra de um texto e me meto a achá-lo para reler. Dias atrás aconteceu em relação a um conto de Julio Cortázar que eu supunha fazer parte de um livro e estava em outro. Mas, há livros que eu gostaria muito de reler e não encontro tempo para isso. Um deles é o D. Quixote, de Cervantes, outro a Divina Comédia, de Dante. No caso desse último ocorre que eu o separei e comecei a reler, mas parei por conta de falta de tempo. Depois a obra começa pelo inferno e digamos que naqueles dias eu não estava a fim de mergulhar nos segredos das profundezas. O inferno de Dante é mesmo dantesco… Aliás, em relação ao outro mundo, vale dizer que se as coisas forem como dizem por aí o melhor é prolongar a vida aqui no planeta, ao máximo. Recentemente, o filme “Nosso lar”, baseado na obra homônima de Chico Xavier, mostrou cenas do lugar para onde vão os espíritos após a morte. Pior impossível. E, a ser como descreveu o grande médium, os espíritos permanecem ali por longo tempo enquanto sanam alguns de seus problemas até que adquiram o direito de seguir para uma instância superior. Mas, mesmo nessa as coisas não são fáceis: há que se adaptar à nova morada e tornar-se útil à comunidade que nela vive. Do que se deduz que a provação que já é esta vida continua depois da morte. Convenhamos: pouco convidativo e, sinceramente, não dá nenhuma vontade de morrer.

Voltando aos livros, sempre tive a paixão pelos grandes painéis com a riqueza de detalhes que por vezes espelham épocas. Obviamente esse modo de ver se ressente da possibilidade de inúmeras falhas, a começar por erros de visualização e interpretação. Em todo caso o melhor jeito de abarcar um grande número de informações sobre um dado período, ainda que curto, ainda é a leitura de matérias sintéticas sobre assuntos que estão fora de nossa área de interesse. Esses assuntos são parte integrante de um contexto e simplesmente não podem ser abandonados sob o risco de nos ocuparmos apenas do principal, deixando de lado detalhes que certamente ajudam a entendê-lo e explicá-lo. Talvez desse fato tenha eu desde logo sentido grande atração por algumas obras que tratam das generalidades sobre alguns temas que não elejo como de meu interesse prioritário.

O que quero dizer é que, talvez para escândalo de alguns puristas, não é de modo algum desmerecedora a leitura de obras generalistas que se ocupem apenas da parte principal de um assunto. Se pela necessidade de minha formação profissional fui levado a ler todos os tomos da obra de Freud isso não significa que um engenheiro voltado para as matemáticas tenha que fazer o mesmo. Daí que para essa pessoa a leitura de um breviário sobre Freud e sua obra talvez seja suficiente paara matar sua curiosidade pessoal e enriquecer seus conhecimentos, quem sabe até atraindo-o para um mergulho mais profundo na obra do grande psicanalista.

Escrevo sobre isso porque me parece que num mundo de muita pressa e pouquíssimo tempo são muito benvindas as edições de bolso de alguns livros, entre os quais se destacam biografias e ensaios curtos sobre a vida e a obra de personagens que foram e são importantes no terreno das ideias. Digo isso porque dias atrás, a título de dar uma olhada em assunto que foge à minha área de atuação adquiri uma biografia de John Maynard Keynes em livro de bolso. Sinceramente, não tinha a intenção de ler o livro, mas apenas a de correr os olhos em algumas páginas. Eis que, entretanto, comecei a ler as primeiras páginas e fui levado pelo texto, muito interessante, ao final. De fato, para quem não conhece ou pouco sabe sobre Keynes a biografia escrita por Bernard Gazier é um ótimo investimento. Não servirá para economistas ou pessoas ligadas à área da Economia. Para esses Keynes é mais que conhecido, sendo suas teorias econômicas assunto para discussões e tomada de decisões. Entretanto, para pessoas de outras áreas, os que conhecem no máximo uma notícia sobre Keynes, o “pocket” torna-se muito interessante e, talvez, em alguns casos desperte até mesmo o interesse a ler textos de autoria do próprio  Keynes.

E assim caminha a humanidade, com Rock Hudson, James Dean e toda a trupe de atores já mortos, mas muito vivos na tela do cinema. E como isso nada tem a ver com o que foi escrito antes, fica assim mesmo.

Horror sem fim

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A cena se passa num hospital. Soldados encontram os corredores vazios, sem médicos e enfermeiros. Quando entram nos quartos deparam-se com cadáveres sobre os leitos, muitos deles em avançado estado de putrefação. Os cadáveres são  de soldados líbios e mercenários que combatiam nas tropas de Gaddafi. Feridos, estavam internados no hospital quando os revoltosos entraram em choque com as tropas leais ao governo, em Trípoli. Em meio aos combates o pessoal de atendimento do hospital debandou, deixando os feridos nos leitos. Abandonados, a morte sobreveio nos dias seguintes, resultando nas terríveis cenas encontradas pelos revoltosos.

Não é um filme de horror: trata-se de realidade inimaginável em que feridos impossibilitados de se mover observam a morte de outros e aguardam, por um período longo e terrível, as próprias mortes. Talvez nem mesmo Stephen King conseguisse engendrar quadro mais dramático e desolador.

Mas, a guerra continua. Os revoltosos avançam e invadem os domínios particulares de Gaddafi. Aqui um avião de alto luxo que servia ao uso do ditador; acolá os aposentos luxuosos onde ele vivia. Uma foto mostra rebeldes sentados em poltronas ou banhando-se na piscina da residência do ditador. Nas mãos de um homem, mal vestido e em pé, a inseparável metralhadora. No chão, espalhados, restos e escombros de uma era que finalmente se encerra.

O que será da Líbia a partir de agora? Especialistas veem com bons olhos a deposição do ditador e um novo governo que possa ser democrático. O risco de luta pelo poder entre os insurgentes existe, sendo possível a situação descambar para a guerra civil. Há sofrimento à frente a esperar pelo povo líbio. Enquanto isso o mundo assiste a uma distância prudente a mais esse espetáculo pontilhado por sonhos democráticos e muita barbárie.

A guerra é um vale-tudo no qual a engenhosidade de ações inumanas jamais se esgota. Há sempre algo de novo e absurdo a ser experimentando num território onde a bestialidade humana torna-se desenfreada. A Líbia passa neste momento pelo transe da indefinição que pode gerar mais massacres, afinal guerra é guerra e na vigência dela a vida pouco ou nada vale.

Execuções sumárias

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Não sei como se pode correr os olhos, com alguma indiferença, nessas fotos de corpos de vítimas de execução sumária. Um gole de chá quente entre uma e outra virada de página de jornal fornece a dimensão exata desse “não é comigo”, da observação superficial de algo real tomado como ficção.

Estão por toda parte as fotos de corpos de pessoas executadas em Trípoli. O regime da Gaddafi vai sendo desmantelado pelos revoltosos com o apoio de alguns países que se apressam a aderir ao discurso de aprovação da revolta. De repente os que toleraram Gaddafi por tanto tempo, os que se acomodaram aos investimentos do ditador, apontam do dedo contra ele. Reação tardia e interesseira porque o sofrimento dos líbios não começou com o início da revolta. A diplomacia brasileira continua reticente em reconhecer os rebeldes como representantes legais do país, mas posiciona-se contra o autocrata Gaddafi e pede mudanças. Como em outras situações ocorridas no período em que Celso Amorim era chanceler, continuam a existir motivos para que o Barão do Rio Branco não consiga descansar em paz.

O telefone toca, um amigo avisa que passará agora em casa para irmos ao churrasco do fim-de-semana. Logo depois estamos todos juntos, os de sempre, rindo e comendo carne até que Julia nos chama para ver algumas fotos do grupo, outras de conhecidos nossos, tudo como sempre, numa delas estamos abraçados, noutra o Enrico cortando carne, até que na tela aparece a foto de corpos com as mãos amarradas e cabeças dentro de um saco, cadáveres executados friamente em Trípoli, depois mais uma foto da filha de um amigo, outra de corpos estendidos e um ruído de tiros, de guerra que não para em meus ouvidos, tudo isso se confundindo na memória para estragar o dia enquanto o gosto do vinho italiano que o Alfredo trouxe vai provocando um paladar de sangue, fazendo-me contrair os lábios enquanto os amigos comentam e riem das fotos, uma após outra, dizendo que ficaram muito boas.

Ainda a renúncia de Jânio

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Passados 50 anos desde a renúncia de Jânio Quadros à Presidência da República, o assunto ainda incomoda. O homem da vassoura e dos bilhetinhos era proprietário de presença e carisma que os jovens de hoje simplesmente não podem imaginar. Estudar a atuação dele através de manuais de História, recorrer a pronunciamentos gravados, bisbilhotar velhos documentos, nada disso logra devolver a imagem de Jânio dentro do contexto do Brasil que o elegeu presidente e assistiu, estarrecido, à renúncia ao cargo de primeiro mandatário do país.

Não é o caso de aqui recordar as marchas e contramarchas do governo Jânio Quadros, nem mesmo o particular modo que tinha ele de fazer política e governar. Já vão longe aqueles dias de um país de terceiro-mundo e subdesenvolvido, imerso em inflação e funcionando a reboque de imposições interacionais muitas vezes maiores que as observadas hoje em dia. Foi num palco pleno de controvérsias e necessidades urgentes que Jânio teve a oportunidade de exercitar sua familiaridade incontestável com o poder e seu desapreço pela opinião. Voltado para si, ego inflado por uma inteligência arrogante e tantas vezes destrutiva, dava-se o então presidente ao luxo de atitudes insólitas que por vezes transpareciam simples provocações. De fato, Jânio era homem de outra latitude, diferente de seus próximos. Sua figura incomum, as qualidades de verdadeiro ator, o domínio das palavras, a estudada impulsividade, a teatralidade utilizada em seus discursos, as promessas de austeridade, tudo isso fez de Jânio, mais que promessa, uma esperança para os brasileiros.

Esperança que ele traiu, sem mais nem menos, num acesso de irresponsabilidade cujas causas até hoje despertam as mais variadas explicações. O que mais se lamenta no episódio da renúncia não é o ato propriamente em si, embora a ele se dirijam as maiores atenções quando se fala em Jânio Quadros. O que mais se lamenta é o que veio depois, o conjunto de acontecimentos que desaguaram no longo período ditatorial que só veio a se encerrar na década de 80 do século passado.

Meninos eu vi pessoas chorando naquele trágico 25 de agosto de 1961, o dia da renúncia. Vi pessoas andando nas ruas, cabisbaixas e silenciosas, convencidas de que uma grande hecatombe abatera-se sobre o Brasil. Ouvi as notícias desencontradas que circulavam por toda parte, algumas delas informando que talvez a renúncia fosse reversível. Dia triste e de luto aquele 25 de agosto, dia de destemperos e tristezas.

Autogolpe? Alcoolismo? Loucura pura e simples? Tentativa de se tornar ditador? Não se sabe. Hoje, decorridos 50 anos, o neto de Jânio escreve ter ouvido do avô que, ao assumir a presidência, não sabia da verdadeira situação político-financeira do país. Quanto à renúncia Jânio disse ao neto que não pensou que ela de fato viesse a se efetivar. Esperava ele um levante popular e que os militares e a elite impedissem a posse de Jango.

Foi por isso? Em se tratando de Jânio é preciso ouvir a explicação que deu ao próprio neto com reservas. Em quem passou a vida querendo ser lembrado como um mito, cercando-se de mistério e não se deu ao trabalho de explicar-se aos que nele confiaram definitivamente não se pode acreditar.

Se o assunto é Jânio Quadros, então todas as explicações são possíveis.

Estado de violência

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Uma juíza é barbaramente executada e desperta revolta da opinião. Ato contínuo veiculam-se notícias sobre juízes ameaçados de morte em todo o país. Um deles, entrevistado, declara morar longe da família para protegê-la. No mais, sempre é acompanhado por seguranças e diariamente vê-se obrigado a percorrer caminhos diferentes para chegar ao trabalho.

O juiz entrevistado é um homem jovem. Leva a sério sua profissão e função. Sacrifica a vida pessoal em nome do que acredita. Embora seja pessoa do bem o fato é que vive encarcerado, pagando alto preço pelo exercício da sua profissão. Nem é o caso de perguntar a ele se vale a pena. Pode não valer a pena para a maioria das pessoas, mas para ele certamente vale.

O que se explica, mas não se entende é a vigência de um estado de violência no país.  É a violência a governar a vida. Inserida no contexto diário das pessoas a violência pode se apresentar a qualquer um, inesperadamente. Atores para colocá-la em ação não faltam: uma horda de criminosos circula pelas ruas, a maioria deles capaz de atitudes inconsequentes. Matar ou morrer, não importa. Agindo por instinto, prontos a matar alguém ou morrer em ação, está em andamento uma nova estirpe de seres para quem a vida carece de qualquer valor. Nenhuma lógica logra acrescentar sentido a ações altamente arriscadas e perigosas nas quais tudo pode acontecer. Daí lermos diariamente que, durante um assalto, alguns criminosos fugiram enquanto outros foram mortos. A troca de tiros com a polícia, as mortes em ambos os lados, já pertencem ao domínio do inevitável que tem lugar no cotidiano e passa a ser aceito como fatalidade.

Agora surgem as crianças que agem em grupo na região do metrô Ana Rosa, em São Paulo. Tentaram assaltar um hotel, depredaram uma instituição que cuida de menores e mostraram agressividade incomum. Crianças. Algumas, com menos de 12 anos de idade, foram devolvidas às ruas, lugar onde vivem. A legislação não prevê encaminhamentos para menores de 12 anos, irresponsáveis legalmente. Em relação a isso muito pode se dizer, mas nada que resolva o problema. Tal atitude depende de outras, é preciso mudar a lei que, por sua vez, depende de estudos e aprovação e por ai vai de modo que o problema permanece.

O estado de violência abre suas entranhas e exibe, publicamente, o ventre no qual o mal é gerado.  Até então assistíamos ao ritual de violência, fingindo desconhecer as origens dele. Agora o berço emerge da escuridão e - coisa terrível  - mostramo-nos pasmos e sem saber o que fazer com uma bando de crianças atraídas pela delinquência.

O mundo virtual na educação

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Devagar e custosamente a figura do professor vai cedendo lugar a recursos tecnológicos. A frase anterior é desmentida pelos membros de empresas que oferecem tecnologia para a área educacional. Insistem eles que o professor é – sempre foi e será – indispensável. Sem ele, sem o conhecimento que ele transmite e coordena, tudo perde o sentido.

A questão é controversa. Bons professores são de fato indispensáveis. O problema é que o espaço destinado ao professor tem sido invadido por toda sorte de engenhocas eletrônicas que teoricamente o ajudam a ensinar. Esse “teoricamente” precisa ser explicado. Se por um lado é verdade que as novas gerações cada vez mais e precocemente se identificam com o uso de novas tecnologias, o mesmo não acontece com professores. Profissionais dedicados e geralmente imersos num mundo de inúmeras aulas e intermináveis correções os professores raramente dispõem de tempo para inteirar-se sobre os recursos por vezes colocados ao seu alcance. Além disso, há que se lembrar que boa parte dos profissionais mais velhos nem sempre se dão bem com computadores e máquinas que a eles se filiam. Que não se enganem: a informática ainda não é lugar comum na vida de todas as pessoas. Se a internet com comunidades sociais e outras prerrogativas atrai cada vez mais usuários o certo é que nem todos eles estão aptos a utilizar as possibilidades que os sistemas informatizados oferecem. Nasce dai a dicotomia entre a oferta de recursos considerados indispensávis e a falta de capacitação do pessoal que deveria estar apto a utilizá-los.

Mas, o problema não se restringe à falta de tempo ou meios de capacitação. No caso de professores não é incomum a resistência a mudanças num processo de trabalho já solidificado ao longo dos anos. Em outras palavras, adquire-se um modo de ensinar que parece resolver os problemas em classe e é mais fácil de desempenhar. Substituir a prática de sempre e mudar é difícil ainda mais recordando-se que nem sempre esse esforço é compensado financeiramente.

Entretanto, especialistas e entendidos em educação classificam o uso de recursos tecnológicos como fato irreversível. Ficar de fora da voragem de novos recursos representa isolar-se e distanciar-se cada vez mais da realidade cotidiana dos alunos. O ideal é, portanto, aliar à experiência dos professores a utilização de reconhecidos avanços tecnológicos. Dessa combinação deriva um novo perfil de ensino, mais direto, interessante, estimulante e atuante.

Computadores, internet, lousas digitais e, mais recentemente, a introdução de tablets em sala de aula, abrem perspectivas inimagináveis para o ensino. A eles se somam as projeções em 3D, o uso de objetos 3D, aulas a distância, materiais didáticos acompanhados de animações, possibilidades inesgotáveis para pesquisas, laboratórios virtuais, bibliotecas virtuais e muito mais.

Ao que parece esse é um trem que circula em alta velocidade e não há tempo para dúvidas quanto ao embarque. O que se espera é as coisas se componham com inteligência nas escolas. Experiências mal sucedidas, em geral devidas ao desconhecimento e falta de preparo, têm acontecido. Todo mundo sabe do problema enfrentado em escolas públicas nas quais computadores doados pelo Estado repousam sem uso. Profissionais sem treinamento, ausência de software adequado e outros problemas estão por trás de situações como essas.

Ok, são tempos de mudanças. Para terminar uma frase gasta: os tempos mudam, mas o sentimento é o mesmo. Se ela servir a alguém para ajeitar melhor as coisas muito bom, ótimo.

Seleção em crise

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Não há dúvida: os tempos são outros. Falar em crise na seleção brasileira em função da escassez de vitórias contra rivais importantes é novidade. Saudosismo não movimenta moinhos, mas não faz mal a ninguém. O problema é que já vão longe os tempos em que a seleção era orgulho nacional. Orgulho duplo: do povo pelo país ter uma grande seleção; dos jogadores por fazerem parte da seleção. Hoje em dia…

Mas o que é? O dinheiro? O endeusamento de jogadores que estão aquém da fama? Os técnicos que nunca enxergam o que todo mundo vê? A cartolagem? A CBF?

Ao time que perdeu a última Copa parecia faltar brio. Sabe aquela coisa de morrer em campo se preciso for? Tudo muito calculado, estudado, cada coisa em seu lugar, a emoção deixada de lado. Foi assim que choramos, nós torcedores, por gente que pouco se importou com as nossas lágrimas.

Agora o desenho começa a ser redesenhado com os mesmos contornos. Dunga repousa no esquecimento, Mano vai levando em frente sua trajetória sem brilho. Os temíveis brasileiros já não são temidos. Aqueles gringos já não entram em campo com receio de jogar contra um time que, de repente, assim do nada, é capaz de inventar coisas do arco da velha, jogadas brilhantes e eternas.

O futebol do Brasil virou burocrático. É como cumprir horário na repartição, atendendo o público com azedume. Repartição pública, mas com salários altíssimos, tão altos que o olhar dos funcionários não ultrapassa as linhas que delimitam o campo de futebol. Para eles parece existir apenas a grama verde, onde correm, e os ganhos a receber. O coração da torcida, o nosso coração, isso é outra coisa.

Aí acontece de os jogadores da seleção sub-20 jogarem a própria vida em campo na atual Copa do Mundo da categoria. É a redenção do futebol, a redenção nacional. De repente volta a brilhar a velha camisa, suada de esforço genuíno. E a decisão vai para os pênaltis. Com que raça, com que orgulho e sentimento aqueles meninos mandam a bola para as redes. Fazem-nos esquecer da gente crescida da seleção principal, do descaso das bolas para o alto e para fora na cobrança dos pênaltis.

Foi o comentarista Casagrande quem lembrou que jogador de futebol vive da bola. Daquela que vai para o alto, ou para fora, dela mesmo. Ele disse isso no momento em que o Brasil foi desclassificado na Copa América.  Lembrou que tudo o que ganhou na vida, enquanto jogador de futebol, foi dado pela bola. Grande lição. A ser ouvida por quem corre atrás dela. Por quem ganha dinheiro com ela.

Enfim e como se diz por aí: o Brasil espera que cada um cumpra com o seu dever.

Prá frente Brasil! Salve a seleção!

O silêncio dos brasileiros

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Protestos na Síria, na Espanha e até na Inglaterra. Uma onda de protestos corre o mundo ameaçando déspotas, derrubando governos. No Egito Mubarak comparece ao seu julgamento, deitado em maca de hospital. Enquanto isso, no Brasil, reina grande silêncio. Notícias sobre escândalos e corrupção se multiplicam sem que os brasileiros se manifestem. O que há com o povo do Brasil? Por que as pessoas não saem às ruas para defender os seus direitos? Por que não há mobilização popular e não se protesta no Brasil contra a corrupção?

Na verdade o estranhamento em relação ao comportamento dos brasileiros partiu de Juan Arias, correspondente no Brasil do jornal espanhol El Pais. Arias perguntou sobre os indignados do Brasil que não vão às praças para protestar contra a hipocrisia dos políticos, os desmandos e a corrupção. De lá para cá o assunto vem rendendo vários comentários. Estranha-se que um novo governo tenha trocado quatro ministros em pouco mais de seis meses, todos envolvidos em escândalos; que falcatruas ocorridas dentro de ministérios sejam anteriores ao atual governo no qual prosseguiram sem que o governo anterior seja questionado; que os presidentes então em exercício continuem a gozar de imensa aprovação popular como se não lhes coubesse qualquer responsabilidade pela corrupção em seus governos; e por aí afora.

O brasileiro é um povo ordeiro e pacífico. Apático? Desinteressado? Submisso? Acomodado? Cioso de que a vida é boa e não há porque lutar? Nos últimos dias têm surgido na mídia diferentes respostas em relação a esse assunto. A maioria delas, de natureza política, problematiza os anos de governo do PT que teria encontrado terreno fértil para o abestamento popular através do uso de conhecidas técnicas populistas e de endeusamento de líderes. O surgimento de um líder oriundo das massas populares, o tal “um de nós finalmente no poder”, a inegável capacidade de sedução do mesmo líder, a sorte de ter governado num momento de crescimento do país e sem crises, a fácil adaptação dele a ideologias e circunstâncias discrepantes, tudo isso enfim teria gerado um sonho de bonança, prosperidade e esperança capaz de resignar até mesmo a população menos favorecida.

É possível que a explicação contida no parágrafo anterior tenha contribuído para o atual conformismo observado no país. Entretanto, há que se pesquisarem raízes mais profundas para o inconsciente coletivo que dita comportamento tão pacífico. Em primeiro lugar - bem longe dos determinismos racistas com que os estrangeiros procuraram e procuram inferiorizar os brasileiros – é de se perguntar se o grande caldeamento de povos que resultou no povo brasileiro não teria mesclado características que explicariam o atual modo de ação (inação?) coletivo da população. Assunto delicado, nada mais que especulação, mas que não custa ser citado dadas as diferenças étnicas observadas numa população ainda por se definir. Nesse sentido não terão sido em vão os trabalhos que procuram explicar o Brasil e seu povo, mormente aqueles realizados na década de 30 do século passado, em especial os de Gilberto Freyre, Caio Prado Junior e Sergio Buarque de Holanda. Esses e outros intérpretes do Brasil permanecem como fonte inesgotável para o estudo e compreensão das origens e características do povo brasileiro.

Outro aspecto a ser lembrando diz respeito à geração, hoje na faixa de 60 anos de idade, cuja formação se deu nos tempos da ditadura militar instaurada em 1964. Todo esse contingente de pessoas, a partir do qual foram geradas incontáveis famílias, é oriundo de tempos de repressão e silêncio. Não deixa de ser curioso que, além disso, essas pessoas tivessem atrás de si uma geração que conviveu com a ditadura getulista que só veio a terminar em 1945. De modo que para os mais velhos a democracia e o protesto não são tão familiares assim. E dizer que esses brasileiros são os que impulsionaram o país com o seu trabalho nos últimos anos, tantas vezes desiludidos com ideologias que no fundo vieram a abalar suas convicções. Existe, portanto, no Brasil, um hiato de consciências voltadas para o ativismo barrado que foi pela repressão. Este, quando se deu nos anos de chumbo, manifestou-se por meio de ações extremadas para as quais a maioria das pessoas não é talhada. Entretanto, não se deve retirar dessa geração suas mais lídimas participações, como aquela das “Diretas Já” que finalmente fez vibrar e ecoar a voz dos brasileiros de então contra um regime de exceção que já durava demais.

Sejam quais forem as explicações cabíveis para a apatia e conformismo dos brasileiros em relação a desmandos e corrupção, impõe-se a mobilização popular. Basta de “showmícios” nos quais o que mais atrai eleitores é a festa proporcionada por celebridades da música sertaneja. Os brasileiros precisam pensar o país e deixar de ser iludidos por discursos populistas e a desfaçatez dos que se locupletam com o erário público.

Todos às compras

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Detesto quando não consigo localizar alguma referência bibliográfica. Na verdade permaneço possesso até me lembrar de onde e quando topei com alguma coisa que desejo reencontrar.

Acontece muito com textos. Vez ou outra, ao escrever, lembro-me de algo relacionado ao assunto do momento, algo que alguém disse e seria interessante citar. O problema é localizar quem escreveu e em que livro se encontra. Isso me leva a ficar olhando para a estante, observando lombadas de livros, como se de repente fosse possível algum deles saltar na minha direção, gritando que é a ele, justamente, que procuro.

Acaba de acontecer em relação a um parágrafo sobre guias de compras da década de 20 do século passado. Li em algum lugar que naquela época as famílias recebiam catálogos europeus, a maioria vinda de Paris, e faziam compras a distância. As encomendas eram enviadas ao Brasil por via marítima e os interessados recebiam uma grande mala, em casa, com os produtos escolhidos e comprados. E era uma delícia quando aquilo tudo chegava, produtos vindos diretamente da Europa, vestidos e ternos de Paris, imagine.

Agora já me lembrei de que quem nos relatou essa preciosidade: foi o fantástico memorialista Pedro Nava. Mas, a minha memória falha quanto à citação do livro em que isso se encontra. Penso que talvez em “Bau de Ossos” porque, salvo engano, a descrição se refere à época em que o escritor, ainda rapazote, mudou-se para o Rio. Era na antiga capital federal que os navios carregados com novidades da Europa aportavam, trazendo delícias para as famílias de então. Entretanto não me fio muito nessa observação, feita de memória e à distância dos livros de Nava.

Esse assunto tem sua razão de ser porque vivemos outro grande momento no qual somos diariamente incitados às compras. Agora as coisas não demoram a chegar. Compra-se pela internet, em vezes, prestações geralmente baixas e teoricamente sem juros. Não bastassem os anúncios publicados na própria internet, sites de compras e tudo o mais, recebem-se em casa catálogos de produtos que podem ser comprados diretamente pela internet. Coloridos, bonitinhos, encantadores, os tais catálogos constituem-se em grande tentação para os consumistas. Chega-se à era em que deixa de valer a pena consertar coisas quebradas porque sempre há um novo que pode ser adquirido com grandes facilidades. Outro dia mesmo um liquidificador da minha casa, talvez cansado de triturar coisas, simplesmente recusou-se a funcionar. Cheguei a colocá-lo no carro para levá-lo ao conserto e acho que ele ainda está no porta-malas que não abro há algum tempo. Na verdade achei mais fácil pegar um daqueles catálogos e lá estava um liquidificador moderno e oferecido a preço módico, dividido em dez vezes. Não pensei muito e agora está em minha casa o novo e imponente triturador enquanto o outro, fiel servidor de anos, repousa na escuridão do porta-malas, esperando seu inevitável destino: o lixo.

A crise mundial atormenta governos e corre-se o risco de recessão. Imagino o que será de muita gente se isso vier mesmo a acontecer. A verdade é que, nos últimos tempos, os brasileiros foram às compras e endividaram-se. O problema é que várias prestações de valor baixo assumem montante alto quando somadas. Tem muita gente por aí com televisor de LED e não sei de quantas polegadas, satisfeita da vida, mas com dez ou mais prestações a pagar, isso para ficar num só produto.

 Quando tudo vai bem aposta-se no futuro, por que não? Então que a economia siga em ordem e sem essa de recessão. Muita gente se verá em apuros se a situação apertar e restarem muitas prestações a pagar. Daí que seria muito bom se a presidente da República recomendasse consumo – como recomendou - mas alertando que a coisa pode ficar brava, brava até demais.