2019 fevereiro at Blog Ayrton Marcondes

Arquivo para fevereiro, 2019

Carnaval

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A festança se aproxima no país do carnaval. Por quatro dias os foliões se entregarão a alegrias, danças, bebedeiras, farras e muita luxúria. As baterias das escolas despertarão de seu sono. Ficam em paz durante um ano para explodir nas ruas e praças durante o carnaval. Isso sem falar nos majestosos e ricos desfiles das grandes escolas nos sambódromos. As imagens desses desfiles são maravilhosas e correm o mundo. Mais que nunca a imagem do Brasil se plasma às de mulheres maravilhosas, seminuas, deusas que despertam paixões. Que poderia um habitante da gelada Sibéria contra a força dessas massas carnosas que durante o ano apuram suas formas para desfilar no carnaval?

Nas ruas, blocos que arrastam, atrás de si, multidões. Nenhum canto do Brasil parece estar imune a Momo. O rei do carnaval sempre encontrará, em cada lugar, uma alma que, ao pressentir a festança, ainda que longínqua, a ela se renderá. O carnaval convida ao encontro, à permissividade. O carnaval sempre pertencerá àquele folião perdido nos cordões que só retornará à casa na quarta-feira, conforme nos ensinou Ari Barroso.

Verdade que o carnaval mudou. Coisa esperada. Ele mesmo filhote do entrudo que varria as ruas no início do século 20. Para muitos a folia de hoje pode causar certa estranheza. Já não se ouvem as marchinhas. Ficaram para trás as músicas cantadas pelas rainhas do rádio que tanto encantavam os brasileiros. As “Mamãe eu quero”, “Me dá o dinheiro aí”, “A jardineira” e tantas outras. Sim, ocasionalmente são cantadas. Mas a força está do lado do axé que enlouquece multidões.

Nos desfiles de blocos os caminhões de som pelos quais transitam artistas famosos propaga-se a nova música. Trios elétricos famosos e tão aguardados. Acontece em toda parte, mormente nas grandes capitais. No Rio, no Recife, em São Paulo, Salvador… Como fugir ao encanto do “Galo da Madrugada” que arrebata milhares de foliões nas ruas de Recife? É só comprar o abadá e sair atrás, quem sabe até na pipoca.

Folião nasce. Não é necessária nenhuma conversão. Fora com essa história de que “passei a gostar”. O certo é dizer: “não sabia que gostava”. De repente, ao dobrar a esquina, o sujeito ouve um repique e pronto: começa ali o folião, vindo do berço, sem mais, nem menos.

Pelas TVs recomendam-se cuidados especiais durante o carnaval. Evitar acidentes, violência, bebedeiras… Amor ao próximo não faz mal a ninguém.

Mas que ninguém se engane: o carnaval liberta o Mr. Hide que se esconde sob a capa que usamos no dia-a-dia. Cabe a cada um controlar o monstro. Afinal, tudo se acaba na quarta-feira.

Escrito por Ayrton Marcondes

28 fevereiro, 2019 às 3:33 pm

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Hino Nacional

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Bem, nós sabíamos cantar o Hino. Era cantado pela molecada, inocentemente. Que se saiba não haviam na cantoria intenções subliminares para induzir o nacionalismo. Mas, ele vinha junto, claro. E daí?

Se bem me lembro naqueles anos 50 do século passado buscavam-se motivos de orgulho pelo Brasil. Tanto que as crianças eram ensinadas sobre o nome do cidadão que ocupava a presidência da República. Recordo-me bem da dificuldade que tínhamos em escrever o sobrenome de Juscelino, o Kubistchek. Ainda hoje, passados mais de 60 anos eu o escrevo com facilidade.

Quanto a mim confesso que não me sentiria bem brasileiro caso não conhecesse a música e a letra do Hino. Ele me acompanhou durante toda a vida e, ainda hoje, me emociono ao ouvi-lo em certas ocasiões. Como não se emocionar ao ver e ouvir Paulinho da Viola cantando o Hino na abertura das Olimpíadas? Não era uma música qualquer que ali se executava: era o nosso Hino, grande ícone da nossa nacionalidade.

Mais: talvez hoje em dia nem tanto, mas não era de arrepiar quando ouvíamos o Hino antes do início de grandes jogos nas Copas do Mundo? Aquilo era o Brasil, o nosso país ali representado como a tal pátria de chuteiras.

E olhe que nem assim me fiz nacionalista. Aprendi a amar esse país de eternos desacertos e admiro toda gente que quer sair dele porque eu não saberia viver em outro lugar. Mas não rasgo as vestes em protestos nacionalistas ou de outra s naturezas.

Afinal, nunca seremos como os americanos do norte, patriotas. Em cidades interioranas dos EUA não é incomum ver-se ruas inteiras de casas defronte as quais tremulam bandeiras daquele país presas a mastros. Americanos amam sua pátria de modo diferente desse estar um tanto silencioso que grassa entre nós.

De modo que fica sem foco essa bobagem de um ministro ordenar a filmagem de crianças, cantando o glorioso “Salve o lindo pendão…” Bem, ele voltou atrás, mudou o texto da carta. Mas, a partir de agora talvez não seja a mesma coisa. O erro do ministro imantou ao Hino intenções ideológicas para as quais não dávamos a mínima ao entoá-lo. Receio o início de um tempo no qual o Hino não venha a ser cantando como parte da herança brasileira.

Demais sempre gostamos de Hinos. Em meus tempos de ginásio nossa professora de francês, a inesquecível Dona Clara, nos ensinou o Marselhesa. Sou capaz de cantá-la, de cabo a rabo, se necessário. Mas, aqueles eram outros tempos nos quais a França figurava como modelo para essas plagas tão incultas. Admirava-se a literatura francesa com seus Balzac, Gide, Flaubert, Hugo, Dumas… Nossas elites afrancesavam-se. Era mesmo um outro mundo.

Ruy Barbosa

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Está na internet um depoimento do Prof. Silveira Bueno sobre Ruy Barbosa. Silveira notabilizou-se por longa carreira no mundo das letras, tendo publicado vários livros. Aliás, um deles sobre oratória.

Silveira Bueno teve o privilégio de assistir a três apresentações de Ruy Barbosa. Delas concluiu que Ruy jamais foi um bom orador. Segundo Silveira Ruy, homem de baixa estatura, notabilizava-se pelos seus textos, comparáveis ao do Padre Antônio Vieira de quem, aliás, foi aluno. Mas, a grandeza do texto não se coadunava com a voz monocórdica que, nas horas de duração do discurso, acabava cansando.

É um grande prazer ouvir as palavras de Silveira Bueno quando já muito idoso - morreu aos 101 anos de idade. Há que se destacar, entretanto que, embora a autoridade de Silveira no assunto em questão, sua opinião não coincide com conterrâneos de Ruy. Aliás, a memória sobre Ruy Barbosa que persiste até hoje, tem-no como não só uma das mais brilhantes inteligências de nossa história, assim como grande orador. Agregado à imagem de Ruy está o epíteto “Água de Haia” referente à sua fenomenal participação como Delegado do Brasil na Conferência de Paz realizada em Haia, em 1907. Naquela ocasião Ruy notabilizou-se pela defesa da igualdade dos estados.

Grande orador ou não, impossível ignorar a figura de Ruy Barbosa a quem se interesse pelo passado de nossa história. Ruy foi figura de grande proeminência no seu tempo. Indicado para o ministério pelo primeiro presidente da República, Deodoro da Fonseca, Ruy ocupou a pasta da Fazenda, tendo proporcionado grande emissão de papel-moeda que caracterizou o encilhamento. Também a Ruy se deve a elaboração, junto com Prudente de Moraes, da primeira constituição republicana.

Há muito o que se dizer sobre Ruy Barbosa, grande orgulho das gentes brasileiras. Em 1910 candidatou-se á presidência da República, sendo derrotado pelo Marechal Hermes da Fonseca.

Na atualidade desencanta-nos o tom da oratória proferida pelos representantes que ocupam cargos públicos em todo o país. Raramente se ouve alguém capaz de entreter-nos, não só pela natureza do discurso, mas pela beleza de sua oratória.

Aliás, já não se vive tempos em que a oratória seja um dom a ser aprimorado, exceto para melhora em comunicações. Não faz muito, era bastante comum pessoas egressas da primeira metade do século XX ainda perseguirem a melhor dicção em discursos. Grassava por aí o famoso “peço a palavra” …

Hoje em dia existem cursos de oratória que atendem a interessados. Mas, nada por diletantismo. O que se busca é a melhora nas performances para que se alcance maior projeção nos meios em que as pessoas atuam.

Depressão

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Amigo confessa depressão. De tempos para cá a vida parece a ele ter perdido o sentido. Pequenos problemas o estafam demais. Os grandes, então…

Não tem vontade de sair de casa. Passa horas mirando o vazio. E os parentes o aborrecem. Essa turma tem problemas que não resolvem e jogam tudo pra cima da gente. Você passa dos 70 e a turma parece não se dar conta disso. Encaram a gente como se ainda tivéssemos 30, expostos ao de der e vier. Simplesmente não é mais assim, mas não acreditam.

Isso sem falar nas dificuldades para vestir meias e amarrar sapatos. Abaixar é um problema. E a próstata. Ah, a próstata! Fazer xixi aos trancos é demais. Cadê o velho e bom jato que jogávamos na privada sem dó? Agora essa dificuldade.

Sem falar nos desacertos da saúde. De tempos para é um tal de repetir exames para controle do estado geral. O diabetes apareceu há alguns anos, mas, volta e meia, a glicemia chega perto dos 300…

A dor nas costas nem é novidade. Ela já vem de longe, mais discreta que agora, é verdade. Mas, tem piorado. Dor nas juntas. E a falta de sono? Andar de madrugada pela casa às escuras. Cismar que das sombras os mortos o espreitam. Não é que já tentou falar com um deles, esperando que, lá do outro lado, responda ao contato.

O amigo afirma, categoricamente, não ter medo da morte. Quando vier será benvinda para pôr fim a essa agonia.

Está tomando antidepressivos e calmantes, esses para dormir. Se não toma não dorme. Quando toma ferra no sono. Profundamente. Mas, a mulher reclama porque ele ronca. Não roncava antes, agora é por causa do remédio.

Reparo que o amigo está lento. Move-se devagar, passos arrastados. Voz rouquenha, fala mansa. Do que mais reclama é da queda na parte sexual. De tempos para cá nem com Viagra. Ah, o sexo.

Não é o homem que conheci. Não faz muito era um sujeito ágil, bem-falante, alegrão, contador de casos. Mulherengo. Sempre com mais uma conquista a relatar. Desses. Mas, a vida não perdoa. Ele sabe que acaba de entrar no funil que conduz para o depois. O que será esse depois é mistério reservado a todos humanos que trafegam em direção ao fim.

A vida se torna incerta quando se encara o fato de que nada se sabe sobre o amanhã.

Escrito por Ayrton Marcondes

21 fevereiro, 2019 às 4:05 pm

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Em Marte

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Existe um livro mediúnico no qual se descreve a vida no planeta Marte. A obra, psicografada, é ditada pelo espírito de Ramatis. Publicado numa época em que a possibilidade de vida fora da Terra povoava o imaginário das pessoas, o livro de Ramatis em muitos pontos descreve fatos não comprováveis pela ciência. Há quem defenda o livro, afirmando que Ramatis fala somente sobre a vida espiritual no planeta vermelho.

O cinema, obviamente, explora o assunto Marte. Uma grande produção - Perdido em Marte -estrelada por Matt Demon, fez grande sucesso há pouco tempo. Um astronauta é esquecido em Marte e sobrevive, criativamente, até ser resgatado. No filme somos levados a ponderar sobre reais possibilidades do planeta vir a ser colonizado.

Nesta semana a NASA divulgou o fim da missão da sonda Opportunity que fora lançada, em 2012, para investigar Marte. Com 1,5 m de comprimento e alimentado por baterias solares a sonda logrou encontrar compostos químicos nas rochas marcianas, permitindo concluir pela anterior existência de água no planeta.

Entretanto, estamos ainda longe do dia em que um homem pisará me Marte. É o que nos informa o cientista brasileiro da NASA, Ivair Contijo. Segundo ele existem, ainda, problemas não resolvidos para uma viagem que duraria cerca de nove meses. Um deles é a produção do oxigênio necessário para a travessia espacial. Outros, o espaço reservado para astronautas no foguete e a reserva de comidas.

Contijo avalia que somente em duas ou três décadas os problemas técnicos terão sido resolvidos, permitindo ao homem realizar a tão desejada chegada ao planeta vermelho. Até lá resta-nos esperara e assistir as obras de ficção sobre Marte, assunto que tanto nos fascina.

A navalha

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Está preso, no Japão, Carlos Ghosn, empresário franco-brasileiro, diretor geral e presidente do grupo Renault. Ghosn é também presidente e diretor executivo da Nissan, presidente da Mitsubishi Motors e presidente da AvtoVAZ, brabicante russa de automóveis.

Ghosn é acusado pela Nissan de subestimar a própria renda em mais de US$ 80 milhões em relatórios apresentados ao longo de oito anos.

Naturalmente, Ghosn alega ser inocente e dispõe-se a pagar qualquer valor de fiança para sair da prisão. Até o momento era defendido por Motonari Otsuru, um ex-promotor que pediu demissão. Para substitui-lo Ghosn contratou o advogado Junichiro Hironaka, conhecido como “A navalha”. Hironaka é famoso pelo número de êxitos alcançados num país em que 99% das acusações formais são convertidas em condenações.

Os crimes financeiros de que Ghosn é acusado passarão, portanto, a serem defendidos por “A navalha”.

Nos noticiários aparece uma foto de Hironaka. É um japonês que aparenta estar entre os sessenta e setenta anos, engravatado, em cujo rosto passeia um sorriso mordaz. Cercado por jornalistas, está muito à vontade em seu papel de famoso advogado.

Hironaka conquistou o título de “A navalha” por ter conseguido absolvições em casos célebres. Confesso ter minha atenção chamada para o trabalho deste advogado justamente pelo título que se junta ao seu nome. Não imagino em nosso país algum advogado que pudesse ser conhecido como “A navalha”. Entre nós “navalha” permanece como inquietante instrumento de afiado corte, utilizado nas barbearias.

Infelizmente, o poder judiciário em nosso país passa por momentos de crise. Divergências quanto à interpretação dos códigos infundem desconfianças na população. Seria, talvez, o momento de surgirem por aqui algumas “A navalha”. Quem sabe o corte ferino desses profissionais recolocasse as cosias nos devidos lugares.

Gordon Banks

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Faleceu Gordon Banks. Gordon Banks? - perguntarão os mais jovens. Que terá realizado esse homem para merecer que seu desaparecimento seja noticiado mundo afora?

Pois é. Gordon Banks foi um boleiro, jogador de futebol. Jogava no gol. Goleiro, portanto. Fez fama defendendo a gloriosa seleção inglesa. Debaixo das traves Banks era, de fato, fenomenal.

Mas, por que em sua morte Banks terá sido tão reverenciado? Pois a Banks aconteceu de protagonizar um momento de pura magia num gramado de futebol. Foi na Copa de 70, durante o jogo entre o Brasil e a Inglaterra. O lance, inesquecível, começou pela direita do ataque brasileiro. Jairzinho alcançou a linha de fundo e centrou em direção à área. A bola chegou a Pelé que subiu para cabeceá-la. A perfeição da cabeçada de Pelé, mandando a bola para o canto do gol inglês, com força e velocidade, a levaria às redes. Entretanto, num tempo igual ao de um piscar de olhos, Banks operou aquela que, até hoje, é considerada a maior defesa de um goleiro em todos os tempos. O goleiro inglês, magicamente, alcançou a bola e espalmou-a para escanteio.

A cabeçada de Pelé e a defesa de Banks podem ser vistas no Youtube. Infelizmente, não poderão os que a verem agora experimentar a sensação provocada pelos que a presenciaram no calor da hora. Nós a vimos pela TV numa transmissão a cores, naquela época ainda incomum. Não houve quem não se levantasse para comemorar o gol certo. Entretanto, Banks impediu a comemoração dos brasileiros. O próprio Pelé chegou a pular em comemoração ao gol que não aconteceu.

Há pessoas que se imortalizam por atos que se tornam inesquecíveis. Gordon Banks foi imortalizado nas memórias pela grande defesa realizada num jogo de Copa do Mundo. Por ela será sempre lembrado. É possível que durante muito tempo ainda se fale sobre o ato mágico do goleiro inglês.

Ano trágico

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Em seu comentário sobre o desparecimento do jornalista Ricardo Boechat o também jornalista Jorge Pontual se referiu ao fato de, ao acordar de manhã, perguntar-se: qual é a tragédia de hoje?

Não há como negar: o ano de 2019 começa muito mal. Tragédias se repetem sem nenhum pudor. A toda hora nossa atenção é chamada para acontecimentos infaustos e inesperados. Não foi assim com o rompimento da barragem de Brumadinho na qual se contam mais de 300 pessoas entre mortos e desaparecidos?

Pois, para o nosso gosto já estava demais. Mas, eis que no centro de treinamento do Flamengo há um incêndio no qual desaparecem dez jovens, levados pelas chamas.

Entretanto, isso não parecia ser suficiente. Ano vingativo esse 19. Ano que parece zombar dos humanos, impondo a eles sucessivos reveses. Não é que se seguiu a grande tempestade no Rio, na qual muitas vidas foram perdidas? E o massacre numa favela com a consumação de dez mortes?

Então o ano já consumira sua cota de desastres. Daqui para a frente um ano maravilhoso. Mas, não! Eis que um acidente de helicóptero rouba a vida de Ricardo Boechat, um dos mais destacados jornalistas do país. Essa perda, irreparável, produz grande comoção pública.

Então, basta. É preciso colocar um ponto final nessa desabrida sequência de péssimas notícias. O ano deve ser colocado em seu lugar, sequência de dias amenos nos quais possamos viver sem maiores desconfortos.

Mas, seria uma sina histórica a repetição de tragédias em datas pré-determinadas? Não parece ser. Numa rápida consulta aos eventos ocorridos em 1919 destaca-se, no Brasil, a morte do presidente eleito Rodrigues Alves, vitimado pela gripe espanhola. Aliás, essa epidemia de gripe resultou na morte de 20 milhões de pessoas em todo o mundo. No mais, em 1919 foi assinado o Trato de Versalhes no qual a Alemanha foi punida pelos prejuízos da Grande Guerra, terminado em 18. Segundo John Maynard Keynes a dívida então imposta à Alemanha teria siso o fermento para a futura ascensão de Hitler que desaguaria na Segunda Guerra Mundial.

As consequências às tragédias de 2019 continuam em aberto. A lama do desastre de Brumadinho segue pelo Rio Paraopeba, ameaçando a distribuição de água potável a cidades localizadas em seu trajeto. As famílias que perderam entes queridos com o rompimento da barragem continuam em situação constrangedora. Por outro lado, as responsabilidades sobre o incêndio ocorrido no centro de treinamento do Flamengo continuam em aberto.

O que pedimos? Um pouco de bondade. Que o ano que segue nos seja benfazejo, livrando-nos de tantos dissabores. Mas, para isso, é preciso que os homens se entendam. Desse entendimento depende não só a prosperidade, mas, também, a felicidade dos seres humanos.

Negros no futebol

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Paixão é paixão. A um filósofo italiano incomodava a relação para ele indigesta com o futebol. Homem de altas luzes não podia compreender porque os resultados dos jogos do time de sua cidade o incomodavam tanto. Deve ter sido, vida afora, torcedor resistente.

Entre nós, brasileiros, a dedicação pelo futebol parece fazer parte do DNA com que fomos concebidos. Verdade que, com o passar dos anos, o nosso futebol perdeu grande parte de sua magia. Já não vivemos os heroicos tempos de 58, 64 e70, nos quais os jogos das vitoriosas seleções nacionais nos levavam à loucura. Ontem mesmo uma moça me falava sobre seu pai, morador da cidade e torcedor do Santos, o qual orgulhava-se de ter visto muitas vezes Pelé jogar na Vila Belmiro.

Mas, os tempos são outros. Ao que parece os chamados boleiros de hoje em dia não jogam com o fervor de ontem. Aquele “dar a vida pela camisa do time em que jogam” teria ido para as calendas. Novos tempos, novas posturas.

Escrevo sobre isso por ter assistido a um documentário sobre os negros no futebol. Nele falou-se sobre o grande desastre que foi a derrota do Brasil frente ao Uruguai na final da Copa de 50. Aquela terrível 2×1 ainda hoje ecoa na memória de muita gente. Num país atrasado a vitória na Copa seria muito mais que simples feito futebolístico. A vitória funcionaria como uma espécie de afirmação do povo brasileiro perante o mundo. E deu no que deu.

O que eu nunca tinha ouvido falar foi sobre a pretensa culpabilidade que pretenderam atribuir aos negros da equipe brasileira. No segundo gol uruguaio justamente falharam o goleiro Barbosa e o defensor Bigode. Dois negros. Teria errado o técnico ao escalar negros… Puro racismo.

Mas, não para por aí. Segundo o mesmo documentário teria havido resistência em escalar negros na equipe de 58. Só o terceiro jogo, contra a Rússia, Garrincha e Pelé teriam sido escalados, depois da pressão exercida pelo Dr. Paulo Machado de Carvalho.

O documentário aponta Pelé não só como ícone do futebol, mas expressão que mudou a visão sobre os negros no país.

De minha parte afirmo perdurarem, em minha memória, as maravilhosas atuações do selecionado brasileiro naquelas copas. Não imagino que ao presenciar as maravilhas com que Pelé nos proporcionou alguém tenha se lembrado de que ele era negro.

O futebol brasileiro, a sua grandeza, deve muito aos inesquecíveis boleiros negros que, honram o nome do país e fazem a alegria de nosso povo. Isso é mais que tudo.

Escrito por Ayrton Marcondes

8 fevereiro, 2019 às 12:09 pm

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Chuva

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Choveu. Ao amanhecer, ruas inundadas. Na praia, mar revolto. A frente fria que diziam viria, enfim chegou.

Ilhados, funcionários de empresas não chegaram ao serviço. Os ônibus permaneceram nas garagens. Poucas linhas percorridas por motoristas intrépidos. No céu nuvens escuras, anunciando novos aguaceiros. Vez ou outra o ruído de um trovão. A natureza parece não estar de bem com o homem.

Mas, algo de bom: o calor extremo fez pausa. Respira-se ar menos denso e os suores a que se está habituado desapareceu.

Fevereiro começa com tempestades. Chuvas pesadas com aquelas da minha infância. As minhas memórias dos tempos de menino estão impregnadas pela chuva. Não há sol naquele mundo desfeito. Figura-se, sempre, a janela pequena do quarto com gotas de água escorrendo pelo vidro. As gotas da minha infância são eternas.

Também havia a rua de terra e o barro permanente. Na porta de casa minha mãe colocava um aparato de ferro para que limpássemos os sapatos antes de entrar. Meu pai usava galochas. Sempre que me lembro de meu pai vejo um homem de galochas, circulando no barro.

Entretanto, o mundo mudou. Aquelas ruas receberam asfalto. Pelos caminhos de ontem perambulam novas gentes em nada ligadas ao passado. Dos meus tempos de menino poucos restaram. Do Antônio Maneta que bebia e da mulher dele, a Vitalina, que o tirava à força do bar, talvez eu e uns poucos se lembrem.

Aliás, a cada dia somos, cada vez mais, um reduzido pingo de gente. Gente de outros tempos, de ruas encharcadas, de pés sujos de barro. De galochas.

Gente da chuva.