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Os descartáveis

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Não sei não, desconfio muito, acho essa coisa toda muito complicada para que eu me acostume. Eu tive um Corcel II, carro cuja lataria era muito resistente. Fiquei com esse carro bem por uns cinco anos. Pouco antes de me desfazer dele não pude evitar uma colisão de trânsito com um carro novinho em folha dirigido por uma senhora. Batida pequena. A lataria do carro da mulher afundou como se tivesse colidido com uma parede; a do meu carro permaneceu quase intacta.

Todo mundo sabe que lataria dos carros atuais é tremendamente frágil. Coisa descartável porque, em caso de colisão, troca-se a parte que bateu. Tudo volta a ficar como antes, o seguro paga o conserto e estamos conversados.

Você já parou para pensar sobre a durabilidade dos eletrodomésticos?  Para ficar num só exemplo, os liquidificadores duravam décadas. Hoje em dia o liquidificador dura muito menos e, caso apresente problemas, o mais fácil é comprar um novo porque o preço do conserto muitas vezes se iguala ao do a ser pago para restaurar o antigo. E assim acontece com muitas outras coisas que temos em nossas casas: quando deixam de funcionar, quase sempre precocemente, fica mais fácil substitui-las por novas.  Verdade que para isso contribuem muito as atuais facilidades de compra pela internet onde pululam sites com toda sorte de produtos. Tentação permanente para as donas de casa sempre afeitas a modernidades que facilitem o dia-a-dia das famílias.

Bem, aconteceu de o meu liquidificador quebrar. A primeira ideia foi substitui-lo por um novo, novinho em folha, comprado em vezes pela internet. Minha mulher até chegou a escolher um que, conforme o anúncio, fazia isso e mais aquilo. Mas, resisti à tentação. Não sou chegado ao amor a coisas, mas de algum modo me senti traindo um velho serviçal, companheiro de tantas manhãs, inúmeros sucos etc.

Em assim sendo decidi consertar o velho. Inutilmente a minha mulher ponderou que não valia a pena consertar, mais fácil e rápido comprar um novo que, além do mais, era mais potente etc. Mas, fui tomado por um estranho sentimento de revolta contra essa era das coisas descartáveis e acabei levando o liquidificador para consertar. Uma semana depois eu o trouxe de volta, limpinho, ajustado, prontinho para ser usado. Minha mulher não disse nada enquanto eu orgulhosamente observava o meu velho liquidificador.

Acho que foi no quarto dia. Eu me sentara para o café da manhã e o liquidificador fazia a sua parte, batendo o suco. De repente ouvi um som de motor falhando. Era ele. Posso dizer que o velho liquidificador lutou até o fim. Engasgou-se, voltou a funcionar, falhou e finalmente parou para sempre.

Minha mulher não disse nada, nem eu. Agora está lá na cozinha um novo liquidificador, muito silencioso quando em funcionamento, do qual se diz que é capaz de triturar mesmo as coisas mais duras. Confesso que ainda não me acostumei a ele porque me faz lembrar o outro, velho e cansado, que atingira o seu limite de bater sucos.

A vida é assim: uns param porque se cansam de bater sucos, outros engripam e não saem do lugar, outros, como as pessoas, simplesmente morrem. Tudo descartável.

Compras pela internet

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Não é esta a primeira vez que toco no assunto. O que novamente me move é a espantosa pressão que se faz sobre os consumidores com ofertas e mais ofertas de toda sorte de produtos.

Mensagens chegam a todo instante, como se dizia no passado, por terra, mar e ar. Hoje em dia fala-se muito sobre essa entidade etérea à qual se dá o nome de “nuvem”. A “nuvem” pode ser definida como uma impressionante concentração de dados que estão sobre as nossas cabeças e entram nas nossas vidas através do computador. Pois, boa parte desses dados refere-se a ofertas de produtos patrocinadas por pequenos, médios e grandes conglomerados de negócios.

A sua geladeira está velha? Então, basta entrar num site de um dos grandes provedores da internet para dar de cara com uma lista de empresas que oferecem geladeiras de todos os tipos. Escolha a de sua preferência e que caiba bem no seu orçamento. O negócio será fechado diretamente pela internet. Paga-se em vezes com o cartão de crédito e dias depois eis que entregarão, na sua casa, a geladeira novinha. Assim acontece com qualquer outro produto, de qualquer linha.

O que mais chama a atenção é que esse tipo de comércio que suprime a visita do consumidor às lojas tornou-se “normal”, isso é rotineiro. Compram-se produtos no país ou fora dele. Há sites chineses que trabalham com ofertas que nem de longe podem ser acompanhadas pelas empresas brasileiras. Existe sempre o risco do consumidor não receber o produto, mas na maioria das vezes a transação é bem sucedida: demora, mas, tempos depois, o produto comprado chega, vindo diretamente da China. Pode?

Bem, creio que todo mundo sabe disso e está acostumado a receber e-mails com ofertas de viagens, produtos etc . Entretanto, duas coisas precisam ser ditas. A primeira delas é que tudo isso é muito recente, de pouquíssimos anos para cá, fato que justifica aquele “normal”, entre aspas, escrito acima. A segunda diz respeito à dúvida inquietante sobre como serão as coisas no futuro. De fato, não consigo imaginar o mundo em que viverá uma criança nascida neste ano, por exemplo. Imagine-se  que até a teoria de Einstein anda sendo abalada porque se descobriram neutrinos que viajam mais depressa que a velocidade da luz. Então, como será?

É possível que em poucos anos não existam mais lojas de rua, sendo a quase totalidade das compras feitas pela internet. Também é possível que dentro de 20 ou 30 anos já tenha sido inventado um meio de comunicação diferente e mais eficaz que a internet e as pessoas da nova época se refiram a ela com comentários como “lembra—se do tempo da internet”?

Dirão que não vai ser assim, afinal a internet veio para ficar. Não sei não e apenas me dou ao luxo de lembrar que há pouco tempo não tínhamos celulares e internet. O carro-de-boi ficou muito, muito, para trás e quem sabe o mesmo venha a acontecer com os carros. Enquanto tudo isso não passa de especulação vamos em frente, aproveitando as coisas interessantes que a tecnologia nos oferece.

Às compras!

Todos às compras

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Detesto quando não consigo localizar alguma referência bibliográfica. Na verdade permaneço possesso até me lembrar de onde e quando topei com alguma coisa que desejo reencontrar.

Acontece muito com textos. Vez ou outra, ao escrever, lembro-me de algo relacionado ao assunto do momento, algo que alguém disse e seria interessante citar. O problema é localizar quem escreveu e em que livro se encontra. Isso me leva a ficar olhando para a estante, observando lombadas de livros, como se de repente fosse possível algum deles saltar na minha direção, gritando que é a ele, justamente, que procuro.

Acaba de acontecer em relação a um parágrafo sobre guias de compras da década de 20 do século passado. Li em algum lugar que naquela época as famílias recebiam catálogos europeus, a maioria vinda de Paris, e faziam compras a distância. As encomendas eram enviadas ao Brasil por via marítima e os interessados recebiam uma grande mala, em casa, com os produtos escolhidos e comprados. E era uma delícia quando aquilo tudo chegava, produtos vindos diretamente da Europa, vestidos e ternos de Paris, imagine.

Agora já me lembrei de que quem nos relatou essa preciosidade: foi o fantástico memorialista Pedro Nava. Mas, a minha memória falha quanto à citação do livro em que isso se encontra. Penso que talvez em “Bau de Ossos” porque, salvo engano, a descrição se refere à época em que o escritor, ainda rapazote, mudou-se para o Rio. Era na antiga capital federal que os navios carregados com novidades da Europa aportavam, trazendo delícias para as famílias de então. Entretanto não me fio muito nessa observação, feita de memória e à distância dos livros de Nava.

Esse assunto tem sua razão de ser porque vivemos outro grande momento no qual somos diariamente incitados às compras. Agora as coisas não demoram a chegar. Compra-se pela internet, em vezes, prestações geralmente baixas e teoricamente sem juros. Não bastassem os anúncios publicados na própria internet, sites de compras e tudo o mais, recebem-se em casa catálogos de produtos que podem ser comprados diretamente pela internet. Coloridos, bonitinhos, encantadores, os tais catálogos constituem-se em grande tentação para os consumistas. Chega-se à era em que deixa de valer a pena consertar coisas quebradas porque sempre há um novo que pode ser adquirido com grandes facilidades. Outro dia mesmo um liquidificador da minha casa, talvez cansado de triturar coisas, simplesmente recusou-se a funcionar. Cheguei a colocá-lo no carro para levá-lo ao conserto e acho que ele ainda está no porta-malas que não abro há algum tempo. Na verdade achei mais fácil pegar um daqueles catálogos e lá estava um liquidificador moderno e oferecido a preço módico, dividido em dez vezes. Não pensei muito e agora está em minha casa o novo e imponente triturador enquanto o outro, fiel servidor de anos, repousa na escuridão do porta-malas, esperando seu inevitável destino: o lixo.

A crise mundial atormenta governos e corre-se o risco de recessão. Imagino o que será de muita gente se isso vier mesmo a acontecer. A verdade é que, nos últimos tempos, os brasileiros foram às compras e endividaram-se. O problema é que várias prestações de valor baixo assumem montante alto quando somadas. Tem muita gente por aí com televisor de LED e não sei de quantas polegadas, satisfeita da vida, mas com dez ou mais prestações a pagar, isso para ficar num só produto.

 Quando tudo vai bem aposta-se no futuro, por que não? Então que a economia siga em ordem e sem essa de recessão. Muita gente se verá em apuros se a situação apertar e restarem muitas prestações a pagar. Daí que seria muito bom se a presidente da República recomendasse consumo – como recomendou - mas alertando que a coisa pode ficar brava, brava até demais.