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Seleção brasileira

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Esse é um tempo no qual só jornalistas parecem ter assuntos sobre os quais tratar. Política, corrupção, inflação, economia ladeira abaixo, delação premiada e outros quetais rendem páginas e páginas de notícias e comentários. Na maior parte do tempo os jornais condenam a atual situação. Não há dia em que não se critique o governo, a presidenta, o congresso e até instituições policiais e jurídicas. Boas notícias rareiam. Economistas não nos poupam de suas péssimas previsões para o futuro próximo. Há pouco a crise chegaria ao fim neste ano; agora já se fala em crise no ano de 2017.

O nosso bom e velho Brasil anda mal das pernas. Reina confusão geral e declarações contraditórias acontecem a toda hora. Fala-se que não há comando, o governo é fraco. Falta um comandante e políticos apequenados ganham projeção. Faz lembrar uma caravela em alto mar, sem ventos que a movam. O capitão está doente, os marujos não se entendem. Os recursos escasseiam e começa o salve-se quem puder.

Então nos resta só uma paixão: o futebol. Mas, se mesmo esse nos decepciona… De que ilusão viveremos se até em nosso esporte favorito estamos em crise?

Ouvi o Carlos Alberto, capitão de 70, criticando os jogadores pelo descaso com a seleção. Enquanto jogadores de outras seleções usam terno e gravata, respeitam seus países, os nossos descem dos ônibus com a cabeça enfiada em capuzes, com o jeitão de pouco-se-me-dá. Resultado da desorganização. Essa turma não se entrega em campo como acontece com jogadores de outras seleções. Logo voltam para seus clubes no exterior de modo que a passagem pela seleção pouco representa.

Coisa parecida disse o ex-jogador Mario Sérgio, destacando a figura do jogador de cabeça coberta pelo capuz. Estarão os dois ex-jogadores certos? Pois é. Há quem fale em falta de comando também no futebol. Pesquisa de programa de rádio resulta em desaprovação de mais de 90% ao trabalho de Dunga. O presidente da CBF não foi ao Chile acompanhar a seleção depois do escândalo da FIFA.

Resta a conversa de duas pessoas à qual presenciei. Uma delas agradecia ao Paraguai pela desclassificação do Brasil. Explica-se: ontem o Paraguai foi massacrado pela Argentina pelo placar de 6X1. Fossem o brasileiros contra a Argentina, como teriam se passado as coisas? Outra vergonha?

Depois fiquei pensando nos grandes craques do passado. Me veio a lembrança de Zizinho, de Pelé, de tantos. Talvez estejamos condenados à recordação de grandes times e maravilhosas seleções nacionais.

Nuvens negras cobrem os céus do Brasil. Essa é uma época que será melhor esquecer no futuro.

A questão Neymar

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Imagine-se na pele de um rapaz de 21 anos, ultrabadalado, relacionando-se com belas mulheres e ganhando muito, mas muito dinheiro. Imagine, também que esse rapaz seja um excepcional jogador de futebol conhecido em todo o mundo, tendo seu passe pretendido por vários times a valores exorbitantes.

Se você for capaz desse meter dentro da pele desse rapaz eleito é possível que pense que a juventude passa depressa e o tempo não volta, daí que há que se viver o momento porque em poucos anos toda a glória se tornará passado e, então, adeus ao período de idolatria das multidões.

Caso o que está escrito acima seja levado em consideração torna-se possível que se perdoe ao Neymar por alguns atrasos de treinos, noites e noites em festas e até o fato de que parece preocupar-se mais com outras coisas que com o futebol. O rapaz é simplesmente um rapazinho que joga bola e quando liga a televisão vê a sua imagem em anúncios de grandes empresas na tentativa de vender produtos que ele talvez nem mesmo conheça ou tenha experimentado. Tudo isso regado a contratos que rendem muito dinheiro. Tanto se fala dele que o Murici, técnico do Santos, implora: deixem ele em paz.

Mas, como toda profissão o futebol tem as suas exigências. Eis que se aproxima o momento da realização da Copa de 14 no Brasil e o país inteiro joga suas esperanças nas chuteiras do nosso melhor jogador que é sem sombra de dúvidas o Neymar. Quer dizer que sobre os ombros do rapaz avoluma-se um peso descomunal porque ele se transformou na grande esperança da pátria de chuteiras que não admite, de jeito nenhum, outro resultado que não a conquista da Copa. Há que se provar que somos e sempre fomos os melhores e, de uma vez por todas, passar borracha na tragédia de 50 quando o Brasil perdeu, em pleno Maracanã, para o Uruguai dos Obdulios Varelas, Gigias etc.

Entretanto, uma sombra atormenta a alma da torcida tupiniquim: até hoje o ídolo Neymar não mostrou, enquanto jogador da seleção nacional, nem ao menos parte do talento que exibe quando joga pelo Santos. Então como será a participação dele na Copa?

A pergunta acima pode ser considerada irrespondível, afinal trata-se de expectativa relacionada a acontecimentos futuros. Entretanto, não custa lembrar de que existem jogadores de time e jogadores de seleção. Quem não se lembra do ponta-esquerda Canhoteiro que fazia o diabo com a bola no São Paulo, mas não era o mesmo na seleção? E o Clodoaldo que nasceu para jogar em seleção onde realmente se transformava num invejável jogador? E o Gilmar, grande goleiro da seleção, bicampeão mundial e reserva do Cabeção no seu time?

Diante disso só nos resta torcer para que o Neymar seja como tantos que jogam bem em times e seleções. É preciso muita calma. Quem sabe dia desses o jogador santista mostra quem é de fato vestindo a camisa da seleção brasileira. Você não acha?

Ainda a seleção

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Estão sendo levantadas as mais variadas hipóteses para explicar a derrota da seleção na Copa do Mundo. É hora de encontrar culpados para que se exorcize o fracasso. Infelizmente o tempo parece passar muito devagar, deixando largos espaços para a curtição. No fundo o que se quer é esquecer, retornar às competições regionais e empolgar-se com a fúria dos clubes. Todo mundo sabe que o melhor remédio para a derrota é uma rápida vitória que distraia a atenção.

Dunga e sua trupe foram demitidos, mas resistem a converterem-se em passado: ainda estão nos noticiários e Dunga exibe aquela sua certeza olímpica de ter feito o seu papel com acerto. Se não deu, não deu. Pena que esse simplismo envolva as esperanças de toda a torcida brasileira.

Das muitas teorias que tenho lido e ouvido sobre a derrota da seleção a que me pareceu mais interessante foi a de um senhor que mora aqui no prédio. Habitualmente carrancudo, nos últimos dias ele tem-se dado o desfrute de sorrisos contidos e alguma fluência no palavreado. De fato, deixou de lado os breves acenos de cabeça para revelar-se torcedor aflito da seleção em busca de uma explicação que o satisfaça em relação ao que denomina “a tragédia da África do Sul”.

Devo reconhecer que a explicação do meu vizinho, se não consistente, é engenhosa. Apela ele para a posição do Brasil no mundo, relacionando-a com o atual insucesso da seleção. Para ele o Brasil sempre foi um país atrasado, subdesenvolvido, daí a energia nacional canalizar-se para setores onde a genética do povo mostrou-se mais favorável. Entre esses setores, o esportivo - em particular o futebol - tornou-se, ao longo dos anos, parte da alma nacional e expressão máxima da nacionalidade. Não por acaso o país converteu-se em pólo exportador de craques e alcançou resultados expressivos em competições internacionais.

A coisa foi bem até que o país começou a romper com o seu calamitoso passado: de subdesenvolvido a emergente, de excluído a membro dos principais grupos econômicos do mundo.  Com passos rápidos o Brasil se torna uma potência ainda que internamente persistam as desigualdades etc.

Ocorre que para tudo nesse mundo há um ponto de equilíbrio e a balança pende para um ou outro lado, isso não se pode evitar. Segundo o meu vizinho o peso da melhora do país teve como resultado natural a perda de motivação para outras formas de expressão, entre elas e principalmente o futebol. Já não se precisa das chuteiras para lembrar ao mundo que o Brasil existe. Tal constatação, ainda que subliminarmente, incorporou-se ao modo de ser dos jogadores brasileiros sob cujos ombros já não pesa a responsabilidade de provar que o Brasil existe.

- Por isso aconteceu o fracasso e era natural que assim fosse – decretou o meu vizinho.

No fim perguntei a ele se a sua teoria poderia ser usada para prever o próximo campeão mundial. Ele não pensou para responder:

- O Uruguai.

Tentei ponderar que das equipes que disputarão as partidas semifinais a do Uruguai é a menos provável, porque mais fraca. Disse a ele que, em minha opinião, a Alemanha está jogando muito, daí reunir condições para vencer a Copa do Mundo. Ao que ele respondeu:

- Você está se esquecendo da balança. O Uruguai é o Brasil de ontem. O país precisa da vitória para dizer que existe e isso fará da seleção uruguaia a campeã do mundo.

Não nos dissemos mais nada. Não preciso dizer que acho isso uma loucura, mas não nego que ficarei intrigado se a seleção uruguaia sagrar-se campeã mundial.

Em tempos de flagelados fantasmas

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Não adianta: continuamos assombrados pelos fantasmas do futebol. A seleção perdeu e, três dias depois, a mídia escrita não trata de outra coisa. Há, sim, um esforço para retornar às manchetes sobre economia e assuntos políticos. Mas, a coisa anda devagar. Dunga ainda está entranhado nas goelas dos brasileiros, não desce de jeito nenhum, vai ser difícil digeri-lo, tirar a imagem dele da memória.

Agora, mais que nunca, o autoritarismo de Dunga vem à tona e o insucesso é explicado pela política de reclusão dos jogadores, imposta pelo técnico. De repente o escondido Jorginho, o auxiliar de Dunga, é retirado das sombras e se fala sobre a traição dele ao grupo por ter trazido sua família à África do Sul, contrariando tudo o que pregava ao grupo.

Os jogadores da seleção chegaram ao Brasil hoje e não foram bem recebidos. Ninguém entende o descontrole emocional daquele segundo tempo contra a Holanda e pede-se socorro aos psicólogos de plantão: deve existir uma explicação para tanta desgraça ocorrida num lapso de 45 minutos que se eternizam nas nossas memórias.

Querendo fugir dos fantasmas do futebol – por favor, inventem outra coisa para que esqueçamos a Copa – dou de cara com os flagelados fantasmas. Quem são eles? Trata-se de gente que está se aproveitando da tragédia provocada pelas chuvas em Alagoas. De repente, na destruída cidade de Palmares, aparecem pessoas de outros lugares que se infiltram nos abrigos dos verdadeiros flagelados para compartilhar da ajuda que esses vêm recebendo.

Tempos diabólicos esses, não? Fantasmagóricos mesmo. Seria engraçado não fosse horrível.

Dunga, flagelados fantasmas, ora…

Elano triste

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Aí está a foto de Elano, em close, no alto da primeira página. Impossível demonstrar tristeza maior que a desse jogador de repente impedido de jogar por causa de uma contusão.

Não importa o que se diga. Os clichês, “pátria de chuteiras”, “ufanismo verde-amarelo” e “o patriotismo é o último refúgio dos canalhas” não se confundem com a realidade de um homem isolado cujo drama é não poder jogar.

“A espera de um milagre” deixa de ser título de filme para se transformar nas palavras do médico da seleção: ele garante que só por milagre Elano voltará a jogar nesta Copa.

Não é preciso gostar de Elano, nem aprovar o futebol dele. Não importa se ele é essencial ou não para a seleção. O que vale é essa foto ao acaso, foto de drama que diz mais que todas essas bandeiras do Brasil penduradas por aí, meio sem que se saiba por que, como se estivéssemos vivendo uma enorme festa junina verde-amarela.

A foto nos lembra que de que há um brasileiro sofrendo na África e isso vale mais que muitos discursos e abraços oportunistas. Não importa se Elano está triste porque não pode jogar ou porque não pode defender o Brasil. Na verdade nem mesmo o drama importa: o que vale é essa tristeza na face do homem, exibida a todos nós, fazendo-nos lembrar de que nem tudo é glória, que o mal pode acontecer até mesmo através de um jogador de outra seleção que, de repente, maldosamente arrebenta com a perna de um seu colega de profissão.

Futebol e política

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A seleção francesa deu vexame na Copa do Mundo e o presidente Sarkozy decidiu interferir. Sobre esse assunto o jornalista Gilles Lapouge escreveu em matéria publicada na edição do último sábado, em “O Estado de São Paulo”:

“O presidente sabe que os resultados de uma Copa do Mundo de futebol têm influência na política. Em 1998, quando a França derrotou o Brasil, a taxa de popularidade do então presidente Jacques Chirac subiu 15%. A Copa também influi na economia. Ruben van Léeuwen e Charles Kalshoven já provaram que um país cuja equipe conquista a Copa do Mundo contabiliza um aumento de 0,70% do seu Produto Interno Bruto (PIB)”.

Esses dados não são nada desprezíveis. No Brasil, o presidente da República conta com um índice de aprovação de cerca de 80%. A vitória da seleção brasileira na Copa que está se realizando na África do Sul é de interesse imediato do governo. Considere-se, ainda, que o presidente tirou da manga uma candidata à sua sucessão e as pesquisas atuais demonstram que ele está conseguindo transferir a sua imensa popularidade a ela. Do que se conclui que a vitória da seleção na Copa poderá influir – e muito- no resultado das próximas eleições.

Mas, tudo isso são hipóteses o que não significa que venham a se realizar. Em todo caso, a candidata do presidente já está à frente nas pesquisas e a oposição anda perdida quanto às estratégias a adotar para inverter o rumo das coisas.

Seria o caso de dizer que os eleitores de José Serra deveriam torcer contra a seleção brasileira na Copa do Mundo?

“Cala a boca Galvão”

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Termina o jogo entre as seleções do Brasil e de Portugal. Jogo fraco, sem emoções, entediante, sonolento. Alguém ao meu lado fala em acordo entre compadres. Outra pessoa corrige: acordo de comadres.

Alguns jogadores do Brasil saem de campo com aspecto triunfante: o que importa é o resultado, a classificação em primeiro lugar no grupo. Os comentaristas das redes de televisão batem na mesma tecla: não havia porque se arriscar se o empate favorecia o Brasil. Ninguém nega a falta de criatividade dos jogadores e o futebol burocrático da seleção. Mas existe uma desculpa: é Copa do Mundo, o que vale é a classificação.

Na TV Globo, o narrador Galvão Bueno lembra que o Brasil pode não ter jogado bem, mas que, no próximo jogo, venha quem vier, haveremos de vencer. Afinal é o Brasil. O ufanismo verde-amarelo parece ser constitucional no narrador.

A frase “Cala a boca Galvão” tornou-se um dos tops da internet. Seria interessante conhecer o perfil econômico das pessoas que concordam com ela. Sendo o veículo a internet é de imaginar que maioria dos adeptos do “Cala a boca Galvão” pertença a classes de melhor formação. Se assim for o fato se justifica: é às pessoas mais bem informadas que incomoda o ufanismo de Galvão Bueno. Brasileiros capazes de enxergar a realidade do país, encoberta pela nuvem de grande progresso que se propaga por aí, são os mais descontentes com a tal “pátria de chuteiras” ou o “sou brasileiro” inscrito nas bandeirinhas pregadas nos carros.

É significativo o número de pessoas que não está torcendo pelo Brasil. O desencanto tem a ver com fatores como o ufanismo, a confusão entre patriotismo e feitos da seleção, o fato dos jogadores serem desconhecidos por atuarem no exterior e o técnico Dunga, em cujo bloco ninguém quer desfilar.

Dentro desse contexto, o ufanismo fácil de Galvão Bueno surge como piada de mau gosto. Galvão faz lembrar aquele Dr. Pangloss para quem se vive no melhor mundo possível. Talvez por essa posição utópica o narrador esportivo venha sendo tão lembrado através da campanha “Cala a boca Galvão”.

Uma coisa não se pode negar: o Galvão é proprietário de um otimismo invejável.

A dor de dente dos jogadores

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O pau comeu no bar da esquina, perto de casa: um cidadão comemorou o gol da Coréia em meio a fanáticos torcedores do Brasil que assistiam ao jogo pela televisão. O rapaz do quarto andar do prédio onde moro, aquele que anda sem camisa para mostrar a enorme tatuagem no braço, estava lá e me contou que deram uns sopapos no tal cidadão. Não aconteceria não fosse a cervejada - disse-me o rapaz.

Talvez, talvez. Certa vez fui assistir a um jogo no Morumbi entre São Paulo e o Botafogo de Ribeirão Preto. Na época o anel superior do estádio era identificado como arquibancada – hoje me parece que é geral. Pois comprei uma “bancada” de um cambista e lá fui eu para o anel superior, sentando-me no meio da torcida tricolor. Acontece que fui para o estádio sem pensar no assunto e, na ocasião, vestia uma camisa verde. Foi o que bastou para o pessoal da torcida organizada determinar que eu fosse um palmeirense infiltrado. Depois de muita discussão, não tive outro remédio: tirei a camisa verde e me arranjei com uma do São Paulo que os organizados me deram. Tive sorte: os caras ainda estavam sóbrios, a cervejada veio depois e aí eu já estava integrado.

O rapaz da tatuagem no braço me disse que o cidadão que apanhou não tinha jeito de torcedor da Coréia. Nem olho puxado ele tinha - disse o rapaz. De minha parte, não sei não. Hoje em dia não se pode confiar em ninguém. Não vi o cidadão, mas pode bem ser que ele seja algum estrangeiro que esteve na Coréia ou coisa assim e se apaixonou pelo lugar. O mais provável, porém, é que seja alguém que se irritou com o jeito de jogar do Brasil e tomou a arriscada decisão de torcer contra, bem ali, dentro do bar.

É possível. Leio nos jornais que há gente torcendo contra porque tem arrepios só em pensar que, se o Brasil for campeão, o Dunga poderá ser eternizado no cargo de técnico da seleção. Aliás, escrevem que essa seleção é a cara do técnico: burocrática, laboriosa, empenhada e nada criativa. Isso equivale mais ou menos a dizer que os onze do Brasil jogaram com dores nos dentes, daí que queriam que a coisa terminasse logo para ir ao dentista. Ou coisa parecida. Mas, que os dentes atrapalharam, isso atrapalharam como se viu, tal o desapego dos valentes rapazes com a bola durante o jogo.

E os coreanos? Rapaz, sobre os coreanos o melhor é apenas dizer que são coreanos, embora eu não seja capaz de distingui-los de outros povos orientais. No fim, como se diz por aí, é tudo japonês e pronto. Agora, quanto a chutar bola pode-se dizer, sem medo de errar, que os coreanos não são do ramo. Não faria diferença se a bola fosse só um pouquinho mais achatada ou coisa que o valha. Ainda assim, um daqueles caras de uniforme vermelho de repente arrancou e meteu a bola nas redes brasileiras. Foi quando o tal cidadão comemorou ali no bar da esquina e foi agraciado com uns sopapos em nome na nacionalidade brasileira ultrajada.

O rapaz do quarto andar não vestiu a camisa para entrar no elevador. Entramos no de serviço e, notando que ele estava arrepiado, perguntei se não estava com frio. A resposta dele foi estranha:

- Pô, os nossos jogadores aguentaram sensação térmica de 5º abaixo de zero.

Não compreendi bem a relação de solidariedade e não dissemos mais nada.

Depois do jogo, na televisão só se falava da seleção. Vi jogadores dando entrevistas e pensei em dentes cariados. Jogar com dor de dente é duro, tolhe a criatividade, a coisa não anda e até a Coréia vira ameaça. Só uma coisa assim pode explicar a atuação dos brasileiros.

A colher de cada um

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Não adianta: Copa em andamento, não se fala noutra coisa, o assunto é futebol. De repente a bola governa os interesses, resultados de jogos calam fundo na opinião. Ninguém está livre, mesmo os que detestam futebol tal a pressão do tema em todos os meios de comunicação.

A Copa do Mundo desperta toda sorte de análises e comentários. Existe o caso – específico – dos profissionais que ganham a vida escrevendo ou narrando coisas do esporte. São jornalistas esportivos de ofício e todo mundo sabe o que deles se espera, alguns mais lúcidos, outros menos dotados e uns poucos até obtusos. Isso sem falar nos narradores de jogos pela televisão e pelo rádio, alguns deles bastante criticados. Ao titular da Globo, Galvão Bueno, os críticos não perdoam os excessos de ufanismo. Mas o Galvão parece não ligar: ele é do jeito que todo mundo sabe, mudar seria bobagem.  

O mais impressionante fica por conta de gente subitamente convertida em analista esportivo. Trata-se de pessoas que normalmente não trabalham na área, mas que na época de Copas se arvoram entendidos. Meu amigo, se duvida, abra os jornais deste domingo: encontrará análises variadas sobre o futebol em si, as circunstâncias que o cercam, a importância do esporte, o esporte como traço de identidade nacional, as relações entre o futebol e o samba como expressões culturais, o papel da mestiçagem na formação dos craques nacionais, o complexo de vira-lata, a inesquecível tragédia de 1950 e por aí afora.

Nada demais nisso tudo, não fossem as impropriedades publicadas no calor da hora, no afã de participar de uma imensa cobertura que cubra todos os aspectos da competição. Entre as impropriedades talvez a pior seja a relacionada com a atual situação da África do Sul, país sede da Copa e nem por isso livre de grandes problemas e tensões internas. Não faltam na imprensa sociólogos de última hora interessados em retratar a realidade sul-africana, dimensionando-a em acordo com as necessidades de suas reportagens..

Meu amigo, a Copa do Mundo é um vendaval de impressões e notícias. As fantásticas ferramentas tecnológicas utilizadas para a cobertura do evento abrem um leque praticamente infinito de possibilidades para apresentações. Disso tudo o melhor fica por conta das mais de trinta câmeras utilizadas para a transmissão dos jogos. As imagens, tomadas de diferentes ângulos e em alta resolução, são realmente espetaculares. Olhe que ficam bem melhores quando se tira o som da televisão para escapar de algumas narrações e do chatíssimo e insuportável barulho de fundo provocado pelas vuvuzelas.

Esse pequeno artigo não pretende isentar-se das críticas nele contidas. Ele não passa de mais um escrito “no afã de participar da imensa cobertura”.

Os novos heróis nacionais

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Noite de domingo. A frente fria que fez cair temperaturas nos Estados do Sul chegou à região Sudeste. Ontem choveu, hoje tivemos tempo bom e frio.

Não só porque é noite de domingo – amanhã, bem cedo, a rotina nos espera – mas, também, porque faz frio, não saímos de casa e o jeito é ligar a televisão e dar uma olhada no que está acontecendo.

O grande assunto é a Copa do Mundo que está para ser iniciada.  Reportagens transmitidas diretamente da África do Sul caracterizam-se pelo esforço em apresentar o país sede da Copa aos brasileiros. Como não poderia deixar de ser o apartheid é a toda hora lembrado e as notícias giram em torno do contraste entre a minoria bem de vida e a maioria que vive em extrema pobreza. É sempre citado o esforço do governo sul-africano para melhorar as condições de vida da população. Brancos de ascendência inglesa mostram-se céticos quando entrevistados; negros dizem que o apartheid continua vivo.

Por vezes o assunto é a natureza, com ênfase para a fauna da África do Sul rica em animais como elefantes, girafas, rinocerontes etc. Entretanto, o grande destaque das reportagens transmitidas da África do Sul resume-se aos acontecimentos relacionados ao dia-a-dia da seleção brasileira. Mais que isso, engendrou-se na mídia uma forma de endeusamento dos jogadores que são apresentados como modelos de sucesso e verdadeiros heróis nacionais.

Sendo a maioria, senão a quase totalidade, dos jogadores oriundos de famílias pobres ou no máximo remediadas, não é difícil compor a trajetória de ascensão dos ídolos populares que defenderão a honra verde-amarela dentro das quatro linhas. Isso é feito com a participação das famílias dos jogadores, pessoas do povo, chamados a relatar a luta e o esforço de seus filhos ou parentes para chegar a jogar na seleção. Também importa a escalada a um status financeiro invejável: pessoas pobres e boas de bola que saíram de condições quase miseráveis para hoje jogar em grandes clubes da Europa, sendo pagos a peso de ouro pelos seus chutes ou defesas.

Nada haveria contra esse tipo de reportagem não fosse ela a exploração banal de sucessos merecidos, mas que não servem como exemplo aos milhões de deserdados que nenhuma oportunidade têm - ou talvez nunca terão - de modificar, ainda que minimamente, suas situações financeiras.

Afinal, a quem interessa a história pessoal desse ou daquele jogador que hoje ganha rios de dinheiro e transitoriamente foi convocado para jogar pela seleção nacional? O que se está a ver, não passa da exploração da imagem de ídolos populares que, por mais que se queira, continuam sendo jogadores de futebol, excelentes em suas profissões, mas jogadores.

O Brasil passa por fase de ufanismo excessivo e perigoso, fato verificado em várias áreas. É como se tudo estivesse se ajeitando depressa e problemas tão conhecidos deixassem de existir. Uma corrente de ufanismo é sempre boa quando nascida de expectativas naturais; entretanto, esse movimento goela abaixo, a forma descabida de apresentar o que se faz em prol do país como realizações espetaculares nada têm de sério e produtivo.

Por fim, o futebol nada tem a ver com isso tudo. Resumindo: jogador joga; nós torcemos. O resto é figuração ou exploração pura e simples da paciência dos espectadores.