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O fenômeno Lula

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Ainda é cedo para uma análise retrospectiva do fenômeno Lula. Alicerçado em suas origens e despontando como alguém do povo que venceu, transformou-se ele num símbolo popular cujo significado maior é o de que, sim, é possível chegar lá.

Todo mundo sabe como é o presidente, homem para quem as convicções andam de par com as necessidades. Dotado de incomum senso de oportunidade não há que se negar a ele brilho: circula com desembaraço em todos os meios e mostra-se como um intuitivo capaz de fazer escolhas acertadas quando o que está em jogo são os interesses políticos. Agindo assim, irmanou-se ao povo que o elegeu e sua trajetória consiste em conquistar cada vez mais novos adeptos. Decorre daí sua imensa popularidade, os incríveis índices de aprovação e, mais que isso, o fato de lograr transferir a uma quase desconhecida seu legado transformando-a em sua sucessora, pelo menos nessa direção apontam as pesquisas de opinião.

Mas, que fenômeno é esse? De que natureza é essa trajetória impressionante? Para tentar responder a essas perguntas recorro a um artigo escrito pelo crítico José Veríssimo, em 1901. Sob o título “Duas Lendas” Veríssimo analisa, no aniversário da morte de ambos, os perfis do ex-presidente Floriano Peixoto e do Almirante Saldanha da Gama.

Embora a imagem de Floriano seja bastante diferente da de Lula, une-os a origem simples que emula e comove a massa popular. Sobre Floriano diz Veríssimo:

“Ele é bem o homem representativo do povo brasileiro, que se embevecia de saber que ele a si mesmo se chamava de caboclo, orgulhando-se da humildade da sua origem, de ser o “legítimo brasileiro”, segundo o velho erro, irradicável da opinião popular de que o Brasil é o bronco e ruim selvagem que o habitava”.

Mais à frente Veríssimo afirma que Floriano venceu e que o povo prefere, salvo casos raros, o vencedor ao vencido. E completa, buscando explicar a lenda em que se tornou Floriano:

“Em almas simples e honestas a devoção por Floriano foi grande, intensa, completa e sincera; um pouco mais e o adoravam. Não esqueçamos que foi o medo o criador os deuses. Certo que na massa florianista havia, como há ainda, especuladores de todo o gênero, gente de má fé que explorava a situação, em que o governo era forte, mas não podia ser escrupuloso; mas fora destes era grande o número de convictos, dos desinteressados, dos arrastados no arrastamento geral que levava as massas para o soturno e singelo ditador do Itamaraty.”

Seria primarismo superpor fatos históricos e plasmar perfis em si tão diferentes. Entretanto, o texto de Veríssimo é esclarecedor no tocante à idolatria popular em relação a alguém reconhecido como igual pelo povo.

Entre o atual presidente da República e a grande massa existem identidades e ligações profundas que com certeza contribuem para a imensa popularidade dele. Esse, talvez, grande fantasma a assombrar a oposição que luta para chegar ao governo. Vencer um sentimento arraigado e adubado com promessas e benesses talvez seja mesmo tarefa impossível de Brasil de hoje. Quanto ao fato de Lula se tornar uma lenda, como o foram Floriano de Saldanha da Gama, só o futuro dirá.