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Fugindo do cigarro

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Larguei o cigarro há 20 anos, mas se me perguntarem respondo que sou fumante. Fumante que não fuma: pronto, é isso aí.  Explica-se: se eu filar um cigarro e fumá-lo agora, unzinho, tenho a certeza de que o meu próximo passo será comprar um maço na padaria da esquina e começar a fumar, loucamente.

Fui fumante compulsivo, daqueles que acendem um cigarro no outro e chegam a ter dois acesos ao mesmo tempo. Vivia em meio a nuvens de fumaça dado que as pessoas com quem convivia também fumavam. Quantas reuniões de trabalho, durante horas em salas fechadas, com pelo menos três pessoas fumando e aspirando o ar poluído pela fumaça, irrespirável.

O problema - o grande problema - é que eu adorava e ainda adoro o cigarro. Ele é uma muleta e tanto, ajuda a compor a imagem do sujeito, confere charme e segurança.  Quando se entra num lugar onde não se conhece ninguém, não é verdade que o cigarro se impõe como bom companheiro? E nas situações estressantes não é ao cigarro que se apela para suportar a pressão?

Conheço pessoas que não querem parar de fumar, mas são obrigadas a isso, em geral por imposições médicas. Os pulmões vão mal, a respiração torna-se difícil, o coração acelera-se.  Mas, como parar? É quando entram em cena diferentes métodos a serem adotados, inclusive o uso de pastilhas de nicotina etc. Há quem comece diminuindo: o sujeito passa a fumar meio maço por dia, mas continua fumando. O fato é que não existe regra geral embora possa se afirmar que é preciso fazer valer a própria vontade para deixar de fumar. Sem decisão firme e esforço a escravidão ao vício seguramente persiste.

Cheguei a fumar três maços por dia. Aconteceu-me certa vez ir a uma festa, à noite, que durou até a madrugada. Nessa ocasião acrescentei aos três maços um quarto. Na manhã seguinte, ao acordar, imediatamente procurei pelo maço sobre o criado mudo e trouxe um cigarro à boca. Entretanto senti que meus lábios estavam machucados, em carne viva, afora o horrendo paladar impregnado pela fumaça. Foi quando decidi não fumar naquela manhã. Ao meio-dia pensei em fumar, mas ainda não me sentia bem e deixei para a noite. Foi assim que, deixando para um pouco depois, deixei de fumar. No segundo dia comprei uns maços na padaria e deixei-os nos lugares de sempre porque entendi que tinha que ter o adversário à mão para poder lutar contra ele.

Já se tinham passado uns quatro dias quando alguém me chamou, em casa, e me assustei. A minha reação ao susto foi socar uma estante próxima a mim, até machucar as mãos. Então compreendi que cigarro é vício semelhante ao uso de  drogas ou álcool e nunca mais fumei.

No primeiro mês com frequência batia as mãos nos bolsos procurando pelo maço de cigarros. Venci esse automatismo, mas confesso que cerca de um ano depois eu ainda sonhava ocasionalmente que estava fumando e experimentava prazer nisso.

Vi muita gente se arrebentar fumando demais. Nunca me esqueço de um conhecido internado em UTI de hospital, pulmões encharcados e com balão de oxigênio, pedindo a mim um único cigarro. Ele morreu três dias depois e não sei se pode satisfazer o seu último desejo de fumar. Conheço safenados que tornaram ao vício, pessoas que sofreram AVC e continuam fumando. Trata-se de um vício terrível.

Hoje em dia é proibido fumar em lugares fechados. Já se pode ir a um bar ou restaurante sem passar pelo suplício de aspirar a fumaça expelida pelos fumantes. Não se pode fumar em aviões e isso é muito bom. Entretanto, não sou dos que crucificam fumantes e reclamam contra o vício deles. Primeiro porque, como disse antes, ainda me considero um fumante; segundo porque Deus sabe como é difícil abandonar o vício.

Se alguma coisa deve ser dita aos jovens sobre cigarros é que não devem experimentar. Ao primeiro seguirá o segundo e pronto eis aí instalado um vício difícil de abandonar.

Escrito por Ayrton Marcondes

13 julho, 2012 às 12:30 pm

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