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Os Nogueiras

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Não tenho notícias recentes dos Nogueiras. O último deles a quem encontrei foi por puro acaso, num ônibus em São Paulo. Eu acabara de tomar um coletivo na Praça João Mendes em direção à Vila Mariana. Naquela época estava morando em casa de uns tios a quem tinha dito que ficaria por poucos dias até me arranjar na cidade grande. Os poucos dias viraram quatro anos, bem vividos na excelente companhia deles, ótimas pessoas hoje já mortas. Aconteceu que, decorrido um mês desde a minha chegada, avisei ao meu tio que sairia da casa dele na manhã seguinte. Meu tido sabia muito bem que eu ainda não tinha para onde ir daí ter-se oposto à minha saída. Opôs-se com tanto ímpeto que fui ficando, ficando. Não foi simples me mudar da casa de meus tios que, mesmo após os quatro anos, insistiram muito para que eu continuasse com eles.

Mas, ao Nogueira do ônibus. Quando chegamos ao ponto onde eu desceria, o motorista do olhou-me e perguntou:

- Não está me reconhecendo?

Só então observei melhor o negro esguio que dirigia o ônibus. Era o Antenor, irmão do Policarpo, da Anastácia. Eu o conhecia desde os meus tempos de menino, assim como a seus pais e irmãos. Trabalharam eles numa fazenda que pertenceu ao meu avô, herdada pelo meu pai que nunca soube como administrá-la daí tê-la vendido. Mas, de algum modo as nossas vidas ficaram ligadas ao Antenor e sua família, pessoas que sempre tivemos como gente nossa, aparentados. Encontrar o Antenor que vi crescer na roça, agora vivendo na cidade grande, deixou-me feliz. Mas, o ônibus devia seguir em frente, de modo que me despedi e desci no ponto próximo à minha casa.

Depois disso ouvi falar sobre a gente Nogueira algumas vezes. Soube que, depois da morte dos pais, os filhos deixaram a fazenda e foram viver em cidades. Não sei se todos vieram para São Paulo, como aconteceu ao Antenor. Em todo caso, depois do encontro casual com o Antenor nunca mais os vi.

Escrevo sobre a gente Nogueira porque encontrei numa gaveta de casa uma fotografia na qual o Antenor e o Policarpo aparecem. É uma foto em preto-e-branco, bastante desgastada e não sei como veio até mim, provavelmente em meio a papéis que pertenceram a meus pais.

Olhar para essa fotografia fez-me voltar ao passado, às longas viagens de charrete por estradas de terra até a fazenda, levado pelos meus pais. Aquelas pessoas já não existem e o mundo em que viveram se desfez por completo, substituído que foi por essa urgência arrogante que nos rouba tempo e atenção, sepultando em velhas fotografias parte daquilo que fomos e tão raramente nos lembramos.

Quanta saudade!

Escrito por Ayrton Marcondes

3 abril, 2012 às 4:01 pm

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Postado em Cotidiano



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