2011 setembro at Blog Ayrton Marcondes

Arquivo para setembro, 2011

Cenas de filme

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As cenas do grande acidente ocorrido ontem na Rodovia dos Imigrantes são de fato dignas de filme. Impressionante como mais de 100 veículos trombaram uns nos outros, havendo inclusive explosões. Fez-nos lembrar, também, das catastróficas explosões que com frequência acontecem nos países onde acontecem atentados a bomba.

O megaengavetamento com colisões em cascata ocorreu em lugar de intensa neblina. Não se sabe ao certo como começou, supondo-se que em primeiro lugar dois caminhões colidiram. Depois sobreveio a confusão com a ocorrência de uma morte e vários feridos, alguns em estado grave. Em meio à neblina e incrédulos diante da dimensão da catástrofe circulavam pessoas, tentando-se organizar atendimento aos feridos. Pessoas gritando, quebrando janelas para sair dos carros, explosões e incêndios. Cenas de filmes, de ficção, como aquelas que costumamos ver nos cinemas.

É claro que todo mundo tem horror à possibilidade de participar de acidentes. Quando eles acontecem e as pessoas saem ilesas predomina o alívio, apesar de prejuízos. Não foi o que se viu ontem: pessoas andavam de um lado para outro, perdidas, sabendo-se participantes de episódio quase inacreditável. De fato o número de veículos destruídos, as imagens de ferro contorcido, o choro de crianças e gente presa nas ferragens geraram situação de pânico e correria. Em meio a tudo isso a marcante imagem de um casal que sobrevivera miraculosamente embora o carro em que viajavam tivesse ficado completamente destruído.

O acidente de ontem me fez lembrar de outro que me aconteceu quando eu era ainda menino. Teria uns oito anos de idade quando fomos levar, eu, minha irmã e um irmão, meu pai a uma estação de bondes onde ele embarcou. Na volta o motorista do carro em que viajávamos enganou-se quanto ao trajeto. Na noite escura e nebulosa perdeu ele de vista o leito da estrada: ao invés de passar por cima de uma pequena ponte, meteu-se ele no vazio, pelo que fomos parar embaixo da ponte. Situações como essa exigem sangue frio o que, infelizmente, faltou ao motorista que, em pânico, evadiu-se deixando-nos lá.

Ficamos ali por um tempo que não sei precisar. Sentados no banco de trás do carro e machucados chorávamos. Pois foi esse bom choro que nos salvou. Algum tempo depois passou pelo lugar um caminhão cujo motorista ouviu nossos reclamos e nos socorreu. Mas, ficou do episódio o horror de um acidente para nós grandioso e o medo que se apossou de mim quando imerso naquela escuridão e sem saber direito o  que estava acontecendo.

O motorista? Bem, aqueles eram outros tempos, diferentes as responsabilidades. Bronca aqui, bronca ali, no fim ficou tudo por isso mesmo. Estávamos vivos, tudo não passara de um susto, perdendo mais o meu irmão que recebeu uma cicatriz no rosto a qual carregou vida afora, até morrer.

O aumento do número de dias letivos

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O Ministro da Educação, Fernando Haddad, propõe aumento do número de dias letivos nas escolas. Baseia-se em ele em estudos nos quais se constata que quanto mais tempo os alunos passam em sala de aula melhor se torna o aprendizado deles. Assim, o número de dias letivos, atualmente de 200, passaria a 220; ou haveria aumento do número de horas de aulas por dia; ou ambas as coisas.

O Ministro anuncia a proposta e a reação em todos os meios é de cautela. Ninguém se atreve a dizer que o problema não está no número de horas do aluno em sala de aula. No máximo se afirma que é preciso avaliar bem o que os professores farão com as horas a mais e lembra-se que o aumento terá como consequência mais gastos para os cofres públicos e majoração das mensalidades em escolas particulares.

Quem garante a relação positiva entre maior carga horária e aprendizado é a literatura internacional sobre o assunto. Mas, não custa lembrar que, obviamente, existem particularidades nacionais e mesmo regionais a serem respeitadas. Alguns educadores ouvidos destacam a necessidade de um projeto de atividades para os alunos e mesmo a fixação de professores numa só escola. Outros se preocupam com o que farão os professores com o tempo maior disponível.

Na verdade a questão esbarra em vários óbices que deveriam ser considerados antes mesmo de ser feita qualquer proposta.  Em outras palavras, urge consertar primeiro o que está malfeito para depois pensar em acréscimos. Basta lembrar que nos últimos anos escolas públicas e particulares têm se defrontado com problema bastante sério qual seja o da falta de professores. Não está aqui se falando da escassez de profissionais que é outro problema. Trata-se de faltas mesmo, do não comparecimento que, entre outras consequências, prejudica o ensino e afeta dramaticamente o plano de trabalho dos professores. Para que se tenha ideia só no Estado de São Paulo verificaram-se, em 2007, na rede pública um total de 398 mil faltas de professores; em 2008, graças a uma lei de regularização dos atestados médicos, o número de faltas caiu para 160 mil. Mais: dados do Censo Escolar de 2009 tabulados pelo Inep informam que pouco mais da metade (53,3%) dos professores que atuam no ensino médio da rede pública não têm formação compatível com a disciplina que lecionam. Se a isso acrescentarmos as notícias frequentes sobre péssimas condições de algumas escolas, desvios de verbas, falta de lanches para crianças, desperdício de livros didáticos, violência na sala de aula, desestímulo de professores, políticas salariais e muito mais veremos que existe um longo caminho de saneamento a percorrer antes de chegar-se a uma solução como a do aumento da carga horária ou do número de dias letivos.

O que se faz necessário é pesar bem o significado dos resultados alcançados pelas escolas no exame do ENEM. O resultado sofrível obtido pelas escolas públicas não deve servir como ponto de partida para propostas e medidas apressadas. Pode até ser que o aumento do número de dias letivos prescritos pela literatura internacional sobre o assunto venha a contribuir para a melhora do aprendizado nas escolas brasileiras. Entretanto, ai sim é preciso cautela porque sabe-se muito bem que o problema da educação no Brasil, assim como o da saúde e outros, não será resolvido com canetadas e decretos.

Uma coisa de cada vez, pelo amor de Deus.

Juros e inflação

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O bate-boca relacionado à redução da taxa de juros decretada pelo Banco Central continua. De um lado posicionam-se os contrários à medida. Alegam ser absurda a redução enquanto a inflação está em alta. Entendem, ainda, que o Banco Central tomou a medida em acordo com o governo, ferindo-se o princípio de autonomia do mesmo Banco.

Os favoráveis à redução dos juros dizem que é preciso ver a economia como um todo, daí nada ser mais natural que a adoção de medidas em conjunto. Acrescentam que o absurdo é defender a ideia de que meia dúzia de oráculos em atividade no Banco Central tenham a prerrogativa de agir sozinhos, determinando medidas que afetam a economia do país. Por fim, o Ministro da Fazenda fala como se tivesse apenas recebido a notícia da queda dos juros sem participar da decisão. Está em jogo a cartilha adotada pelos governantes, a qual reza que cada um deve permanecer no seu quadrado.

Ao cidadão comum é difícil, senão impossível, distinguir entre o certo e o errado. O que o cidadão quer é que se tomem as medidas mais adequadas para a estabilização da economia, de preferência protegendo o país do ciclo recessivo que corre solto no mundo. De uma coisa todos estão certos: não se pode acreditar muito nos discursos dos poderosos dado que guiados por vasta gama de interesses. No final das contas o que se teme é o peso de medidas erradas no bolso do contribuinte que está farto das péssimas qualidades de serviços prestados pelas instituições. Muito discurso, muita promessa, ufanismo exagerado e situação degradante em vários setores, agravada pela já monumental corrupção.

Ao leigo não escapa que a economia vive de oscilações entre períodos de recessão e expansão. A ação dos governos diante da alternância de ciclos econômicos baseia-se em atitudes keynesianas através de medidas de controle dos bancos centrais e governos. É o intervencionismo que contraria o laissez-faire defendido pelos liberais. Nesse sentido não deixa de ser interessante a entrevista do Prêmio Nobel John Nash concedida ao jornal “Folha de São Paulo”. Nash que ficou mundialmente conhecido através do filme “Uma Mente Brilhante” ataca o modelo keynesiano, destacando o exagerado valor dado à moeda. Sendo a moeda a base de troca entre as nações - e oscilando sempre - ela dificulta os negócios.  Daí Nash sugerir uma nova “moeda ideal” cujo valor se baseie em commodities. A “moeda ideal” seria estável e facilitaria o fluxo de negócios, inclusive os acordados em longo prazo porque baseados em dados seguros.

A “moeda ideal” proposta por Nash ainda não tem nome e nasceria de um acordo entre as nações que a adotassem. Evitaria os ciclos de recessão e expansão? Pergunta difícil de responder para um leigo mais preocupado em fechar as contas do mês em sua casa.

Prisão perpétua

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Dois brasileiros estão presos há 7 anos nos EUA. Um deles era dono de uma firma de transporte de passageiros para aeroportos etc. Esse homem foi contatado por outro brasileiro que o contratou para transportar a mulher dele e uma filha pequena até a Flórida. Detalhe: a mulher e a menina tinham entrado ilegalmente no país.

Para executar o serviço o prestador convidou um amigo para auxiliá-lo. O problema veio quando da cobrança do valor combinado para o transporte. Consta que o contratante, para não pagar pelo serviço, acusou o prestador e seu auxiliar de terem sequestrado a mulher e a menina. Nem mesmo o fato da mulher e a filha terem sido bem tratadas pelos transportadores chegou a convencer o júri dai os dois homens terem sido condenados à prisão perpétua.

Nos EUA o crime de sequestro é punido com a prisão perpétua, significando “pelo resto da vida”. Isso acontece desde que um filho de Charles Lindbergh foi sequestrado e morto. Lindbergh tornara-se famoso e herói nacional por ter realizado, em 1927, um voo solitário e sem escalas entre os EUA e a Europa. O avião de Lindbergh, chamado “The Spirit of Saint Louis” fez o percurso entre o Condado de Nassau, no Estado de New York, e Paris em 33h e 31 minutos. O sequestro do filho de Lindbergh ocorreu em 1932; o sequestrador foi preso e executado em 1936.

No Brasil não existe prisão perpétua, sendo a pena máxima a ser cumprida de 30 anos. Entretanto o caso dos dois brasileiros condenados nos EUA dá o que pensar. Informa-se que já foram detectados nos processos de ambos graves erros judiciários, mas eles continuam presos. Até aí nenhuma surpresa porque coisa semelhante acontece no Brasil. Entretanto, o que chama a atenção no caso é o rigor da pena. No Brasil sequestros tornaram-se rotina, embora frequentemente sejamos informados de que as estatísticas desse tipo de crime estão em declínio em algumas capitais. A pena prevista para autores de sequestros é de 1 a 3 anos, existindo agravantes que mudam o prazo para de 2 a 5 anos. Quando há sequestro de pessoas com intuito de extorsão a pena de reclusão passa a ser de 8 a 15 anos.

Autoridades, juristas e defensores direitos humanos discutem a validade de penas mais duras no sentido de inibir a prática de crimes.  O medo da condenação por muitos anos teria sobre criminosos em potencial algum efeito. Há quem discorde frontalmente disso enquanto outros acham que a medida teria pelo menos o mérito de afastar por mais tempo da sociedade criminosos perigosos. Num ponto todos concordam: o problema maior está na área da educação que em geral conduz as pessoas á prática do bem.

Obviamente não me cabe dar opinião sobre assunto complexo e distante da minha esfera de compreensão mais profunda. Entretanto, não posso me furtar a dizer que a ideia de prisão perpétua me é simpática. Será mesmo que um sequestrador pouco se importaria com a possibilidade de passar o resto da vida preso, sem atenuantes por bom comportamento, sem direito a indultos e tudo o mais?

Enfim, dias atrás recebi mais um daqueles telefonemas nos quais uma pessoa chora muito e um possível sequestrador diz tratar-se de alguém da nossa família, uma filha por exemplo. Todo mundo conhece o golpe, mas mesmo sabendo creio que ninguém sai ileso do nervosismo provocado pelos momentos de dúvida, aquele período no qual se tenta localizar a pessoa que se supõe sequestrada. Então, já que temos que passar por isso e como os sequestros continuam a acontecer, será mesmo que uma pena rigorosa não serviria para reduzir as ocorrências desse tipo de crime?

Repórteres de campo

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Confesso que muitas vezes desligo a televisão e passo a ouvir os jogos de futebol pelo rádio. Acontece quando o meu time joga: fico nervoso vendo o baixo rendimento da equipe pela televisão. Aí passo ao rádio e me entrego aos lances descritos por locutores, comentaristas e repórteres de campo.

Não custa lembrar que pertenço à geração que cresceu ouvindo esportes pelo rádio. Grandes locutores do passado como Pedro Luís, Edson Leite e Fiori Giglioti tiveram carreiras memoráveis. Hoje em dia também dispomos de bons locutores de futebol embora e talvez mais que antigamente, acrescentando emoção maior que o real aos lances narrados.

As entrevistas de bastidores, as falas de técnicos e jogadores antes e depois dos jogos não deixam de ser interessantes. São elas que alimentam a paixão de um público sempre ávido de novidades. Em função disso os programas de rádio que têm como tema o futebol contam com boa audiência. O futebol é paixão nacional e ponto final.

É parte integrante da cobertura radiofônica dos esportes praticados no país a atividade dos chamados repórteres de campo a quem cabem entrevistas com cartolas, técnicos e jogadores. Embora não se possa generalizar não será demais dizer que ultimamente alguns desses profissionais têm se aplicado em obter declarações bombásticas e conflituosas. Em alguns casos acontece até mesmo de o repórter insistir em alguma colocação quando não se empenhar em colocar na boca do entrevistado uma opinião que não é bem a dele. Outro dia mesmo, após um jogo do Palmeiras, um repórter abordou o jogador Valdívia e a todo transe quis arrancar dele revide a uma declaração que teria sido feita por outro jogador. Valdívia defendeu-se dizendo coisas como “que bom para ele”, nitidamente constrangido pela insistência de um repórter que se negava a deixá-lo em paz enquanto não obtivesse uma declaração que daria pano para manga ao longo da semana.

O futebol precisa da mídia, assim como essa vive do futebol. A rivalidade entre torcidas tem o lado bom de tornar o esporte mais interessante e disputado, isso quando não descamba para a violência e a bestialidade. Notícias que alimentem as paixões, desde que sinceras e honestas, contribuem para que o esporte mantenha o seu público cativo. O futebol por si só é grande demais e não precisa de emulações que ferem indivíduos em suas atividades profissionais. Sendo verdade que figuras do esporte são personagens públicos daí a privacidade delas sempre correr o risco de ser devassada, ainda assim entrevistas e comentários tendenciosos devem ser evitados.

Hoje mesmo ouvi pelo rádio a entrevista de um presidente de clube de futebol na qual o repórter aplicava-se em sintetizar as declarações obtidas. Coisa do tipo: então o Sr. está afirmando que… Pois não houve uma dessas sínteses do repórter que não fosse corrigida pelo presidente, dizendo que não afirmara exatamente aquilo. Recentemente uma jovem repórter cujo trabalho consiste em noticiar as atividades de um grane time do interior foi questionada, durante a sua participação em programa esportivo, sobre se tinha alguma notícia sobre noitadas de jogadores e assim por diante. Dizendo que nada sabia sobre isso foi a ela recomendado que “ficasse de olho” porque o público precisa ser informado.

As emissoras de rádio sempre contaram com ótimos repórteres, alguns muito talentosos e inesquecíveis. Muitos deles estão em atividade, daí não se poder generalizar o modo inadequado de buscar notícias que faz parte da rotina de uns poucos.

Daqui a 150 anos

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Aconteceu de um rapaz me perguntar se é verdade que, em 150 anos, o mar avançará tanto que uma cidade litorânea, como Santos, terá deixado de existir. Estávamos no último andar do prédio onde moro e olhávamos para o mar num dia inesperadamente belo. Ao ser perguntado não resisti e disse ao rapaz:

- Dizem que sim, mas não pretendo esperar.

Depois desse curto diálogo a primeira coisa em que pensei foi no desaparecimento de civilizações. Os canais pagos frequentemente repetem um documentário sobre Machu Picchu, a cidade perdida dos incas. Não deixa de ser interessante ver imagens de um local situado a 2400 m de altitude que conserva vestígios de um povo que ali viveu. Templos, casas e cemitérios datados da era pré-colombiana permanecem como testemunhos da extinta civilização inca.  É a ideia do que foi e deixou de ser, de desaparecimento total que instiga a curiosidade, sugerindo que também a civilização humana um dia terá fim, nada restando do mundo que construímos e no qual vivemos. A finitude é arrasadora, corrói a noção de eternidade e afeta diretamente o sentido que damos à vida. Afinal, se tudo pode acabar de repente, se aquilo em que acreditamos não nos pode valer numa hora extrema, que sentido podemos dar a tudo isso?

Quem gosta desse assunto é Hollywood. Filmes e filmes são produzidos tendo por tema o fim do mundo. O apocalipse nos espera, mas pode vir de várias formas: movimento de placas tectônicas resultando numa formidável reação dos mares cujas águas cobrem tudo, colisão de corpos celestes com a Terra, vinda de alienígenas mais avançados tecnologicamente para dominar e destruir o planeta etc. Em situações como essas vemos nas telas humanos fragilizados, correndo desesperadamente para fugir a algo impossível de evitar porque maior e definitivo, impondo-se o fim à civilização humana. Imagens de cidades inteiras engolidas pelas águas são terrificantes. Nova York, símbolo da pujança norte-americana, é a preferida dos cineastas. De fato, são inúmeras as vezes em que a Estátua da Liberdade é derrubada pelas águas oceânicas, dando início a um processo de destruição e desparecimento total dessa grande metrópole.

Mas, à pergunta do rapaz. De que as consequências do efeito estufa são notáveis, entre elas o degelo das calotas polares com subida do nível dos mares, todo mudo sabe. Existe, sim, um grupo de cientistas que discorda disso, mas o consenso é o de que as nações devem cuidar com urgência da poluição e emissões de gases para evitar as consequências do efeito estufa. Demais, nos últimos tempos os fenômenos atmosféricos tem-se tornado mais frequentes e agressivos. Temperaturas elevadas, grandes secas, chuvas excessivas, furacões, tornados, tsunamis e terremotos têm acontecido com frequência assustadora. Neste momento mesmo está em andamento o furacão “Katia” que ameaça as Bermudas e a costa leste dos EUA. No Brasil a secura do ar é recorde em algumas capitais. Entretanto, daí à subida do nível dos mares a ponto de encobrir cidades há uma distância muito grande, pelo menos por agora.

O rapaz que me fez a pergunta é um jovem cuja formação não passa de básica. A ele escapam as explicações e teorias acerca do ambiente. O que o assusta é a noção de que tudo acabará um dia, o fim do mundo. Pedreiro de ofício o rapaz vive a construir e sabe quanto esforço é necessário para erguer uma simples parede. Talvez por isso a ideia de uma destruição total, em poucos minutos, de algo grandioso e construído ao logo de tanto tempo o revolte. Foi o que me disse depois. Para ele nada disso chegará a acontecer porque sempre existe um jeito de impedir, quem sabe a ação divina a proteger os homens.

Depois da farra

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O Brasil se parece com aquele sujeito que se embriaga, gasta mais do que pode e depois, curtindo a ressaca do dia seguinte, pondera que vai ser preciso arranjar mais dinheiro para pagar as contas.

De que o setor de saúde do país vai muito mal todo mundo sabe. O descalabro do atendimento de alguns casos faz a delícia dos programas policiais na televisão. Sob o pretexto de informar e dar voz à população carente, repórteres parasitam pessoas simples em momentos de puro desespero, arrancando delas declarações agudizadas por situações de dor e sofrimento. O mote é o dever de informar, mostrar a sociedade como ela é, abrir as entranhas do tecido social para delas extrair a verdade. Não se pode negar o impacto dessa classe de jornalismo sobre a população. Também é verdade que o acumulo de publicações sobre descalabros no setor de saúde movimenta a opinião e obriga o governo a s posicionar. Faca de dois gumes, portanto, mas que se serve de situação lamentável a precisar de atitudes firmes e muito bem definidas. Sendo óbvio que o problema não se resolve em curto prazo, por outro lado faz-se necessário sair do conhecido discurso de promessas, deixar de lado a retórica e agir.

Agora vem a presidente da República reconhecer publicamente a situação em que se encontra a saúde. Fala ela sobre a criação de novo imposto cujos recursos seriam destinados à área de saúde.

O bom do sistema republicano democrático é justamente certa falta de responsabilidade em relação a problemas que rolam de um governo para outro. Cada novo governo herda do que o precedeu situações que ao longo dos anos se deterioram cada vez mais, todas elas enfeixadas como “herança maldita”, designação que mais parece ter sido criada para diminuir as reponsabilidades dos governantes de momento. Não que eles necessariamente se furtem à reponsabilidade, os problemas é que se apresentam complexos demais.

É nessa hora que o contribuinte se escandaliza ao ser chamado para ajudar a fechar um buraco que não ajudou a fazer. É a hora em que nos lembramos dos gastos excessivos e desnecessários do governo anterior que se empenhou numa maratona de inaugurações quase todas com interesse eleitoreiro. A farra foi grande bastando, para citar um só caso, a criação do campus da Unidade Acadêmica de Garanhuns, ligada à universidade Federal de Pernambuco. Segundo divulga o jornal “O Estado de São Paulo” a tão propalada “primeira extensão universitária do país” encontra-se em estado lamentável no qual, para se dizer o mínimo, falta tudo.

Quem ler o jornal “Folha de São Paulo” deste domingo ficará deveras espantado com a manchete de primeira página: “Brasil perdeu uma Bolívia em desvios de cofres públicos”. Segundo o jornal, dados de órgãos de controle revelam desfalque de pelo menos R$ 40 bilhões em recursos federais em sete anos. Trata-se de valor equivalente ao PIB da Bolívia que, informa o jornal, tornaria possível reduzir à metade o déficit de 25 milhões de moradias sem saneamento no país.

Malversação de verbas públicas, corrupção ativa até mesmo dentro de ministérios, populismo enganador, sede de poder, por tudo isso e muito mais cobra-se dos responsáveis pelo país ações firmes e respeito pelo povo. Seria aviltante num país onde desmandos e corrupção correm soltas e a céu aberto taxar-se ainda mais os contribuintes para arrecadar recursos com a finalidade de sanar o que quer que seja.

O problema é que para o lado dos contribuintes o raciocínio não fecha: mais dinheiro, mais corrupção e o cidadão pagando a conta.

O certo e o errado

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As meninas que arrebentam na Vila Mariana viraram notícia, escandalizando a opinião. Jovens moradoras de rua, algumas com menos de 12 anos de idade, assaltam e depredam. Levadas à polícia e aos serviços destinados à recuperação de jovens conclui-se que, em relação às menores delas, nada existe para fazer. Um sociólogo vem a público com artigo em jornal para lembrar que nada há a fazer: elas moram nas ruas para onde são devolvidas. Nas ruas espera-as o vício, a prostituição e o crime. Uma escola de marginais a céu aberto, portanto, triste retrato da desigualdade social que tem como fator de propulsão, entre outros, a proliferação de famílias sem qualquer condição econômica, gerando numerosos filhos.

Enquanto isso a justiça inglesa se vê às voltas com as punições aos que participaram dos recentes distúrbios em Londres. Em meio a eles está um menino de 11 anos que, nos dias de agitação em Londres, roubou uma lata de lixo avaliada em 50 libras (R$ 129,00).

Bem, os ingleses não devolveram o menino à família ou à rua. A Justiça inglesa condenou o garoto a cumprir uma pena de 18 meses em um centro de reabilitação.  Verdade que o pequeno cidadão não parece ser boa gente, ele tinha antecedentes: destruíra e ateara fogo nos assentos de um ônibus. Mais: ao pronunciar a sentença o juiz disse ao pequeno: “se fosse um pouco mais velho, acabaria na prisão”.

E fico eu aqui dando tratos à bola, pensando sobre esse assunto, sem conseguir distinguir entre o certo e o errado. É correta a condenação de um moleque que roubou uma caixa de lixo? Resolve o problema? Estão certas as autoridades brasileiras ao deixar impunes crianças que praticaram delitos e estão prestes a cometê-los novamente? Existe remédio para situação tão esdrúxula como essa de crianças se organizarem para assaltar lojas, transeuntes e depredar instalações públicas?

Eis aí um assunto que está a exigir mais atenção das autoridades e busca de consenso sobre o modo de agir. Aceitar a situação como inevitável porque decorrente de problema social sem remédio em curto prazo é deixar paciente grave sem tratamento e perspectiva de cura. As crianças que roubam e depredam carecem de valores morais e estão sendo educadas segundo a lógica do toma lá da cá. E isso simplesmente não pode continuar assim.