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Ascensão social

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Vez ou outra aparece na mídia o caso de alguém que enfrentou enormes adversidades, mas conseguiu transpor barreiras e realizou-se profissionalmente. Nesses dias muito tem-se falado do novo titular da Secretaria Nacional de Reforma do Judiciário, do Ministério da Justiça. A história de vida de Marivaldo de Castro Pereira, 31 anos, é digna de filme, partindo da grande pobreza ao Mestrado na Faculdade de Direito da USP.

Há muitos anos fui procurado por um aluno que se preparava para o vestibular. Estudava no horário da noite e sonhava tornar-se dentista. De origem muito pobre, lutava ele pela sobrevivência e jamais poderia pensar em fazer o curso superior em faculdade particular. Além disso, o rapaz deixara de estudar há cerca de cinco anos, casara-se e tinha um filho.

Para ser sincero, atendi ao aluno tendo a nítida impressão de que as pretensões dele beiravam a loucura. Na época ele morava num bairro de São Paulo e trabalhava em outro de localização diametralmente oposta. Para chegar ao trabalho saia de casa às cinco horas da manhã; trabalhava até as seis da tarde, horário em que se dirigia ao cursinho; ao término das aulas - onze da noite – retornava para casa onde chegava depois de meia-noite. No dia seguinte, no horário de sempre, lá estava ele de novo, saindo de casa para mais um dia de trabalho e estudo.

Ora, esse cidadão me pedia que organizasse para ele uma agenda de estudos. Confesso que preparei um plano, em minha opinião, totalmente inexequível, mas o único possível. Distribui as horas de viagem de ônibus em minutos para estudo de cada matéria e insisti na importância do sábado a noite e o dia todo de domingo.

E lá foi ele com o papel, horários rabiscados, partindo para a missão impossível. Semanalmente eu o via em sala com seus colegas de classe, mas não mais nos falamos.

No final de janeiro do ano seguinte fui à escola e recebi a visita do aluno para quem preparara aquela louca travessia. Vinha ele radiante: entrara no curso de Odontologia de uma faculdade pública. Agradeceu-me muito pela ajuda. Recebi seu abraço constrangido porque, sinceramente, não acreditava no sucesso daquilo que combináramos.

Nunca mais o vi. Professores convivem com afastamentos definitivos, sendo algo raros encontros casuais, anos depois, com pessoas que perguntam: não era você que, em tal ano…?

A pequena história acima certamente se repete, envolvendo pessoas muito determinadas que acreditam ser possível a reversão de situações tidas como impossíveis. Vale dizer que aprendi muito com o meu aluno, o tal que estudava durante viagens de ônibus e queria ser dentista. Desde então me tornei um otimista incorrigível, beirando a loucura do Dr. Pangloss para quem tudo está o melhor possível. Sempre acho que algo que eu gostaria que acontecesse ainda vai acontecer e que sonhos existem para serem realizados. Às vezes me pego pensando friamente, equacionando que afinal o tempo está passando e, talvez, não existam mais oportunidades e tempo hábil para que certos anseios pessoais se concretizem. Então me lembro do meu aluno, da força e determinação que ele tinha: enfio o pé na estrada, achando que vai dar certo, tem que dar certo.

Pra frente, que atrás vem gente.