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Eclipse

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Amanhã haverá eclipse lunar. Em nossa cidade, quando escurecer, a Lua já estará encoberta. São Jorge não estará no céu. Restarão as estrelas, pontinhos luminosos cuja luz terá viajado por milhões de anos para chegar até nós. Daí que estrelas já desparecidas, quem sabe engolidas por algum buraco negro, continuarão a brilhar no céu, enternecendo nossas noites.

Ah, se pudéssemos brilhar depois de mortos. A luz emanada pelos nossos corpos circularia por aí, errante, último sinal do que um dia fomos e sentimos. Mas, o homem é mesmo um ser condenado a eclipsar-se. De repente o ciclo se fecha. Somos seres de datas marcadas. Uma delas é a do nosso fim.

Certa vez ouvi de uma astróloga que viveria muito. Ainda jovem encarei o futuro como algo muito distante, impalpável. Agora percebo meu engano. O túnel da vida só parece longo, mas chegamos ao fim dele depressa.

A morte talvez nada mais seja que um sobressalto. Como será morrer? Há quem tenha medo de morrer. Uma amiga, que já dobrou os 80, me liga com frequência. O assunto dela é a morte. Sente que está próxima. Mulher agitada não confessa, mas não se habitua com a letargia de seus movimentos. Incomoda-a a fraqueza dos músculos. É dura a constatação de não haver mais nada a se fazer. Missão cumprida. Agora permanece à espera nesse banco duro de estação por onde, sabe-se lá quando, embarcará no trem da morte.

Recomendo a minha amiga que deixe de pensar na morte. Deixe a morte de lado! Ela nega que a morte a apoquente. Está feliz com o que viveu, dentro da proposta que se fez ainda na mocidade. Espera o momento de se encontrar com Deus a quem se dedicou vida afora.

Mas, sim, é o medo inconfessável que a transtorna. O deixar de ser, de existir. O não mais fazer parte. O próprio nome gravado numa lápide. O silêncio do depois.

Enfim, todos nós chegaremos lá, de um modo ou de outro. Há os que abreviam sua estada neste mundo. Partem inesperadamente. Leva-os a doença, o acidente, o suicídio e tantas outras formas de desertar do mundo. Mas, o epílogo é sempre o mesmo.

Minha amiga me faz pensar em meu próprio fim, assunto que absolutamente não me interessa. Nem me interessam as hipóteses sobre o que poderá existir depois da morte. O nada? O inferno? O céu? Um livro onde estarão anotados os meus pecados e serei submetido a um julgamento sumário? A Justiça divina?

Amanhã olharei para o céu, para ver o eclipse da Lua. Depois de desaparecer nas sombras ela ressurgirá como faz em cada noite, renovando nossas esperanças de um dia após o outro, indefinidamente.