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Um bom amigo

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Nada tão agradável como encontrar alguém a quem não se vê há anos e ouvir: nossa, você não mudou, está igualzinho, poxa, o tempo não passou para você. Claro que há exagero nisso, bondade da pessoa que diz. Mas agrada, afaga o ego, disfarça a impressão que temos de nós mesmos a toda manhã, diante do espelho. Vida é ilusão, repetia um conhecido que sempre teve alguma dificuldade em aceitar a realidade.

Há quem tenha “olho bom” e quem não o tenha. Pessoas de “olho bom” em geral estão de bem com a vida e tendem a um olhar mais benigno sobre as mazelas diárias. Entendem melhor o próximo e são capazes de aceitar o “outro” com as suas imperfeições. Casais formados por pessoas desse gênero mantêm seus laços durante toda a vida, superando juntos desacertos e dificuldades. A vida não é simples, mas pode-se bem moldá-la aparando-se arestas e buscando pelo menos um pouco de felicidade.

Essa pessoa com quem me encontrei pertence ao time da turma do “olho bom”. Foi ele meu colega de colégio e sou-lhe grato por ter me livrado de situação difícil naquela época. Aconteceu passar a frequentar aulas em nossa turma da 3ª série do Ensino Médio um cara que acabara de servir ao exército. Rapazote como nós, tinha físico desenvolvido, bem preparado nos treinamentos ao tempo da farda.  Pois certo dia esse cara achou de me provocar, intencionalmente claro. Por sim ou por não, ainda que eu não respondesse, avisou-me ele que me esperaria na saída das aulas para acertarmos as nossas diferenças. Quais diferenças seriam essas até hoje não sei.

Bem, o que se seguiria não passaria de um massacre. Eu bem menor e sem preparo físico para uma luta ia apanhar bastante e pronto. Convencido de que a desgraça iminente aconteceria dei-me ao luxo de ignorá-la. Ao final das aulas saí tranquilamente, no fundo esperando que o tal sujeito tivesse mudado de ideia. Mas, não! Mal pisei fora da escola e lá estava o soldado em posição de luta. Ao redor dele uma turba de alunos, público aflito para que começasse a briga.

Confesso que ao perceber a situação real em que me encontrava e ter a certeza de que não tinha a menor chance no embate passou-me pela cabeça correr. Entretanto, a covardia nunca fez parte dos meus graves defeitos daí que me perguntei se acaso eu não conseguiria pelo menos acertar uns petelecos no gigante.

Creio que o punho do meu adversário já se aproximava do meu rosto quando um braço igualmente forte o conteve. Era o meu amigo que desafiou o meu adversário a brigar com ele porque seria covardia bater em alguém menor e sem preparo. Ao que o tal que tanto se gabava acovardou-se. Rabo entre as pernas, praticamente não disse nada, virou-se e partiu nunca mais se dirigindo a mim no período em que frequentamos a escola.

Encontrar-me por acaso com esse amigo, o homem de “olho bom”, fez-me lembrar do episódio escolar que relatei a ele. Quando terminei ele sorriu. Confessou-me que também ele teria dificuldades caso a briga dele com o outro tivesse acontecido. Em todo caso não poderia, naquela ocasião, se omitir a defender um amigo em situação tão delicada.

Despedimo-nos com um forte abraço e voltei para casa pensando que, afinal, existe muita gente boa nesse louco mundo.

Escrito por Ayrton Marcondes

9 janeiro, 2013 às 1:24 pm

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