2016 julho at Blog Ayrton Marcondes

Arquivo para julho, 2016

Vida boa

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Duas mulheres conversam num ônibus. Uma delas diz que agora o Brasil vai para frente. A razão? Ora, os ricos estão sendo presos, a lei passou a valer para todos.  A outra mulher apenas sorri.  Mulher simples, arrisca o olhar para fora do ônibus. Não sonha. Apenas parece não acreditar no que a outra diz. Até que suspira e pergunta: mas, você acredita mesmo nisso?

Pois é. Não sei dizer desde quando entrou na moda a tal delação premiada. O sujeito movimenta propinas, enriquece, desvia, rouba e, no fim, se safa contando o que sabe. A fórmula é simples: basta roubar, devolver um pouco e, principalmente, alcaguetar seus parceiros. O jogo dá certo.  Condenados a 20 ou mais anos de prisão saem livres, nem sempre portando na perna uma tornozeleira eletrônica. Nem sempre? Sim, porque nem sempre tornozeleiras estão disponíveis: a empresa que as produz acusa o governo por não as pagar. Crise é crise: não há dinheiro.

Jornalistas escrevem indignados com a vida boa dos delatores. O cara sai rindo da prisão onde pouco ficou. Volta para residências de fino luxo onde dispõe de comes e bebes dos melhores. Aliás, tudo patrocinado pelas negociatas que o enriqueceram. É culpado pelo desvio de milhões. Muita gente sofre nas filas em busca de atendimento de saúde etc. Mas, o crime parece estar longe das consequência que provoca. No Brasil de hoje o grande farsante não guarda memória de seus malfeitos. Descobriu-se a via perfeita que garante a boa vida.

Entretanto, como se descobrir as maracutaias sem que alguns dos safados denunciem outros? É aí que mora a perversidade da situação. O Brasil de hoje está na mão de ladrões de casaca dos quais só se pode livrar perdoando os mais rápidos em denunciar.

As duas mulheres que conversam no ônibus na verdade não existem. Elas nada mais são que ínfimos números na escala de milhões de deserdados aos quais são servidos, em doses crescentes, o prato-feito de uma república falida.

Mas, o melhor é não pensar muito nisso. Afinal, há anos a viver pela frente e nada indica que o modo de ser da ladroagem venha a mudar. Conviver com o descalabro de cada dia é a regra. Acostuma-se.

Os pães-duros

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Pães-duros, plural de pão-duro, não soa bem. Mas é a regra, que fazer? Temo que no passado se falasse mais sobre pães-duros. Terá hoje em dia o termo caído em desuso?

Não sei. Posso dizer que conheci muita gente que para enfiar a mão no bolso… De um tio dizia-se que ele tinha braço curto e bolsos fundos daí que a mão nunca alcançava o dinheiro…

Durante anos convivi com um cara que transformava cada centavo que ganhava em dólares. Daí que nunca tinha dinheiro nos bolsos. Filava cafezinho, cigarros etc. Se almoçávamos juntos não apresentava nenhum rubor ao dizer-se “desprevenido”. Nunca pagava a conta. O carro dele circulava com pneus velhos. Estepe nem pensar. Jamais adquiriu imóvel, nem os sapatos que usava estariam no nome dele. No fim casou-se com mulher rica que acabou quebrando. Na última vez que o encontrei queixou-se de que todos os dólares que armazenara haviam desparecido por conta da quebradeira financeira da mulher. Golpe? Caso tenha sido o amigo bem que mereceu.

Ontem os pães-duros voltaram à cena porque a atriz Dira Paes, madrinha do Criança Esperança que arrecada fundos para a infância, disse, ao vivo, que doaria 40 reais porque não era pão-duro. Pronto: o mundo desabou sobre a atriz. Houve quem ligasse, dizendo que não doaria porque tinha menos de 40 para doar; outros cobraram a atriz sugerindo que ela, por ser rica, deveria doar 1 milhão.

Nesses tempos do politicamente correto a gente não sabe bem no que pensar. Um caso assim… O fato é que toda gente conhecida e exposta à mídia precisa pensar bem em cada palavra que diz. Imagino que a atriz tenha feito a afirmação sobre quanto doaria num repente. Falou como se estivesse em sua casa, conversando com a família, na intimidade. Não se deu conta de que havia um microfone e câmeras de vídeo transmitindo sua imagem para todo canto.

40 reais! É muito ou pouco? Depende de quem enfia a mão no bolso. Para milhões de brasileiros uma bela grana. Pra outros nada mais que um troco. Para a atriz? Bem, o melhor é deixar que cada um  tire suas próprias conclusões.

Os melhores filmes

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Volta e meia críticos de cinema publicam listas sobre os melhores filmes de todos os tempos. Há muitos anos o “Cidadão Kane” de Orson Wells vem sendo apontado como o número 1 em várias listas. Filmes antigos e mais recentes compõem um universo de preciosidades cinematográficas protagonizadas por atores de primeira grandeza.

Diante da enormidade das produções levadas a cabo pelos estúdios de cinema é difícil eleger os melhores entre os melhores. Como sempre acontece há grandes filmes sempre esquecidos. Não se discute, por exemplo, se “Cantando na Chuva” deve ou não estar entre os melhores de todos os tempos. A cena em que Gene Kelly dança e canta sob um aguaceiro se constitui num daqueles momentos em que toda a grandeza do cinema se transfere a espectadores extasiados. Entretanto, mesmo um grande filme como “Sindicato de Ladrões” geraria apaixonadas discussões sobre ser ou não incluído numa lista entre os 25 melhores.

O escritor Julio Cortázar afirmava que os melhores contos são aqueles dos quais o leitor nunca se esquece. Trata-se de uma boa avaliação porque deixa claro o fato de que o conto de que não me esqueço pode ter passado batido a um outro leitor. Ou seja: os melhores entre os melhores variam em acordo com a preferência e impressões que provocam em cada leitor.

Talvez o critério adotado por Cortázar nos seja útil quando o assunto é cinema. Enfim, certos filmes sempre serão inquestionáveis quando se trata da escolha dos melhores entre os melhores. Mas, grosso modo pode-se dizer que cada cinéfilo tem lá a sua lista. Aliás, lista que pode mudar a cada novo filme assistido, segundo impressões de momento.

Acabo de assistir ao filme “O Regresso” estrelado por Leonardo Di Caprio. O ator recebeu, merecidamente, o Oscar pela atuação nesse filme. Confesso ter ficado preso à tela do primeiro ao último minuto do filme. A história do guia de caçadores de pele que é abandonado após ser atacado por um urso, mas que sobrevive e retorna para se vingar é inesquecível. Daqui a 10 anos se mencionarem o nome de Di Caprio imediatamente me virá à memória sua personagem, vagando sozinho entre os campos de neve em sua luta para sobreviver e retornar para a vingança.

Entretanto, seria “O Regresso” um dos melhores entre os melhores? Não sei se é para tanto. Mas, para mim, sempre será um dos melhores a que assisti. Tamanha força tem o filme, tão grande dramaticidade, tão segura é a trama, tal o acerto da direção, produção do filme e atuação dos protagonistas que sempre me lembrarei dele como uma das películas que mais me impressionaram.