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O rosto

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Reconhecemos nossos semelhantes através do rosto. Através das expressões faciais é possível identificar o estado de espírito daqueles com quem fazemos contato. Alegrias, tristezas, desespero, depressões, violência, passividade, tudo se reflete na fisionomia. É certo que por vezes tenta-se dissimular o que se passa em nosso espírito. A mulher que chora engole lágrimas para que não se veja seu sofrimento. É possível rir enquanto triste, é possível chorar quando muito alegre. Atores são peritos em incorporar personagens. Deixam de ser quem são para assumir aspectos, posturas e modos insuspeitáveis para quem os conhecem fora de representações. Al Pacino está irreconhecível no papel de Big Boy Caprice no filme Dick Tracy. Big Boy não é ele. Ele não está lá…

Mas, seja como for, o rosto trai o que pensamos, identifica-nos. Não temos, como os atores, equipes de maquiadores capazes de transformar faces a ponto de se tornarem tão diferentes deles mesmos. Por isso, andamos por aí com a nossa boa e surrada cara com a qual enfrentamos o mundo.

Há gente de todo tipo, belas e feias. Um belo rosto favorece, pode abrir portas. Os feios nem sempre contam com o agrado das pessoas. O tempo que passa não perdoa belos e feios. Existe na internet certa compulsão em destruir ilusões. Estão nos sites comparações do tipo “como ele está agora” ou “o triste fim de fulano(a) de tal”. Parece existir certo prazer em arruinar a imagem de pessoas a quem admiramos nas suas juventudes. A quem interessa imagens colocadas, lado a lado, de Alain Delon jovem e agora no período final da vida? E de tantos outros ícones das telas a quem o tempo roubou a beleza? Mas, então, Elizabeth Taylor terminou assim? Aquela velha foi Greta Garbo?

Nos tempos que correm a cada dia se buscam meios para disfarçar a velhice, esconder as tão indesejadas rugas. Cirurgias plásticas devolvem pelo menos parte da juventude perdida. Trata-se de um trabalho insano essa luta contra o tempo que insiste em passar. Daí vermos nas telas da TV faces cujos músculos foram engessados por aplicações de produtos como o famoso Botox. Mas, existem o colágeno, o ácido hialurônico. Mas, pelo amor de Deus, não se trata de criticar quem busca se manter com boa aparência. Muito pelo contrário. Entretanto, existem casos em que algumas pessoas passam a ter, inclusive, dificuldade para mover os lábios…

O rosto é nossa impressão digital. Hoje em dia existem técnicas de reconhecimento facial utilizadas para vários meios. Mas, o que nos comove é o que fica gravado em fotografias nas quais permanecem vivas as faces daqueles que se foram. Guardo em casa fotografias de meus país, avós e de tanta gente com quem convivi. Vez ou outra abro a gaveta e os revejo. Estão lá com seus rostos cheios de vida, a mesma vida que um dia perderam.

A “ordem natural”

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Não há coisa que nos faça pensar mais sobre a brevidade da vida que olhar velhas fotografias. Temo que as fotos digitais contribuam para enfraquecer as memórias fotográficas. Hoje em dia qualquer pessoa dispõe de uma câmera que permite a ela clicar a vontade. Nada parecido com o que ocorria em passado recente quando os filmes das máquinas tinham 12, 24 ou 36 poses. Então era melhor pensar um pouco antes de bater a foto dada a limitação do número de negativos. Agora se fotografa tudo por conta da existência de dispositivos dotados de grande capacidade de armazenamento.

O problema é justamente que fotos digitais ficam armazenadas em HDs, CDs e pen-drives. Nem todo mundo imprime essas fotos porque pode-se acessá-las no computador a qualquer momento. Essa situação é bem diferente daquela em que levávamos os filmes para serem revelados e as fotos escolhidas eram impressas. As minhas fotos antigas estão bem guardadas em caixas as quais procuro quando quero vê-las.

Pois é. O problema começa quando por acaso damos com uma dessas caixas e decidimos dar uma olhada no conteúdo delas. De repente, temos nas mãos fotografias de pessoas já mortas com quem convivemos no passado. Revê-las, ainda que estáticas no papel fotográfico, nos desperta lembranças. É quando revivemos situações das quais participaram pessoas desaparecidas. Lembro-me, por exemplo, da casa de meus pais e de coisas que eram importantes para eles na época em que viveram. A morte colocou fim a preocupações que para eles se figuravam eternas. Empenhados nas questões do dia-a-dia não nos permitimos raciocinar sobre o fato de que, afinal, tudo termina até mesmo a vida.

Queira-se ou não a regra que comanda esse mundo é a “ordem natural” contra a qual nada se pode fazer. Nascimento, vida e morte fazem parte de um pacote que recebemos ao sermos concebidos através da união carnal de nossos pais. A partir daí as águas do rio seguem inexoravelmente o seu curso e nada pode deter a passagem do tempo. No fim das contas talvez o que reste daquilo que somos nada mais seja que uma fotografia amarelecida guardada numa caixa.

Mas, que fazer se essa é a “ordem natural” sobre a qual não podemos interferir?