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Crimes em Jussiape

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Jussiape, Bahia, população de 8000 habitantes. Um homem saí à rua, armado até os dentes. Leva consigo revólver e espingarda, três cinturões e uma bolsa cheia de balas. Ao se aproximar de um bar o homem atira na cabeça - e mata - o gerente da empresa de saneamento básico da cidade. Depois se dirige à casa do prefeito e, com dois tiros, fulmina a primeira dama. Em seguida vai ao consultório do prefeito, um médico, e, também, o mata.

Não é difícil imaginar a confusão que se estabelece na cidade: pessoas correndo, comércio fechando, portas das casas sendo trancadas. Os poucos policiais de Jussiape pedem reforços nas cidades vizinhas. Quando chegam trava-se tiroteio com o homem que é atingido e morre, não antes de ferir um dos policiais que, agora, está hospitalizado, em estado grave.

Não é ficção. Aconteceu mesmo. O homem era conhecido como Coló e dono de pequeno quisoque em Jussiape. Matou por vingança, para punir o prefeito que, segundo acreditava, traiu um companheiro de partido, ex-prefeito cassado pela Câmara Municipal. Coló achava que o atual prefeito tinha a obrigação de apoiar a candidatura da mulher do ex-prefeito, mas não o fez, vencendo-a nas eleições. Por essa razão Coló percorreu as ruas mantando gente.

Fez-me lembrar do filme “Um dia de Fúria” no qual um sujeito perde o controle e faz o diabo. Mas, afinal, o que de fato leva uma pessoa à prática de atos tão extremos? Coló seria assassino em potencial que finalmente deparou-se com situação que o motivou à prática de crimes? Teria ele em seu passado algum outro tipo de delito praticado? Ou não passaria de alguém considerado normal para os padrões da sociedade que, simplesmente, de uma hora para outra pirou?

Ações como a de Coló mais se enquadram em tramas ficcionais desenvolvidas nos filmes. Um cangaceiro, cinturões envolvendo a barriga e armas na mão, sai à cata de pessoas às quais pretende matar. O que o move, suas razões profundas, o possível desequilíbrio mental, o desvio de comportamento, tudo isso morre com ele e nos convida à especulação diante de prática tão terrível.

Conheci um homem que, quando jovem, caracterizou-se por ser extremamente briguento. Temperamento forte era ele um cavalheiro no trato, mas não levava desaforo para casa. Certa vez perguntei a ele se na sua história de confusões teria matado alguém. Ele me respondeu:

- Toda vez que atirei, atirei para acertar, para matar. Mas, nunca me aconteceu matar alguém.

Percebendo a minha surpresa ele completou:

- Deus não quis.

Um dia de fúria

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O filme “Um dia de fúria” é de 1993 e estrelado por Michael Douglas em grande atuação. Douglas é William Foster, homem que perdeu o emprego e sai em busca da mulher e da filha. O problema é que Foster está completamente perturbado e mata quem encontra em seu caminho. Para tentar detê-lo o policial Prendergast, interpretado por Robert Duvall, arrisca a própria vida em seu último dia de trabalho, dado que está para se aposentar.

William Foster é inesquecível porque se trata de um homem que atravessou todas as barreiras. O desequilíbrio emocional de Foster leva-o a romper com as convenções e acordos do mundo civilizado. De repente ele surge nas ruas, mas à margem dos códigos que governam as vidas comuns e consideradas normais. Audacioso, violento, Foster é capaz de destruir e matar o que faz como uma máquina que tivesse sido programada para isso. Grande filme do diretor Joel Schumacher .

 “Um dia de fúria” sempre me volta à memória quando acontece a reação desproporcional de alguém a uma agressão de qualquer tipo. Para algumas pessoas parece existir um limiar que, uma vez ultrapassado, resulta em ações inesperadas, violências cometidas por alguém que, até então, era cidadão pacato e cumpridor. O vizinho que tem uma laranjeira no quintal e mata uma criança que costuma roubar as suas laranjas serve como exemplo de alguém que internou-se no estado de violência e cometeu algo desproporcional à agressão que sofreu.

Leio que ontem ocorreu um caso inusitado em Salvador, Bahia. Um homem retornou ao seu carro, que deixara estacionado, e encontrou o vidro, do lado do motorista, quebrado. Além disso, constatou que objetos foram roubados, inclusive um GPS. Esse fato, comum nos dias de hoje, despertou a ira do homem que - após dirigir-se a um policial e não conseguir resposta afirmativa - passou a arremessar pedras em carros estacionados no local. A notícia nos dá conta de que esse homem danificou 40 veículos antes de ser detido e levado a uma delegacia.

Não se pode negar a sensação de extremada revolta que sentimos ao sermos vítimas de algum tipo de crime. Entretanto, o que chama a atenção no caso ocorrido em Salvador é a intensidade da reação, certamente inesperada e desproporcional à agressão sofrida.  O cidadão cujo carro foi roubado teve o seu momento de fúria. Acabou numa delegacia, preso por ato de vandalismo, e vai ter que se haver com os danos materiais provocados em veículos de pessoas que nada tinham a ver com o roubo.