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Bandidos e presos políticos

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Em boca fechada não entra mosquito. Essa máxima da sabedoria comum vale para toda gente, ainda mais quando se ocupa um cargo nada mais, nada menos, que a presidência da República.

Em primeiro lugar há que se levar em conta a diferença entre o público e o privado, duas condições frequentemente confundidas. A alguém que possui determinada convicção pessoal é dado falar sobre ela em público, envolvendo um cargo que transitoriamente ocupa? Por outro lado, é possível a alguém que ocupa determinado cargo falar em nome de si mesmo, isentando-se da condição maior outorgada pelo mesmo cargo? Em suma: pode o presidente da República fazer uma declaração de natureza política, dizendo que expõe a sua opinião pessoal, não necessariamente vinculada à função que exerce enquanto presidente?

As perguntas anteriores podem ser taxadas como superficiais dado apenas tangenciarem uma questão bem mais profunda, ou seja, a da personagem pública que se torna inseparável da personalidade individual. Entretanto, elas têm o mérito de nos direcionar para uma certeza: se alguém ocupa um alto cargo administrativo convém a ele(a) medir a extensão das suas palavras, se possível com a ajuda de um paquímetro. Tal nível de precisão é mais que necessário no caso da presidência da República porque quase sempre se entende que a pessoa que está presidente fala em nome de um governo, quando não do próprio país que está a governar.

Por essas e outras se lê com alguma preocupação a manchete da folha de rosto do jornal “Folha de São Paulo” de hoje.  Está escrito: “Lula compara preso político de Cuba aos bandidos de São Paulo”.

Mais abaixo o jornal publica a declaração do presidente: “Temos que respeitar a determinação da Justiça e do governo cubanos. A greve de fome não pode ser um pretexto de direitos humanos para liberar as pessoas. Imagine se todos os bandidos presos em São Paulo entrarem em greve de fome e pedirem liberdade”.

Segundo o texto preso é preso, não importam os motivos da detenção e ponto final.  Sem entrar em maiores detalhes sobre essa incrível declaração o fato é que dela emanam os humores exalados pela admiração acrítica de certa parcela do esquerdismo nacional por Fidel Castro e a ditadura cubana.

Infelizmente, declarações como as feitas pelo atual presidente da República depõem negativamente num cenário de pugna pelo restabelecimento da democracia em todos os países da América. Declarações dessa natureza permitem, por exemplo, que o preso político cubano Guillermo Fariñas atribua ao presidente do Brasil a pecha de “cúmplice da tirania de Castro”.

Aliás, Fariñas está a 15 dias em greve de fome pela libertação de 26 presos políticos cubanos. Para ele “a maioria o povo cubano se sente traída por um presidente que um dia foi preso político”.

Pois é, em boca fechada não entra mosquito.

A língua dos políticos

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Numa semana de troca de farpas entre governistas e oposicionistas não há como não se render à evidência de que não se deve esperar muito da próxima campanha eleitoral em termos de propostas para o país.

As infeliz afirmação do presidente do PSDB, dizendo que os tucanos acabarão com o PAC por se tratar de uma ficção,  forneceram oportunidade para que o presidente da República e sua candidata se manifestassem, de maneira bastante imprópria: o presidente dizendo que  “quer fazer a campanha do quem sou eu e quem és tu”, a candidata afirmando que a vitória dos oposicionistas representará o fim dos programas sociais em andamento no atual governo, com prejuízo para as classes menos favorecidas.

Sem ao menos entrar no mérito da eficácia de programas como o PAC evidencia-se, mais uma vez, a grande dicotomia de um país capitalista no qual a disparidade social e econômica é por demais acentuada e, talvez, decisiva em termos eleitorais. O discurso da ministra obviamente dirige-se ao chamado “povão”, massa imensa de brasileiros desvalidos e eleitores os quais, sob ameaça de retirada das benesses assistencialistas a eles hoje disponibilizadas, não terão dúvidas sobre em quem votar nas próximas eleições. Não importa que as camadas mais letradas detectem um lamentável sofisma nas palavras da candidata – os jornais de hoje caem de pau sobre o pronunciamento dela. O que verdadeiramente importa é que o recado certeiro da candidata chegará ao seu público alvo, em sua maioria não dado a interrogações mais profundas que aquelas ligadas à sobrevivência imediata.

Mas que não se enganem aqueles que esperam dos políticos da oposição atitudes mais coerentes. Revides do mesmo nível e acusações contra o caráter de seus oponentes ocorrerão, infelizmente para o país. A pouco sutil afirmação do presidente do PSDB terá sido apenas uma “overture” da campanha que já se inicia.

Em um de seus textos o antropólogo Darcy Ribeiro dizia que a dor que mais doía a ele era a de envelhecer temendo que os jovens de seu tempo tivessem que repetir, no futuro, que o Brasil é um país que não deu certo.

Que o espírito de Darcy Ribeiro descanse em paz: o Brasil vai dar certo, estamos já a meio caminho disso. Acontece que talvez a realização do grande sonho demore mais do que seria esperado dado o perfil da classe política atualmente em atividade.

Mas não devemos nos preocupar: essas pessoas passarão e o país seguirá forte, imenso e fértil, livre das mentiras de ocasião e das personagens menores, cumprindo o destino que dele se espera.

Não tenham dúvidas quanto a isso.

A política de hoje

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Sinceramente não invejo os colunistas diários de jornais cujo assunto é a política brasileira. Gente… Os caras são obrigados a uma atividade cansativa que, imagino, não dê a eles nenhum prazer. Vejam-se lá as idas e vindas de opiniões, as afirmações seguidas de negativas peremptórias, os disfarces e conchavos, a falsidade dos discursos, a corrupção, as traições ideológicas e, principalmente, o habitual descaso pelo bem público solapado por interesses menores.

Estamos assistindo nesse momento à agitação que precede as candidaturas que concorrerão à presidência da República no próximo ano.  Meu Deus haja estômago! De um lado o presidente da República com sua mal disfarçada campanha em prol de sua candidata, levando a várias partes do país uma caravana ufanista, creditando-se realizações pessoais nunca antes alcançadas por nenhum homem público “deste país”. De outro, o tucanato indeciso que não sabe bem o que dizer ao povo para desmontar o espetáculo propiciado pelos homens do governo.

Os jornais são férteis em comentários que buscam desmascarar o presidente, apontando seus exageros e frases infelizes. Também não perdoam a oposição que, com justiça, querem mais atuantes. Mas a maior parte do povo não lê jornais e nem mesmo se interessa pelo noticiário político da televisão. No Brasil de hoje a política está desacreditada justamente pelo comportamento de grande parte dos homens públicos do país. Veja-se o caso da desobediência do Congresso Nacional a uma determinação do Supremo Tribunal Federal. Quem tem razão? Em qual instituição podemos confiar?

À margem dos homens o Brasil cresce, seguindo a sua vocação de ser grande.  Às vezes penso no Brasil em termos de prosopopéia, transferindo a ele sentimentos e voz. Pois, pudesse o Brasil falar, que diria? Que dores choraria ele pelas matas devastadas, animais em extinção, alta criminalidade, falcatruas a céu aberto, mentiras proclamadas, riqueza e miséria contrastantes? Que alegrias externaria em função de suas belezas e progressos?

Diz a letra de uma música que o Brasil não conhece o Brasil. Conhece sim. Decorridos mais de 500 anos desde o descobrimento, o país deixou de ser adolescente e assume ares de maioridade. Ele tem consciência de sua imensidão, pensa grande e abre o jogo dando a conhecer riquezas até então escondidas. De repente, não mais que de repente, o grande país impressiona com fabulosas reservas energéticas bem próximas de sua orla marítima. De repente, não mais de que de repente, ele sente pairar sobre o seu território a atmosfera de autossuficiência. E assim vai.

É preciso discutir se o Brasil está crescendo pela ação dos homens ou apesar deles. Obviamente o assunto é controverso e de difícil conclusão. Mas acredito que seja um dos pontos de partida quando o que está em jogo é o destino de milhões de pessoas.

É aí que entram os colunistas que tratam da política, os sociólogos, os cientistas políticos e toda gente que tem espaço para opinar sobre os destinos do país. Diante de um governo que canta vitórias e uma oposição até agora ineficiente cabe aos analistas um estudo mais profundo e ordenado da situação. E não importa a impressão de que as suas palavras possam ser inúteis e nada venham a resolver: é preciso buscar caminhos e apontá-los.

O Brasil agradece.

Cristo e Judas

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É indisfarçável o constrangimento provocado pelo presidente da República ao afirmar que no Brasil, Cristo teria que se aliar com Judas. São palavras do presidente: “se Jesus Cristo viesse para cá e Judas tivesse a votação num partido qualquer, Jesus teria de chamar Judas para fazer coalizão”.

Nada de pudores religiosos, nada de aversão a frases de efeito e, preconceito, se existe, só em relação a uma confissão pública do tipo “os fins justificam os meios”.

Mas a lição vem de cima e está dada: nada contra aliar-se com alguém que o traiu ou poderá novamente traí-lo se o que está em jogo é alcançar a vitória de momento. Na verdade o passado e o futuro pouco interessam, exceto o esforço para manter o poder em mãos indefinidamente.

Não custa lembrar: Jesus foi torturado e morto justamente para não pactuar com fariseus etc.

Sou dos que tem na Bíblia uma das maiores obras literárias de todos os tempos, isso sem considerar os aspectos ligados à fé cuja interpretação difere de acordo com a crença que cada um professa.

Por falar em literatura, em carta endereçada a Joaquim Nabuco, em agosto de 1906, Machado de Assis afirma que se consola e desconsola com a leitura de um de seus livros prediletos, o Eclesiastes. Um dos trechos preferidos de Machado pode nos servir para consolo e desconsolo diante do que homens públicos afirmam e praticam nos dias de hoje. É o seguinte:

- Vaidade das vaidades. Vaidade das vaidades, tudo é vaidade.