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A segurança da democracia

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A democracia se assemelha a um tipo de dique, construído para evitar grandes inundações. O dique não suporta apenas as pressões costumeiras: ele está preparado para conter volumes de água maiores, preservando as regiões em que se localiza.

Nos últimos dias a estabilidade da democracia no Brasil tem chamado a atenção de muita gente. Segundo se diz a forma como o poder vem sendo exercido no Brasil ameaça o regime por ferir pilares da democracia como é o caso de ameaça à liberdade de imprensa. Surgem editoriais em jornais advertindo o próprio presidente da República e sua provável sucessora; juristas de renome assinam abaixo-assinado em defesa da democracia, acusando o governo de autoritarismo hipócrita.

De outro lado estão aqueles que veem excesso nessas manifestações. Deixando de lado a profissão de fé pelos partidos e o fanatismo das militâncias, opiniões ponderadas destacam não existir no país clima para quebra do regime democrático e retorno do autoritarismo. Destaca-se o personalismo exagerado do presidente e suas basófias; entretanto, lembram que partiu dele mesmo a negação a um terceiro mandato.

Em quem acreditar? O brasileiro que trabalha assiste a esse debate com alguma indiferença. Pessoas que já vivenciaram oscilações de regime no país sabem dos riscos, mas preferem ignorá-los. A surda movimentação de bastidores aonde a corrupção vez por outra vem à tona assusta, mas parece não ser dotada de grandeza suficiente para romper a democracia. Existe sim, o receio de que velhos extremistas, diga-se que ainda não definitivamente ultrapassados, assenhorem-se de cargos importantes e façam valer o radicalismo de seus antigos credos. Mas, será?

O Brasil parece forte. O dique parece firme. Opiniões de relevo como a do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, desmistificam a possibilidade de retorno ao autoritarismo. Contrapõem a esse ponto de vista os que já apontam sinais claros de autoritarismo no modo de ser do governo atual. Aliás, não só o identificam como preveem piora do quadro no governo que há de vir.

Estamos no meio disso. Faltam-nos informações detalhadas para avaliar o mal, se é que ele existe e tem as dimensões propaladas. Vamos às urnas com alguma inconsciência sobre perigos que dizem ser iminentes.

Voto obrigatório?

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Se há coisa difícil de entender são os tais meandros da lei. Para o mortal comum existe uma verdade cristalina: pessoas que têm débito com a Justiça não podem se candidatar. Ponto. Entretanto, não é assim que funcionam as coisas: é preciso discutir a constitucionalidade da Ficha Limpa; se as fases de tramitação foram obedecidas; se a lei aprovada é válida para as próximas eleições ou não; e assim por diante.

É aí que entra a figura do Supremo Tribunal Federal (STF), composto por altos magistrados, descontadas eventuais indicações guiadas por interesses políticos que talvez interfiram.  Espera-se do STF decisão rápida e moralizante, mas os juízes esbarram em mil e uma dificuldades, afinal legislação é legislação e há que se obedecê-la. Então acontece um empate e a lei fica no limbo esperando algum tipo de solução. Logicamente, os candidatos que devem à Justiça vibram porque favorecidos; a imprensa se revolta e cobra ação do STF; a população dá de ombros porque “neste país” tudo é possível e ninguém já não estranha nada.

Que pensar? Certamente juristas teriam uma longa lista de prós e contras à aprovação da lei. Está em questão o Direito e não há que se tomar atitude que fira os códigos que sustentam o Estado. Tudo bem, mas seria de se perguntar: caso o assunto fosse considerado em época distante de eleições, os magistrados estariam discutindo tanto?

A política no Brasil só não chega à barbárie porque os envolvidos usam terno e gravata. Senão veja-se: o STF não consegue se decidir sobre a Ficha Limpa; O PT entra na Justiça contra a exigência dos eleitores apresentarem documentos de identidade pessoal por ocasião das eleições; um promotor quer submeter o palhaço e candidato Tiririca a um teste de leitura e escrita por desconfiar que ele é analfabeto; a imprensa publica notícias de que um cantor, candidato a senador, é habituée em espancar mulheres; o presidente da República entra em todos os lares brasileiros para garantir, aos eleitores, que o cantor merece o voto de deles.

Imprensa defendendo-se de acusações de partidarismo, escândalo monumental na Casa Civil, promessas da oposição que jamais seriam cumpridas… Por essas e outras está mais que na hora de se fazer um plebiscito no país sobre a questão do voto obrigatório. Já que existe democracia e os cidadãos têm o direito de opinar, por que não em relação à obrigação de votar?

Senhoras e senhores, inúmeras pessoas não querem votar nessa balbúrdia que lhes é apresentada diariamente. Essas pessoas irão às urnas como se fossem conduzidas ao pelourinho porque estão cansadas de tanta desfaçatez e desrespeito às suas inteligências.

O Brasil não merece isso que está aí, não. Os brasileiros também não.

Resistindo às intempéries

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Uma velha senhora, com mais de 100 anos de idade, dotada de invejável poder de resistência. Sólida, altiva, sempre em pé, ela avança contra rajadas de ventos cortantes, tsunamis ou o que vier ao seu encontro. Às vezes chora, mas baixinho: não quer que a vejam temerosa ou simplesmente chocada pelo modo como a tratam, pelo desrespeito a ela que tanto dá de si aos outros.

Essa senhora vetusta já viveu bastante para conhecer os homens e sua incrível capacidade de torcer tudo em acordo com os seus interesses. Mais que centenária ela conviveu com os mais variados tipos de gente e, quando se desesperou, pode conformar-se por saber que o tempo passa e com ele as pessoas que, iludidas com o poder, terminam por desaparecer. Talvez por isso ela goste muito de visitar palácios e museus para olhar faces às quais conheceu de perto e que, agora, não passam de um retrato esquecido dentro de uma moldura. A historia dos homens que tiveram alguma importância termina pendurada em paredes, esse o pensamento que mais conforta à velha senhora quando se defronta com a imagem de alguém que a desprezou ou falsamente agiu em nome dela.

Quem é a velha senhora, de quem estamos falando, afinal? Ela é conhecida por aí como República. Velha e altaneira, respeitável ao limite, a República talvez esteja cansada de singrar em mares cobertos de lama. Quer ela águas límpidas e honestas, muito sol e verde, alegria e acolhimento aos que dela dependem. Entretanto, isso parece impossível no grande país de glórias sempre inconclusas no qual o Estado tem sido meio útil para realizações pessoais, quando não mesquinhas.

Escrevo para avisar que a República do grande país dos brasileiros está doente. Tentei visitá-la hoje de manhã, mas ela não pode me receber. A equipe médica que cuida da doente publicou um boletim informando que o mal é grave porque afeta o coração, naquela parte onde se instala o gabinete da Casa Civil.  Atos indevidos, favorecimentos, tramoias e corrupção, fizeram mal à corrente sanguínea da doente, ela que já vinha abalada por problemas no setor de Receita onde ocorreram quebras de sigilo etc.

Mas, que não nos desesperemos. O boletim médico lembra-nos que a velha senhora é forte e resistirá, como já o fez muitas vezes ao longo de sua vida centenária. A favor dela conta o fato de ser maior que os vírus que a contaminam, daí a cura ser nada mais que uma questão de tempo. Ressaltam, ainda, os médicos que conta a favor da velha senhora o dom de ser muito paciente: ela sabe que, não muito tempo adiante, alguns dos que hoje não a respeitam como deveriam nada mais serão que rostos dentro de molduras. Sabe mais: conhece que a maioria nem ao mesmo será enquadrada, a eles sendo reservado o esquecimento, condição vital para exemplo às novas gerações.

O fator feminino nas eleições

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Vi na televisão um jornalista dizendo que falta a José Serra presença suficiente para empolgar os eleitores. Serra é articulado, capaz, sério, educado, cortês, mas não dado a repentes que tornem situações embaraçosas favoráveis a ele. Assim, não apaixonaria os que o seguem: vê-se nele o candidato certo, mas a sensação de intimidade com o homem deixa a desejar.

Serra está atrás de Dilma Roussef nas pesquisas e atribui-se ao presidente Lula esse resultado, afinal ninguém sabe ao certo quem é a candidata e do que é realmente capaz. Agora surgem dados de pesquisas demonstrando que Serra vem perdendo força no eleitorado feminino. São as mulheres, portanto, que estão desertando de Serra, daí a sua queda nas pesquisas.

O Brasil nunca teve uma presidenta da República. Nisso a história do país difere da de países vizinhos como a Argentina e o Chile. Teria chegado a hora das mulheres mostrarem a sua força no país?

Obviamente, uma pesquisa com dados que mostram a queda de Serra por conta do eleitorado feminino suscita muita conversa mole - entre os homens, principalmente. Esse é o tipo de coisa que desperta a sempre presente e pródiga macheza do chamado sexo forte. Vai daí que se especula sobre a influência da pretensa ausência de magnetismo de Serra sobre o eleitorado feminino. De um rapaz, estudante de sociologia, ouvi que caso Serra fosse um cara realmente bonito, levaria na manha as eleições. Para esse rapaz Serra não desperta nas mulheres o carinho que se dedica a um pai ou a um amante. Convenhamos que isso soa demasiado porque, além de opinião pessoal, passa-se a exigir de um candidato mais do que capacidade e retidão. Aliás, nesse sentido, não há que se negar que muita gente que vota tem lá alguma inclinação para aprovar certo tipo de safadeza meio encantadora, daquelas relacionadas a feitos de simples macheza - quando não de natureza sexual - a partir de políticos praticantes. No que, aliás, somos diferentes dos norte-americanos que, falsamente ou não, mostram-se muito apegados aos princípios que os puritanos do May Flower fizeram desembarcar nas terras do grande país do norte - Bill Clinton que o diga. Mas, talvez, aí fale mais alto o espírito latino, veja-se o caso Berlusconi na Itália e o estilo inconfundível do ex-presidente Carlos Menen, da Argentina.

Se tudo isso for verdade, se o que as más línguas dizem por aí valer alguma coisa – o que é muito discutível, destaque-se – o PSDB terá escolhido o candidato errado. O que se diz é que Aécio Neves tiraria de letra a diferença com o eleitorado feminino e suplantaria a sua adversária nas pesquisas. Isso em se concordando com a simpatia inerente a Aécio e o sempre presente nome de Tancredo Neves que o acompanha.

Que me perdoem as feministas se acharem que essas mal traçadas visam diminuir as mulheres, sugerindo que não têm inteligência e votam apenas pelo glamour dos candidatos. Pelo amor de Deus, não é nada disso, trata-se apenas do que andam falando por aí. Quanto a José Serra, que não entre nessa: se o problema for realmente o que se diz não se trata de nada que um bom marqueteiro, auxiliado por um especialista do mundo fashion, não consiga resolver. Qualidades não faltam a ele para assumir a presidência da República.

Avante!

A língua dos políticos

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Numa semana de troca de farpas entre governistas e oposicionistas não há como não se render à evidência de que não se deve esperar muito da próxima campanha eleitoral em termos de propostas para o país.

As infeliz afirmação do presidente do PSDB, dizendo que os tucanos acabarão com o PAC por se tratar de uma ficção,  forneceram oportunidade para que o presidente da República e sua candidata se manifestassem, de maneira bastante imprópria: o presidente dizendo que  “quer fazer a campanha do quem sou eu e quem és tu”, a candidata afirmando que a vitória dos oposicionistas representará o fim dos programas sociais em andamento no atual governo, com prejuízo para as classes menos favorecidas.

Sem ao menos entrar no mérito da eficácia de programas como o PAC evidencia-se, mais uma vez, a grande dicotomia de um país capitalista no qual a disparidade social e econômica é por demais acentuada e, talvez, decisiva em termos eleitorais. O discurso da ministra obviamente dirige-se ao chamado “povão”, massa imensa de brasileiros desvalidos e eleitores os quais, sob ameaça de retirada das benesses assistencialistas a eles hoje disponibilizadas, não terão dúvidas sobre em quem votar nas próximas eleições. Não importa que as camadas mais letradas detectem um lamentável sofisma nas palavras da candidata – os jornais de hoje caem de pau sobre o pronunciamento dela. O que verdadeiramente importa é que o recado certeiro da candidata chegará ao seu público alvo, em sua maioria não dado a interrogações mais profundas que aquelas ligadas à sobrevivência imediata.

Mas que não se enganem aqueles que esperam dos políticos da oposição atitudes mais coerentes. Revides do mesmo nível e acusações contra o caráter de seus oponentes ocorrerão, infelizmente para o país. A pouco sutil afirmação do presidente do PSDB terá sido apenas uma “overture” da campanha que já se inicia.

Em um de seus textos o antropólogo Darcy Ribeiro dizia que a dor que mais doía a ele era a de envelhecer temendo que os jovens de seu tempo tivessem que repetir, no futuro, que o Brasil é um país que não deu certo.

Que o espírito de Darcy Ribeiro descanse em paz: o Brasil vai dar certo, estamos já a meio caminho disso. Acontece que talvez a realização do grande sonho demore mais do que seria esperado dado o perfil da classe política atualmente em atividade.

Mas não devemos nos preocupar: essas pessoas passarão e o país seguirá forte, imenso e fértil, livre das mentiras de ocasião e das personagens menores, cumprindo o destino que dele se espera.

Não tenham dúvidas quanto a isso.

A um amigo estrangeiro: a corrupção no Brasil

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cartaUm amigo estrangeiro me escreveu perguntando sobre os casos de corrupção no Brasil noticiados pela imprensa de vários países. Enviei a ele o texto abaixo, tentando explicar como se passam as coisas neste lado do Atlântico:

“ Caro amigo

Os acontecimentos ocorridos no Distrito Federal envolvendo o governador, o presidente da Câmara e muitos outros políticos já não escandalizam a população, habituados que estão os brasileiros à permanência em cargos públicos de pessoas envolvidas em atos de corrupção.

Houve tempo em que a corrupção aparecia no país como sintoma de que algo estava errado nas máquinas administrativas. Tratava-se, apenas, de um primeiro estágio que evoluiu ao segundo, o de doença, para logo depois mostrar-se com características epidêmicas. De fato, a doença se espalhou tornando-se, atualmente, incontrolável.

É preciso destacar que, no Brasil, a corrupção deixou de ser atividade de exceção; nos dias atuais ela estabeleceu-se como padrão de rotinas que conquistam inúmeros seguidores os quais, por sua vez, aliciam novos adeptos, gerando-se um movimento organizado de dinheiros repartidos proporcionalmente entre um número cada vez maior de pessoas.

Alçando-se ao estatuto de profissão, a corrupção oferece a vantagem de não exigir de quem queira praticá-la formação ou diploma específico. Qualquer um pode se tornar corrupto desde que tenha oportunidade e se aproxime de outros partícipes de atos de corrupção. Isso acontece porque é raro que um corrupto de carteirinha pratique o seu ofício sozinho. Como você sabe a corrupção exige aliados, transferências de bens, aliciamentos, pactos de silêncio e, principalmente, nenhuma vergonha. Nisso tudo, os corruptos brasileiros são muito bons, daí que não se duvide de que possam, em médio prazo, exportar práticas seguras de assaltos ao patrimônio público.

Frequentemente lê-se nos meios de comunicação pronunciamentos de autoridades juradas no combate à corrupção. A tônica de seus discursos sempre envolve dificuldades jurídicas ligadas às imunidades parlamentares, prazos, morosidade da Justiça, recursos impetrados etc. Vale dizer que corruptos de mais alta hierarquia conhecem profundamente todos os mecanismos jurídicos e suas válvulas de escape. Além disso, dispõem eles de altas somas de dinheiro subtraídas ao erário público que lhes permite a contratação dos melhores advogados. Certos, ainda, de que a Justiça não mudará – as regras são sempre mantidas –dispõem eles de vasto campo de ação, mantendo-se em seus cargos e, dada a sua desfaçatez, prosseguindo com suas atividades de corrupção. Não será demais citar casos em que corruptos chefiam justamente a máquina legislativa encarregada de avaliar e encaminhar os atos por eles praticados. É à impunidade daí decorrente que se dá por aqui o nome genérico de “pizza” ou “terminar em pizza”, como se diz.

Já não se nota nos brasileiros qualquer estranhamento por ocasião da descoberta de novos casos de corrupção: nenhuma surpresa pode advir de atos que já fazem parte do cotidiano, sem emoções previstas dado os finais esperados de impunidade. A única coisa que ainda espanta um pouco é a cada vez maior profissionalização dos praticantes dos atos de corrupção: mesmo depois de flagrados, ressurgem eles em público com ar contrito, dizendo-se perseguidos e acusados pelo que não devem. Há casos em que acusados de corrupção pedem perdão em cadeia nacional, beirando as lágrimas, mas sempre eximindo-se de culpas que juram não serem deles. Teriam sido envolvidos, portanto, por pessoas nas quais confiaram. É o que dizem em nome de Deus e de suas famílias.

Assim caminha o Brasil, assim prevalece a corrupção. Por outro lado, importa citar que aqui na terra o eleitorado é dado a crises de amnésia por ocasião de eleições. Talvez por terem ciência disso, os corruptos utilizam meios jurídicos para continuarem em seus cargos, ainda que flagrados e acusados de corrupção; mais que isso, candidatam-se e são reeleitos como se nada houvera acontecido. Verdade que para as reeleições contribuem derramas de dinheiro público junto ao eleitorado de gente mais simples cuja gratidão pela ajuda recebida manifesta-se nas urnas. Trata-se de um curioso processo bem brasileiro que atualmente substitui outros meios não recomendáveis de vencer eleições, infelizmente comuns em nossa história passada.

Caro amigo, escrevo depressa, sem me propor a tecer um painel mais elaborado da corrupção no Brasil. Existem verdadeiros tratados sobre o assunto que podem ser achados em livrarias e bibliotecas. O que tentei foi atendê-lo, traçando poucas linhas sobre detalhes que, para nós brasileiros, não passam de obviedades.

De todo modo, o Brasil não é fácil, não. Por isso, não sei se me fiz compreender bem.

Um grande abraço do amigo ”