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Relatos

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Há o relato sobre um antigo rei do Egito que construiu um palácio com cerca de 300 quartos para que a morte, caso o procurasse, não conseguisse encontrá-lo. A cada noite dormia em quarto diferente em sua ânsia de ludibriar a morte. Já no fim da vida construiu uma tumba na qual havia uma miniatura de seu palácio e domínios. Milhares de súditos trabalharam na construção. Mas, como acontece a todos os mortais, o dia do rei chegou. Entretanto, seu enterro foi peculiar. No trajeto, seguido pelos súditos, as refeições a que ele estava habituado forma servidas nos horários de costume para que ele não soubesse que havia morrido. Quando, finalmente, seu esquife foi depositado na tumba a ele preparada fechou-se a entrada. Consta que centenas de súditos, ainda vivos, ficaram dentro da tumba para sempre.

O relato sobre o modo de oficiar a missa por um padre não deixa de ser interessante. Naquele tempo as missas eram rezadas em latim. Entretanto, na hora do evangelho, o padre repetia sempre as mesmas palavras. Chamava a atenção dos fiéis sobre um rio cujo leito percorria um majestoso vale. Convidava-os a observar a sinuosidade da trajetória e imaginar as dificuldades enfrentadas pela torrente de água que nunca passaria pelo mesmo lugar outra vez. Assim era a vida, percurso sinuoso e pleno de obstáculos a serem superados. O homem, como as águas do rio, ficava à mercê da torrente e, a ele, cabia prostra-se diante do Senhor, vivendo segundo os ditames da religião.

Durante muitos anos o padre repetia, em suas missas, a história sobre o rio. Conta-se que os fiéis, de tanto ouvi-la, passaram a conhecê-la de cor. Daí que nas missas podia-se ouvir um murmúrio, resultante da repetição pelos fiéis de cada palavra pronunciada pelo padre. Para muitos a história do rio tornou-se oração que se repetia nas casas em momentos dedicados à fé. Consta, ainda, que muitas crianças foram educadas segundo a filosofia de vida inspirada pelo trajeto do rio que, incansavelmente, percorria o vale imaginário inventado pelo capelão.

O terceiro relato é sobre um grande ator inglês que, certo dia, ao entrar no palco, perdeu sua capacidade de representar. Até então brilhara nos palcos, sendo capaz de incorporar variada gama de personagens. Tão grande foi seu desespero que confessou aos atores que com ele representavam ter perdido a sua magia. Pediu-lhes, então, que a procurassem e, caso a encontrassem, a devolvessem de vez que a ele a magia de atuar era muita cara.

O escritor Phillip Roth impressionou-se com a caso do ator que perdeu a magia. Sobre esse tema escreveu um romance denominado “Humilhação”. Para Roth a perda da magia pode acontecera qualquer um, em geral com o avanço da idade. No caso dos escritores o envelhecimento seria causa da perda da magia, influindo na arte de escrever. Ele próprio, Roth, aposentara-se ao perceber que sua magia de escrever fora desaparecendo.

Para cada um de nós cabe zelar pela magia empregada naquilo que fazemos.

A renúnica do papa

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A renúncia do papa Bento 16 confunde a opinião por inesperada. Na cabeça do povo papas morrem, realiza-se o conclave e dele surge o substituto eleito pelos cardeais hábeis ao voto - é preciso ter menos de oitenta anos de idade para ter direito ao voto de escolha do novo papa. Mas, papas renunciam? E como ficam os fiéis para quem o papa é o substituto de Jesus na Terra?

Fui criado dentro da fé católica. Minha mãe me levava às missas aos domingos que eram celebradas em latim. Aliás, o latim era matéria ensinada nas escolas. Ainda hoje sou capaz de recitar as cinco declinações latinas com exemplos, conforme aprendi na escola pública. Valorizava-se o latim do qual o português é derivado. A coisa era séria. Hoje em dia estão saindo das faculdades professores de português que não têm aulas de gramática normativa durante o curso superior. Muitos preferem ensinar a língua falada ao invés da linguagem culta daí que os alunos deles enfrentarão dificuldades em se expressar corretamente. Agora imagine-se o que aconteceria se alguém propusesse a volta do latim…

O papa tem representação maior do que a teatralidade da posição confere a ele. Ele é o guia de milhões de pessoas em todo o mundo que professam a fé católica. Há na figura papal algo que sugere ligação entre mundos, um sentido de travessia desta para outra vida na qual as verdades da fé se confirmarão. Milhões e milhões de pessoas acreditam nisso daí a figura do papa ser emblemática num mundo onde a fé surge em socorro a tanta confusão, desigualdades e injustiças.

Pelo que não se pode fugir à pergunta: um homem investido em cargo de tão alta envergadura pode simplesmente renunciar? Se pode ou não isso parece não importar porque o fato é consumado: o papa renunciou. A notícia caiu como bomba não só nos meios católicos e terá reflexos, não se sabendo ainda de que extensão.

Por que Bento16 desistiu? Hipóteses são levantadas, valorizando-se a idade avançada do papa que teria saúde frágil, daí não estar apto ao comando da igreja em todo o mundo. Mas, logo esta hipótese foi desmentida por um alto membro do clero do Vaticano que veio a público para dizer que o papa está bem de saúde. Renunciou porque renunciou e é possível que o segredo da sua renúncia pertença só a ele.

Há quem veja na renúncia um gesto de grande humildade porque Bento 16 deixa o poder enorme que detém em suas mãos. Outros atribuem a renúncia a questões políticas derivadas de uma divisão do clero ocorrida pela divulgação de documentos secretos que vazaram no Vaticano.

Enfim, a renúncia do papa está dando o que falar e percebe-se alguma desorientação nos pronunciamentos. Ninguém quer se comprometer aventado hipóteses que talvez jamais venham a ser confirmadas. Mas, o mais difícil de compreender é como alguém que se tornou papa pode desistir de continuar a sê-lo. Não se trata de uma renúncia a cargo político: maior que isso é a ligação do cargo com aquilo que não se conhece, com o poder que emana de uma crença que existe há mais de dois mil anos, poder esse legado por Jesus a São Pedro e dele aos pósteros ao longo de vinte séculos.

Não é o caso de se dizer que vale esperar por alguma explicação porque ela certamente não virá. Um novo papa será eleito e a vida continuará. Se as coisas serão as mesmas na religião só o tempo responderá.