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Medo de raios

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Quando menino soube do caso de um homem que morreu ao abrir a porteira de entrada do sítio onde morava. Chovia muito e ele foi atingido por um raio que caíra na cerca de arame farpado. Ficou ali, no chão, debaixo de uma chuva tremenda, o cavalo, solidário, em pé ao lado dele, guardando-o. Foi assim que o acharam. Eu conhecia o homem que era freguês do negócio de meu pai. Até hoje me lembro do enterro dele: passou pela frente de minha casa um caixão de madeira, levado por algumas pessoas, seguido por um punhado de gente circunspecta. Naquele tempo os velórios aconteciam nas casas das famílias dos mortos.

Bem defronte à cozinha de nossa casa, na rua, havia um enorme transformador da Companhia Sul-Mineira de Eletricidade. As tempestades eram frequentes e raios caiam no transformador que os atraia. Aquilo virava um espantoso centro de faíscas e estrondos repetidos. Meu irmão e um primo adoravam ver a cena do transformador exaurindo-se e resistindo à tormenta. Eu, pequeno infante, me escondia com medo de algo fantástico demais para o meu modo de ver as coisas.

Cresci com essa ideia de que as tempestades são perigosas, os raios piores ainda. Depois, fui me esquecendo dos raios quem sabe por que nas cidades existam tantos pára-raios que os engolem. Até que, ultimamente, voltou-se a falar em grande número de raios. No mês de janeiro, por exemplo, durante uma tempestade em nossa cidade, contaram-se mais de 100 raios.

O problema é que as pessoas não se preocupam com raios, daí as notícias sobre mortes de gente atingida por eles. Raio é coisa que cai na cabeça dos outros, nunca na gente porque seria azar demais – esse o modo de pensar. Recentemente, aqui no litoral, um rapaz foi morto por um deles. Chovia e o rapaz andava junto com o pai dele na orla da praia quando foi atingido. Morte instantânea, tal a força da descarga elétrica que o subjugou. Há pessoas atingidas enquanto tomam banho de mar durante tempestades etc.

Bem, para quem não sabe o Brasil é o país onde mais caem raios em todo o mundo, o dobro do número verificado nos EUA, por exemplo. A média de mortes por raios em nosso país é de cerca de 130 ao ano, sendo que 30% desses acidentes ocorrem na região Sudeste. Segundo informa o INPE/ELAT no Brasil cerca de 70% dos desligamentos na transmissão elétrica e 40% na distribuição são provocados por raios.

Mas, falo sobre raios porque me tornou à memória aquele João que vinha lá dos confins do Mato Grosso, matador de aluguel, daí ser mais conhecido como João Serpente. O que os mais velhos de minha família contavam é que esse tal Serpente fora contratado por um homem para matar o irmão dele devido a disputa por herança de muito dinheiro e posses. E o Serpente veio pelos caminhos do mundo até aproximar-se do lugar onde cometeria o crime para o qual se dispusera. Chegou ele num dia de chuva e acocorou-se no mato, bem na curva por onde passaria o irmão que ele mandaria para o outro mudo. E eis que a chuva apertou, trovões soaram e relâmpagos cortaram o céu. Ainda assim, aquele que seria morto apareceu no caminho. Era fim de tarde, chovia muito e vinha aquele que ia morrer sentado em seu cavalo. No que o viu o Serpente engatilhou a arma e, ao tê-lo sob mira, preparou-se para disparar. Mas, não o fez porque nesse exato momento um raio que se acredita mandado pelo próprio Deus atingiu-o em cheio, matando-o. Foi esse o fim do famoso João Serpente que cruzou vasta distância para vir morrer em ação.

Menino eu ouvia sobre o fato de que existem raios justiceiros, enviados para punir aqueles que praticam o mal. Mas, nem isso lograva me tornar admirador de raios, coisa que até hoje não sou. E para quem não teme raios recomendo uma visita ao site do INPE/ELAP. Nele o interessado ficará sabendo que ontem, 09/02, um homem morreu ao ser atingido quando estava na varanda de casa dele, em Cuiabá, um rapaz morreu atingido na Zona Leste de São Paulo, no dia 31 do mês passado 22 vacas morreram pela mesma razão…

Eu tenho medo de raios.