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Liberdade de expressão

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Em seu programa pela BANDFM o jornalista José Luis Datena reclama ter passado mal na noite anterior. Atribui o fato ao problema de não dispor de liberdade de dizer tudo aquilo que pensa. Avança, dizendo que a liberdade de expressão de fato não existe nos meios de comunicação. Há um limite imposto pelos mesmos veículos, quaisquer que sejam eles.

Ouvir isso do jornalista causa alguma estranheza dado ser conhecido por não ter papas na língua. Mas, sua declaração nos remete ao que nos é dado saber e, principalmente, à informação que nos é sonegada.

De que, enquanto público, não passamos de pessoas cujas opiniões são mediadas - de segunda mão - pela natureza das informações a que temos acesso, disso não restam dúvidas. De que tais informações são divulgadas sob o filtro de interesses daqueles que as recebem e passam adiante também não restam dúvidas. De modo que, enquanto público, estamos à mercê de toda sorte de manipulações. Pior: a formação das consciências pessoal e coletiva é afetada pelas verdades ou pretensas verdades a toda hora divulgadas.

Num momento em que o país atravessa talvez o mais tenebroso período de sua história não dispor de fontes de informação totalmente confiáveis nos coloca em situação complicada. Destarte as já conhecidas dificuldades relacionadas às fontes de notícias que nem sempre se caracterizam pelo compromisso com a verdade, estabelece-se um jogo no qual a opinião pública torna-se desvalorizada. As consequências desse fato são perigosas. Por exemplo: diante da maratona de acusações e desmentidos que pululam hoje em dia nos meios de comunicação, em quem deveríamos apostar para conduzir o país nas eleições do ano vindouro?

Não se descarte do dito acima o fato de que a unanimidade não só e burra com impossível. Nem nos enganemos na busca de verdades absolutas sobre as quais ninguém ousaria levantar as menores dúvidas. Entretanto, eis aí um momento no qual a velha boa-fé seria sempre bem-vinda.

Tem razão o Datena em perder o sono.

Ainda as biografias

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Nos últimos dias a discussão sobre as biografias autorizadas arrefeceu. Seguiu-se a lógica das notícias que envelhecem depressa demais. Novos acontecimentos ocupam espaços nas colunas dos jornais e direcionam a atenção: a morte de Mandela, o crescimento da economia do país aquém das expectativas, a despedida de um ano que se vai sem que saibamos se o novo será melhor ou pior, a incredulidade diante da violência absurda como a acontecida dias trás durante um jogo de futebol.

Mas, o assunto das biografias ainda não esgotado continua a merecer reflexões. Nesse sentido é muito útil reler algumas considerações de Hannah Arendt  que fazem parte de seu ensaio ‘Karl Jaspers: uma laudatio”. Ensina Arendt:

Somos todos pessoas modernas que se movem em público sem confiança e embaraçadamente. Presos em nossos preconceitos modernos, pensamos que apenas a “obra objetiva” separada da pessoa, pertence ao público; que a vida da pessoa por trás dela é assunto privado, e os sentimentos relativos a essas coisas “subjetivas” deixam de ser genuínos e se tornam sentimentais, tão logo  expostos publicamente … Para falar adequadamente, devemos aprender a distinguir não entre subjetividade e objetividade, mas entre o indivíduo e a pessoa. É verdade que é um sujeito individual que oferece alguma obra objetiva ao público, abandona-a ao público. O elemento  subjetivo, digamos o processo criativo que entrou na obra, não concerne de forma alguma ao público. Mas, se essa obra não é apenas acadêmica, mas se é também o resultado de “ter-se demonstrado na vida”, um ato e uma voz vivos acompanham-na; a própria pessoa aparece junto com ela. O que então emerge é desconhecido para quem o revela; não pode controlá-la da mesma forma que não pode controlar a obra que preparou para a publicação… O elemento pessoal está além do controle do sujeito e, portanto, é o exato oposto da mera subjetividade.

Obviamente Arendt referia-se á obras publicadas em livros, mas suas palavras são instigantes. A separação entre o público e o privado ora em curso transcende até mesmo o direito de livre expressão. Em essência o artista abre as comportas de sua própria existência no momento em que propõe uma obra à apreciação geral. Ainda que o incomode não se pode separá-la dele dai o empenho de biógrafos e o interesse público em devassar a vida e as circunstâncias que levaram o artista a produzir sua obra.

Liberdade de expressão

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“Innocence of Muslins” (A inocência dos muçulmanos) é o nome de um filme que está dando o que falar. Seu autor chama-se Sam Bacile nome certamente fictício. O filme tem 14 minutos de duração e satiriza o profeta Maomé, fundador do Islã.

A reação dos povos islâmicos ao filme é violenta a começar pelo ataque ao consulado norte-americano em Benghazi, na Líbia, que resultou na morte do embaixador dos EUA e alguns funcionários. Centenas de pessoas atacaram a embaixada dos EUA no Iêmen e grupos fundamentalistas antiamericanos estão em ação. De nada adiantam explicações dizendo que o filme não retrata a opinião do governo norte-americano. A secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, veio a público para classificar o filme como repugnante e tentativa cínica de ofender pessoas por sua crença religiosa, embora destacando que o governo não pode interferir na liberdade de expressão do país.

Eis aí assunto complexo. Alguém produz dentro dos EUA filme ofensivo à fé, divulga-o na internet, sabendo que vai atingir o nervo central dos povos de origem muçulmana. Mais que isso, o filme insere-se numa complexa e mal fechada teia de confrontos a todo custo mantida dentro de algum controle desde que foi iniciada a Primavera Árabe. Entretanto, o autor do filme tem a protegê-lo o sagrado direito democrático da liberdade de expressão que os EUA valorizam ao extremo, tanto que a Casa Branca sente-se de mãos atadas em relação ao filme.

Obviamente o discurso de Hillary Clinton cai no vazio porque ouvido e compreendido apenas pelos norte-americanos de vez que a “liberdade de expressão” não pode ser entendida na cultura dos povos muçulmanos ainda mais envolvendo agressão a Maomé. De todo modo fica em aberto a questão das responsabilidades nesse triste episódio ainda em andamento. As consequências de um filme claramente produzido para ofender a crença muçulmana rincluem mortes e protestos que se espalham no Irã, na Tunísia, no Marrocos, e no Iraque. Enormes esforços diplomáticos se fazem necessários para conter a progressão da crise gerada por esse filme ao qual não se pode negar ter atingido o alvo a qual se propusera.

WikiLeaks

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Meu caro amigo há coisas sobre as quais fica difícil realizar um juízo perfeito. Em primeiro lugar é bom lembrar que caras como eu e você pensamos – só pensamos – que as nossas opiniões são bem formadas e isentas de contaminação alheia. É bom achar isso, raciocinar assim, dá-nos uma imensa sensação de liberdade, individualidade e poder de escolha. Acontece, porém, que gente como nós vive de informações e opiniões terceirizadas. Você bem sabe que nós não temos acesso a fontes primárias de informação, não presenciamos fatos significantes, não estamos presentes em momentos decisórios e mesmo a imagem que fazemos de pessoas públicas é acompanhada de traços de opiniões de outras pessoas. Enfim, a nossa opinião é, quase sempre, “mediada pela mídia”.

Sei muito bem que refletir sobre isso é muito desagradável. Aliás, existe uma vigorosa contrapartida a tudo o que está sendo dito: bem, se não fosse assim, como seria? Pois é, não tem outro jeito, para isso existem jornalistas, comentaristas e toda sorte de gente cuja atividade consiste em mostrar o que acontece, sempre sob determinada óptica que muitas vezes nem é a deles mesmos, mas das empresas em que trabalham. Só para ficar num exemplo, veja aí o atual empenho dos meios de comunicação em mostrar a guerra contra o tráfico no Rio, cobertura quase toda isenta de críticas, exceto poucas vozes que agora começam falar em excessos e corrupção como a facilitação de fugas de bandidos mediante pagamento. Pelo amor de Deus, não estamos contra a invasão dos morros, na verdade estamos eufóricos com o fato de finalmente o Estado ter encarado o problema do modo como está fazendo agora. Aliás, por que não agiram assim antes?

Ditas essas coisas - e outras de que nem é preciso falar - pergunto: que pensar sobre esse tal de WikiLeaks? De repente, os carinhas do WikiLeaks, dissidentes de várias nacionalidades, publicam pilhas de documentos sigilosos, abrindo o jogo sobre negociações, acordos, fofocas e tudo o mais que rola entre os representantes políticos de vários países. Eles abrem a Caixa de Pandora sem a menor cerimônia, doa a quem doer. Imediatamente surgem protestos, países em guerra ou em disputa por qualquer coisa protestam porque certos documentos colocam em risco a segurança de exércitos e por aí vai. Quanto a nós, que impressão nos fica sobre assunto tão controverso?

Deixando de lado o jogo que envolve a liberdade de expressão e outros valores tão caros à civilização – em geral não praticados, mas tão importantes – o fato é que, para o bem ou para o mal, trata-se de uma rara ocasião em que a informação tende a chegar até nós, pobres mortais contribuintes do Estado, sem mediação. Ficamos sabendo, por exemplo, que o Ministro da Defesa do Brasil revelou aos EUA que Evo Morales tem um tumor na cabeça. Aqui no nosso mundinho isso mais parece fofoca, mas os grandalhões terão as razões deles para valorizar informação dessa ordem, quem sabe prevendo como influir na vida dos bolivianos, caso a doença do presidente se agrave. Também somos informados de que os EUA criticam duramente a estratégia de defesa do Brasil: para os irmãos do norte o submarino nuclear da Marinha brasileira não passa de um elefante branco. Coisas como essas talvez não sejam tão importantes, mas estão documentadas. São, portanto, os documentos que estão a falar conosco e não pessoas que expressam suas opiniões sobre o conteúdo deles.

Não sei o que você acha disso.  O WikiLeaks promete a divulgação dos quase 250 mil documentos sigilosos pirateados por um jovem soldado nos arquivos do governo norte-americano. Tem gente por aí morrendo de medo de que certas inconveniências sejam reveladas. Segredos de Estado como reservas de urânio, acordos para invasão de países etc têm vindo a público, mas o WikiLeaks promete muito, muito mais.

O império norte-americano está sendo posto a nu pelo WikiLeaks. Das consequências disso, para o bem ou para o mal, só saberemos após tudo ser divulgado.