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Fazendo a egípcia

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Vou comprar um “Aurélio” de papel. Dei-me conta de que há muito deixei de lado o hábito de ler dicionários. Culpa dos computadores, da computação. O último dicionário que comprei veio com um CD que instalei no computador e passei a usar. Tempos depois doei o dicionário em papel por julgá-lo desnecessário. Pura burrice. O manuseio do livro, a possibilidade de abrir numa página ao acaso e me deixar levar pelas palavras e seus significados deixou de existir. Para quem se mete a escrever a proximidade do dicionário e a leitura descompromissada das palavras é essencial.

Interessante, também, o modo como novas palavras são juntadas às já existentes, prova de que a língua é mesmo viva. Que dizer de expressões que da noite para o dia caem no gosto popular e passam a fazer parte do discurso comum utilizado pelas pessoas? E as gírias? E os modismos como esse que vem de embrulho com a novela “Saramandaia”, os quais já começam a ser falados por aí, incorporando-se ao dia-a-dia das pessoas? O uso do sufixo “mente” acrescentado às palavras é comum na novela da Rede Globo daí que, por exemplo, “dias passados” é trocado por “pratrazmente”. E por aí vai.

Leio que uma cantora foi vítima de roubo em aeroporto do Brasil. Tirava fotos com um fã e o cara deu um jeitinho de “abafar” o celular dela. Fato esse que obrigou a cantora a publicar na internet um aviso a seus conhecidos dizendo que não poderia atendê-los por estar sem o celular. Temendo que as pessoas interpretassem mal o fato de não atender as ligações a cantora justificou-se dizendo: “Se falarem comigo, não vou responder. Mas, não é porque estou fazendo a egípcia. É porque estou sem telefone”.

Pois confesso que fiquei intrigado com esse “não é porque estou fazendo a egípcia”. Sinceramente, eu desconhecia o significado da expressão. Fui procurar e descobri que significa “ignorar”, “virar a cara”, “fazer que não vê uma pessoa”.

Então, se você se decidir a ignorar alguém, automaticamente estará “fazendo a egípcia”. Emprega-se, também, a expressão para situações como sair de fininho de uma festa, evitando falar com pessoas que tomariam parte do seu tempo.

Como se vê a língua é mesmo viva.

Escrito por Ayrton Marcondes

25 agosto, 2013 às 3:24 pm

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Sobre as nossas falas

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De que há muito os brasileiros estão se distanciando da linguagem culta não existem dúvidas. Também, convenhamos: a gramática da língua é um porre, detentora de um arsenal de regras que torturam a estudantada. Dai que se vê, na prática, a turma se enfileirar na galeria dos famosos “jeitinhos”, burlando regras com as inevitáveis consequências de falar mal e escrever pior ainda.

Não posso afirmar com certeza, mas acho que hoje existem mais analfabetos funcionais que no passado. Fale-se mal da escola pública de hoje, mas nem sempre foi assim. Saíamos do que hoje é chamado Ensino Médio pelo menos falando e escrevendo mais ou menos bem.  Hoje em dia é preciso sair à rua com a Lanterna de Diógenes procurando por gente que seja capaz de engatilhar mais ou menos bem uns três ou quatro parágrafos numa folha de papel. Isso sem tocar nos novos jeitos de abreviar palavras e locuções adotadas pelos internautas que se comunicam entre si na velocidade do vento.

Bem, não sou do ramo e posso estar a dizer bobagens. Entretanto, esclareço que o meu interesse nesse assunto diz respeito à simples curiosidade sobre a língua que hoje se fala no Brasil. Que português é esse que rola nas conversas, cheio de expressões novas, maneirismos e quando não responsos ininteligíveis? Outro dia vi um vizinho do prédio defronte sair à janela e, alta voz, pronunciar vasto xingatório que brotava de suas entranhas contra um rapazote que chutava uma bola contra a parede e, a cada vez, gritava: gol. Tantos gols fez o distinto que despertou a ira do homem da janela não sendo certo se o ofendido ofendeu-se tão herméticas eram as agressões proferidas. Seria o da janela um russo, eslovaco, imigrante africano que nunca teria falado uma só palavra de nossa língua mãe? Não, o tal da janela era brasileiríssimo e nada mais fazia que o uso de impropérios muito comuns nas bocas de seus pares, talvez da gangue da qual seria integrante. Pois que existe isso da inclusão de dialetos tribais entre pessoas de grupos distintos que falam o português a seu modo.

Hoje de manhã fui à padaria. Na volta vinha pela calçada quando reparei em dois homens que iam bem à minha frente. Estariam, os dois, aí pela faixa dos quarenta de idade e falavam sobre um terceiro, conhecido ou amigo a quem criticavam por algum motivo. Porém, o interessante era mesmo a língua com a qual se comunicavam. Chamando um ao outro de “cara” falavam sobre o “cara” - o terceiro - e nenhuma de suas frases muito curtas deixavam de ter várias repetições da palavra “cara”. Era “cara” pra cá, “cara” pra lá, porra do “cara”, valete do “cara”, etc. Não consegui entender muito do que diziam e assim cheguei ao meu portão. Confesso que antes de entrar fiquei observando aqueles dois, vestidos esportivamente numa manhã de sábado, preguiçosamente seguindo o caminho deles, trocando muitos dedos de prosa expressa, talvez, em código no qual a palavra “cara” teria muitos significados. Seriam reais? Seres imaginários, inventados apenas para colocar um final num texto? Ou ETs visitando o nosso planeta e tentando passar por alguns de nós embora sem falar corretamente o português?