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50 anos depois

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Aproxima-se o dia 31 de março em que se completam 50 anos do golpe militar que deu início ao período de ditadura no país. Nos últimos dias a mídia tem dado espaço a toda sorte de comentários, resenhas e depoimentos sobre aquele conturbado momento de nossa história. Livros são publicados havendo entre os diferentes autores divergências a respeito dos fatores que desencadearam a queda de Jango e o início da ditadura. Ora valorizam-se mais os problemas internos do país na época considerada, ora a participação norte-americana com seu apoio ao golpe, sendo que a maioria atribui à somatória de vários aspectos os acontecimentos que ainda hoje despertam tanta atenção.

Vale lembrar que nos anos em que Jango foi presidente o país não contou com uma política direcionada no sentido de atacar e tentar resolver os problemas que afligiam o dia-a-dia dos brasileiros. Só para citar um exemplo às vésperas do golpe a inflação andava na casa dos 200%. Reinava no país a sensação de insegurança num tempo em que os reflexos da Guerra Fria se faziam presentes em todo o mundo. Nesse sentido a tendência esquerdista de membros do governo e as reformas anunciadas pelo presidente no célebre comício Da Central do Brasil funcionaram como estopim para o movimento que deu início ao período de ditadura no país.

Ressalte-se que de todo modo o chamado “Golpe de 64” pode ser enquadrado como uma rebelião anunciada. Desde o segundo governo de Getúlio Vargas a direita empenhava-se na direção de um golpe de estado. Vargas suicidou-se em 54 e Juscelino, eleito pelo voto direto, só o sucedeu porque o então Ministro da Guerra, Marechal Lott, garantiu a posse dele. Jânio era oposição e sucedeu a Juscelino para renunciar sete meses depois de assumir a presidência. Naquele momento o vice-presidente João Goulart só assumiu a presidência por aceitar dividir o poder dentro de um regime presidencialista. Depois disso ocorreu um plebiscito no qual venceu o presidencialismo e só então Jango tornou-se presidente com plenos poderes.

Mas, era tarde. Jango e sua equipe não conseguiram implantar um plano de governo confiável e eficiente. Em tal situação os militares encontraram campo aberto para o golpe, instalando-se no governo do qual só sairiam em 1985.

Que se diga tratou-se de golpe sem nenhuma resistência. Jango foi para o Rio Grande do Sul e de lá refugiou-se no Uruguai. Nenhuma força se levantou contra o golpe militar. Na época eu cursava o hoje chamado Ensino Médio na cidade de Itu onde há um quartel. Dado o golpe os soldados foram enviados ao Rio de Janeiro, participando de um movimento de tropas para o caso de alguma resistência. Consta que não lograram chegar ao Rio dado os caminhões em que viajavam terem quebrado na Via Dutra. Além do que carregavam armas cujo funcionamento seria duvidoso em caso de ação. Voltaram poucos dias depois e foram recebidos com festas pela população, heróis que se tornaram por participar de um movimento que restauraria o bom andamento das coisas no país.

Não sei dizer se em sua totalidade, mas o Golpe de 64 foi recebido pelo menos com alguma esperança pelo povo que desejava melhoria na qualidade de vida. E ninguém esperava que a ocupação do governo pelos militares fosse para durar. Em pouco tempo, com a casa em ordem, seriam convocadas novas eleições. Infelizmente não foi o que aconteceu.

Nunca me esquecerei de um professor que, já na década de 1970, nos avisou de que a nossa geração estava irreversivelmente perdida. A repressão e o silêncio imposto pela ditadura sufocaria possíveis futuras lideranças dado o risco de qualquer pessoa em aparecer publicamente e chamar a atenção dos órgãos repressivos. Ao observar a classe política atualmente em atividade no país penso na sentença pronunciada por aquele professor. Era ele um idealista, homem de princípios, que se dizia fora de época dado que os valores que professava, essencialmente democráticos, pouco ou nada valiam naqueles difíceis anos.