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Gato diabólico

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Eu morria de medo, mas adorava ouvir histórias assombrosas em meus tempos de menino. Meu pai contava que meu avô fora homem de coragem e aceitara o desafio de passar uma noite numa casa abandonada de fazenda que se dizia ser assombrada. Nos tempos da escravidão ali morara um fazendeiro muito cruel com seus escravos, muitos deles tendo morrido no local devido aos sofrimentos impostos. Depois da morte do fazendeiro e abolida a escravidão a casa deixou de ser utilizada por ser impossível ficar nela, daí a fama que tinha de lugar pertencente aos mortos no qual nenhum vivo deveria se intrometer.

Lembro-me perfeitamente dos silêncios em meio à narrativa de meu pai, acossando ainda mais a curiosidade dos ouvintes que queriam saber o que, afinal, acontecera ao meu avô na noite que passara na casa. Mas, o final da história não era lá dos mais aterrorizantes. Aconteceu ao meu avô não conseguir pegar no sono de jeito nenhum. Não havendo luz elétrica e ficando na dependência da chama de uma vela, meu avô enfrentou situação peculiar na qual não faltaram ruídos estranhos semelhantes aos de correntes sendo arrastadas. Seriam, talvez, as almas penadas dos negros ali torturados que permaneciam ligados ao lugar de seus sofrimentos. O certo é que foi tamanha a balbúrdia noturna na casa deserta que antes do raiar do dia meu avô decidiu que já se arriscara o suficiente num lugar tomado por acontecimentos inexplicáveis. Segundo meu pai, meu avô afirmou não ter em nenhum momento sentido medo: saiu da casa por prezar sua segurança pessoal dada qualquer impossibilidade de reação caso uma força do outro mundo viesse a afrontá-lo.

No passado os corpos de pessoas mortas eram velados em suas casas, sendo incomum a existência de velórios em cemitérios. Deve ainda ser assim nos interiores desse imenso Brasil. O caixão era colocado no centro da sala e ali permanecia até a hora de saída do enterro, em geral no dia seguinte. Na casa de minha avó, construção antiga hoje substituída por um prédio, havia uma sala enorme que servia a todas as comemorações da família. Mas, ali também se velavam os mortos. Depois, como a família era grande, em geral sobrava para alguém dormir naquela sala, cercado por um biombo que garantia a privacidade. Vi tanta gente dentro de caixões ali que não se ainda hoje, se a casa ainda existisse, gostaria de dormir nela: não seria impossível que durante a madrugada no cérebro do homem que me tornei de repente revivesse o menino temeroso de algum encontro com almas do outro mundo.

Hoje em dia não se fala muito no demônio e o cinema banalizou demais a imagem de Mefistófeles. Crianças habituam-se a demônios com chifres em desenhos animados e não levam a sério o ser do mal cuja missão é atrair os pecadores para o fogo do inferno. Mas, há quem tema as ações do demônio, acreditando que ele possa assenhorar-se de corpos de pessoas e animais. Em muitos credos a prática de exorcismo é comum, vejam-se programas televisivos de algumas religiões nos quais pastores se empenham para livrar pessoas dos demônios que afirmam ter possuído seus corpos.

Está acontecendo num lugarejo da Inglaterra um fato inusitado. De fato, as pessoas do lugar estão atribuindo ao estranho comportamento de um gato características diabólicas. Shiny -assim se chama o diabólico felino – é acusado de ter atacado crianças, adultos e até cachorros. As vítimas assustadas trancam as portas de suas casas e se armam com mangueiras para se defender em caso de ataque do terrível Shiny. Mordidas numa senhora de 90 anos, ataque a uma mulher causando ferimentos que necessitaram de atendimento hospitalar e outras atitudes violentas do gato têm provocado vários chamados à polícia.

Os donos de Shiny afirmam que ele vive na rua e ficou bem manso depois de ser castrado. Acreditam, ainda, que as pessoas atacadas tenham feito algo que provocou a reação do gato. Mas, para a população do vilarejo Shiny não é um gato normal, trata-se de um animal diabólico, sabe-se lá por que razão, talvez por ter incorporado algum espírito maligno.