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Villa-Lobos, intérprete do Brasil

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O jornalista Gilberto de Mello Kujawski publicou em seu site um belo artigo sobre o maestro Villa-Lobos. O endereço eletrônico é:

http://www.gilbertokujawski.com.br/

Para Kujawski a lição maior de Villa-Lobos é a possibilidade de “integrar todas as contradições na unidade deste país que “tem a forma de um coração”, o Brasil de todos nós.”

Tom Jobim contava que, certa vez, foi visitar Villa-Lobos e o encontrou trabalhando em meio a muitos ruídos: rádio ligado, pessoas falando etc. Diante disso, Jobim perguntou ao maestro se o barulho não o atrapalhava. Ao que ele respondeu:

- O barulho é para o ouvido externo; o interno é o que ouve e compõe.

Villa-Lobos ouviu o Brasil, país que traduziu em sua música. Sua obra é monumental de vez que, através de sons, logra representar toda a diversidade do país sobre a qual nos fala Kujawski em seu artigo.

Com frequência estudiosos publicam livros sobre escritores considerados intérpretes do Brasil. Os nomes variam de um autor para outro, mas as listas sempre incluem Euclides da Cunha, Joaquim Nabuco, Oliveira Viana, Sérgio Buarque de Holanda, Gilberto Freyre e alguns outros. Tem-se esquecido de incluir Villa-Lobos nesses estudos: o maestro interpretou o país com outra ferramenta, a música, e o fez de forma magistral.

A origem do mundo

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Acredita-se que o universo, tal como é conhecido, tenha se originado há cerca de 15 ou mais bilhões de anos a partir de uma formidável explosão que os cientistas costumam chamar de Big Bang. Já o nosso sistema solar possivelmente formou-se a partir de uma grande nuvem de poeira cósmica. Girando e condensando-se a nuvem deu origem ao Sol e aos planetas, entre eles essa maravilhosa Terra que a todo custo intentamos destruir.

O enigma da origem do mundo e do aparecimento da vida apaixonou os homens desde a mais remota antiguidade. Hoje se sabe que a vida surgiu nos oceanos há aproximadamente quatro bilhões de anos. Os primeiros seres vivos não passavam de células originadas pelas reações entre pequenas moléculas que, progressivamente, ganharam complexidade.

Se os parágrafos anteriores resumem estudos e descobertas de cientistas o mesmo não se pode dizer sobre outras interpretações sobre a origem do mundo. Visões particulares de filósofos e artistas conferem outras dimensões a respeito de fatos sobre os quais os cientistas se debruçaram ao longo de séculos.

Nesse sentido é muito interessante a interpretação de Gustave Courbet (1819-1877) sobre a origem do mundo no quadro homônimo que desenhou. Coubert foi um pintor francês realista cujas telas são produto da observação direta. Considerado anarquista era amigo do filósofo anarquista Proudhon, do poeta Charles Baudelaire e do caricaturista Daumier. É de Pedro José Proudhon(1809-1865) a célebre frase “a propriedade é um roubo” referindo-se ao fato de que a existência da propriedade torna possível a apropriação do trabalho de outrem. Proudhon foi muito lido no Brasil e influenciou vários intelectuais, entre eles Euclides da Cunha. O professor Miguel Reale destaca em seu livro “A Face Oculta de Euclides da Cunha” o aspecto curioso da simpatia o autor de “Os Sertões” por Proudhon de vez que Euclides repelia qualquer tendência anárquica.

Mas, eu me desencaminho. Voltando a Coubert, por volta de 1850 ele abandou a fase realista e passou a desenhar formas voluptuosas de conteúdo erótico. Em 1866, Coubert produziu o quadro extremamente chocante que é a “Origem do Mundo”. Trata-se de uma representação frontal das coxas e da vulva de uma mulher. A observação do quadro incomoda e desperta várias reações, destacando-se a vergonha. O que está exposto na tela é um nu frontal e sem disfarces da genitália feminina, sugerindo os começos da vida e contrapondo-se ao erotismo que normalmente emprestamos a ela. É a dualidade entre erotismo e geração da vida, mostrada na tela com crueza, que fere o observador estimulando os seus preconceitos. Nada a ver, portanto, com as considerações científicas sobre a origem do mundo e da vida.

Gustave Coubert defendia o socialismo e foi um agitador político. É considerado um precursor do impressionismo e do cubismo. Os críticos de arte e os estudiosos do modernismo garantem que os pintores impressionistas aprenderam muito com a arte de Coubert.

Euclides da Cunha, 100 anos

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euclidesdacunhaHá exatamente 100 anos, no dia 15 de agosto de 1909, o escritor Euclides da Cunha saiu à rua levando um revólver calibre 22. Seu destino era a casa do cadete Dilermando de Assis, localizada na Estrada Real de Santa Cruz, Piedade, Rio de Janeiro.

O desfecho da aventura de Euclides é conhecido: durante uma troca de tiros Euclides é alvejado por Dilermando e vem a morrer. O móvel do crime é a mulher de Euclides, Ana de Assis, que tinha um caso com o cadete Dilermando. Um ano depois, o filho primogênito de Euclides – Euclides da Cunha Filho – tentou vingar a morte do pai e também foi morto por Dilermando.

Dilermando de Assis foi absolvido de seus dois crimes em sessões no Tribunal do Júri. A defesa de Dilermando foi realizada pelo célebre advogado Evaristo de Moraes filho que alegou, em ambos os casos, legítima defesa.

Deve-se a Elói Pontes uma biografia de Euclides da Cunha cujo título é “A vida trágica de Euclides da Cunha”. Voltada mais para a obra que o homem é a excelente biografia escrita por Olímpio de Souza Andrade intitulada “História e Interpretação de Os Sertões”. Outra biografia do escritor é a de Silvio Rabelo cujo título é “Euclides da Cunha”.

A morte de Euclides foi o corolário da vida difícil de um homem inadaptado. Infelizmente as circunstâncias trágicas da sua morte pelas mãos do amante de sua mulher marcaram a figura do escritor como se fora este o fato maior de sua existência. De fato, o assassinato de Euclides da Cunha impregnou a sua imagem pública que talvez seja mais conhecida pela tragédia final que por sua obra. Para isso certamente contribuem representações que tomam Euclides como personagem esmerando-se em apresentá-lo como o homem traído que se bate por sua honra sem sucesso.

Ora, tem razão Olimpio de Sousa Andrade quando valoriza a história de Os Sertões referindo-se a Euclides enquanto autor de obra ímpar e perene da literatura brasileira. Esse modo de ver valoriza os acontecimentos da vida de Euclides buscando no homem o grande escritor que ele foi. A tragédia da morte torna-se, assim, fato menor, noticiário de páginas policiais que em nenhum momento ensombrece a grandeza de Euclides da Cunha.

O que é preciso deixar claro, portanto, é que no dia de hoje celebra-se o passamento do autor de Os Sertões, livro fundamental na história da inteligência brasileira e que tem, no século trasncorrido, influído nos modos de ser e pensar daqueles que estudam e procuram compreender o Brasil. Valorizar na celebração desse acontecimento as circunstâncias da morte do grande escritor de Os Sertões em detrimento de sua reconhecida importância é tomar a sua existência pelo que ela teve de menor.

Muito se pode dizer sobre Os Sertões. É vasta a bibliografia sobre o grande livro valorizando seus múltiplos aspectos. Decorre esse fato da preocupação de Euclides em explorar, analisar e buscar explicar as origens da gente brasileira, seu modo de ser e a influência que tiveram sobre o desenvolvimento da sociedade local diversos fatores, entre eles os raciais e climáticos. Munido de ferramentaria científica, filosófica e sociológica disponível em sua época, Euclides da Cunha entregou-se à paixão de descrever os sucessos ocorridos em Canudos que culminaram na chacina dos adeptos de Antônio Conselheiro.

Tomado como um livro de denúncia Os Sertões é muito, muito mais que isso: trata-se de uma das primeiras interpretações do Brasil que embora se ressinta de análises feitas segundo os conhecimentos da época em que foi escrito mantém-se viva e atual. Isso acontece, entre outros fatores, porque o escritor de Os Sertões é antes de tudo um grande poeta, cinzelador de palavras, cultor da forma e homem encantado por belezas inacessíveis ao comum dos mortais.

Celebra-se, assim, no dia de hoje, o centenário da morte de um intérprete do Brasil. Daí serem mais que justas as homenagens que se prestam nesse momento ao escritor maior de Os Sertões.