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Domingo

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O dia começa sob intenso calor. Na fila da padaria um homem fala sobre a explosão demográfica prevista para o litoral, devida à descoberta do pré-sal. A Petrobrás vai ocupando espaços, o governo do Estado projeta obras, o mundo junto ao mar parece encolher-se diante disso que chamam de progresso.

Alguém se anima a dizer que tudo isso é muito bom, novos empregos serão gerados na região. Um senhor, idoso e provavelmente aposentado, interfere dizendo que já viu esse filme antes, no fim as grandes corporações ganham e para o bolso do cidadão comum nada.

Não deixa de ser interessante ouvir o que dizem as pessoas na rua. O jornaleiro da esquina, um sujeito meio fechado, de uns tempos para cá deu de puxar conversa. É louco por futebol, santista roxo e não gostou muito da candidatura de última hora do Teixeira para presidente do Santos. Para ele está na hora de mudar, gastar mais dinheiro com o time que com comissão técnica. O Luxemburgo… e por aí vai.

O porteiro do prédio onde moro é corintiano até o pescoço e tem um radinho de pilha sempre ligado em programas esportivos. Ele reclama dos cariocas que sempre mandaram em tudo e ainda hoje comandam o futebol.

- Pode? – pergunta ele.

A opinião do porteiro é a de que o detestável São Paulo – ele não gosta do tricolor – está sendo vítima de uma armação carioca. Um morador, homem de mais de 70 anos, ouve o porteiro e acrescenta:

- Isso não tem jeito. Carioca manda. Não lembra da seleção de 50? O técnico era o Flávio Costa. Ele escalou para a ponta esquerda o Chico que era parente dele. Enquanto isso, aqui em São Paulo, o Teixerinha comia a bola. E o Brasil perdeu, com Zizinho e tudo.

Deixo os homens falando, esperando não encontrar ninguém no elevador. Quando a porta se abre, surge o português do quinto andar que vive às turras com a irmã dele. A razão ele me contou outro dia, pedindo segredo: ela pinta quadros, gasta um dinheirão com tintas e não vende nenhum.

Passo pelo quinto andar imaginado um apartamento cheio de quadros e uma pintora empenhada em retratar o mundo para ninguém ver. Penso que numa de suas telas estará o irmão, com sua grande barriga, dedo em riste gritando: chega de quadros.

Depois disso não sei dizer o que mais acontece. É domingo, faz muito calor, de vez em quando cai uma chuva de verão que passa depressa e as pessoas continuam andando por aí, dizendo coisas, aplaudindo, reclamando, relembrando, amando, odiando, mostrando-se simplesmente humanas.