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A um amigo estrangeiro: a corrupção no Brasil

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cartaUm amigo estrangeiro me escreveu perguntando sobre os casos de corrupção no Brasil noticiados pela imprensa de vários países. Enviei a ele o texto abaixo, tentando explicar como se passam as coisas neste lado do Atlântico:

“ Caro amigo

Os acontecimentos ocorridos no Distrito Federal envolvendo o governador, o presidente da Câmara e muitos outros políticos já não escandalizam a população, habituados que estão os brasileiros à permanência em cargos públicos de pessoas envolvidas em atos de corrupção.

Houve tempo em que a corrupção aparecia no país como sintoma de que algo estava errado nas máquinas administrativas. Tratava-se, apenas, de um primeiro estágio que evoluiu ao segundo, o de doença, para logo depois mostrar-se com características epidêmicas. De fato, a doença se espalhou tornando-se, atualmente, incontrolável.

É preciso destacar que, no Brasil, a corrupção deixou de ser atividade de exceção; nos dias atuais ela estabeleceu-se como padrão de rotinas que conquistam inúmeros seguidores os quais, por sua vez, aliciam novos adeptos, gerando-se um movimento organizado de dinheiros repartidos proporcionalmente entre um número cada vez maior de pessoas.

Alçando-se ao estatuto de profissão, a corrupção oferece a vantagem de não exigir de quem queira praticá-la formação ou diploma específico. Qualquer um pode se tornar corrupto desde que tenha oportunidade e se aproxime de outros partícipes de atos de corrupção. Isso acontece porque é raro que um corrupto de carteirinha pratique o seu ofício sozinho. Como você sabe a corrupção exige aliados, transferências de bens, aliciamentos, pactos de silêncio e, principalmente, nenhuma vergonha. Nisso tudo, os corruptos brasileiros são muito bons, daí que não se duvide de que possam, em médio prazo, exportar práticas seguras de assaltos ao patrimônio público.

Frequentemente lê-se nos meios de comunicação pronunciamentos de autoridades juradas no combate à corrupção. A tônica de seus discursos sempre envolve dificuldades jurídicas ligadas às imunidades parlamentares, prazos, morosidade da Justiça, recursos impetrados etc. Vale dizer que corruptos de mais alta hierarquia conhecem profundamente todos os mecanismos jurídicos e suas válvulas de escape. Além disso, dispõem eles de altas somas de dinheiro subtraídas ao erário público que lhes permite a contratação dos melhores advogados. Certos, ainda, de que a Justiça não mudará – as regras são sempre mantidas –dispõem eles de vasto campo de ação, mantendo-se em seus cargos e, dada a sua desfaçatez, prosseguindo com suas atividades de corrupção. Não será demais citar casos em que corruptos chefiam justamente a máquina legislativa encarregada de avaliar e encaminhar os atos por eles praticados. É à impunidade daí decorrente que se dá por aqui o nome genérico de “pizza” ou “terminar em pizza”, como se diz.

Já não se nota nos brasileiros qualquer estranhamento por ocasião da descoberta de novos casos de corrupção: nenhuma surpresa pode advir de atos que já fazem parte do cotidiano, sem emoções previstas dado os finais esperados de impunidade. A única coisa que ainda espanta um pouco é a cada vez maior profissionalização dos praticantes dos atos de corrupção: mesmo depois de flagrados, ressurgem eles em público com ar contrito, dizendo-se perseguidos e acusados pelo que não devem. Há casos em que acusados de corrupção pedem perdão em cadeia nacional, beirando as lágrimas, mas sempre eximindo-se de culpas que juram não serem deles. Teriam sido envolvidos, portanto, por pessoas nas quais confiaram. É o que dizem em nome de Deus e de suas famílias.

Assim caminha o Brasil, assim prevalece a corrupção. Por outro lado, importa citar que aqui na terra o eleitorado é dado a crises de amnésia por ocasião de eleições. Talvez por terem ciência disso, os corruptos utilizam meios jurídicos para continuarem em seus cargos, ainda que flagrados e acusados de corrupção; mais que isso, candidatam-se e são reeleitos como se nada houvera acontecido. Verdade que para as reeleições contribuem derramas de dinheiro público junto ao eleitorado de gente mais simples cuja gratidão pela ajuda recebida manifesta-se nas urnas. Trata-se de um curioso processo bem brasileiro que atualmente substitui outros meios não recomendáveis de vencer eleições, infelizmente comuns em nossa história passada.

Caro amigo, escrevo depressa, sem me propor a tecer um painel mais elaborado da corrupção no Brasil. Existem verdadeiros tratados sobre o assunto que podem ser achados em livrarias e bibliotecas. O que tentei foi atendê-lo, traçando poucas linhas sobre detalhes que, para nós brasileiros, não passam de obviedades.

De todo modo, o Brasil não é fácil, não. Por isso, não sei se me fiz compreender bem.

Um grande abraço do amigo ”