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Loucura de amor

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Acontece a você, vez ou outra, não querer saber o fim de uma história? Não será você um desses caras que acompanha novelas só pelo prazer de não assistir aos últimos capítulos?

Pois existe no mundo gente que odeia epílogos ou escolhe viver situações que nunca terminam . Conheci um homem assim: alto, magro, barba rala, circunspecto, hermético, celibatário, sempre com um terno marrom, o mesmo terno que dava a impressão de ser lavado e passado diariamente.

Para mim esse homem veio do nada e no nada se perdeu. É desses que parecem ter-se convertido em simples memória, tão etéreo que questiono se ele realmente existiu ou foi criado pela minha imaginação.

Não me perguntem o nome do homem. Dele guardei poucas cenas, estanques, que começam e terminam no ambiente de uma sala ampla cujos detalhes físicos me escapam.

De onde veio o homem? Impossível saber. Sei que entrou no meu mundo de menino como um próximo de meu pai que, de vez em quando, ia visitá-lo e me levava junto. O tal morava numa casa, na entrada da pequena cidadela em que vivíamos. Tinha ares de oriundo de civilização mais avançada, condição que conferia ele algum status de superioridade.

Desse estranho homem guardei a confissão de que amara loucamente a uma mulher e, não correspondido, castrara-se. Isso é tudo que retive do discurso metódico dele. Não me lembro de mais nada, nem sei o que aconteceu a ele depois embora me pareça que o suicídio teria sido um final razoável para a sua vida. Mas, mesmo isso não passa de mera suposição.

Foi a partir daí que fiquei sabendo que o amor pode levar pessoas a atos extremos.  Talvez essa afirmação sirva de epílogo a essa história sem fim e, a seu modo, explique tudo.

Resta a figura de meu pai. Ele está sentado numa cadeira de vime, defronte o homem que fala sobre a sua castração. Nessa cena não passo de um menino que se distrai com afazeres de criança. Ainda assim, tenho tempo para anotar um sorriso que se esboça, mas não se completa, no rosto de meu pai, sorriso maroto de quem mantém intacto o órgão, sorriso algo superior de macho inteiro que se eleva sobre a arrogância intelectual do homem castrado.

Escrito por Ayrton Marcondes

1 maio, 2010 às 10:50 am

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