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O caso Neymar

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Pelo simples fato de existir o craque Neymar atira pesadas farpas em conceitos e preconceitos ligados à educação. Falta a ele amadurecimento, estamos criando um monstro e por aí vão as inúmeras opiniões sobre o jogador do Santos.  Há quem o defenda, dizendo que está-se a exigir demais de pessoa tão jovem, que a educação dele pertence apenas ao pai e a ninguém mais.

O caso Neymar vende. Existem bonecos Neymar, crianças cortam o cabelo “a la Neymar” e os noticiários cedem, diariamente, grande espaço ao jogador. É quando os sociólogos e pedagogos de plantão entram em cena para confrontar a celebridade precoce de Neymar como o fato de ele não estar preparado para tanta badalação. Existe, também, o salário de Neymar que informa-se ser de 1 milhão por mês, livre de impostos. E, ainda, o fato de Neymar não ter ido jogar num clube inglês, sob a desculpa de dirigentes e familiares de que tudo tem o seu tempo, melhor ficar por aqui até amadurecer, crescer no seu ambiente, etecetera e tal.

Mas, não é só isso. Neymar está cercado por muitas problematizações, a maioria relacionada com a sua juventude e sucesso precoce. Os adversários em campo o culpam pela irreverência despropositada como o caso de um chapéu dado em momento de bola parada. Por seu turno, Neymar reclama que batem muito nele, isso sob a complacência dos juízes que o deixam apanhar para valer sem fazer nada.

Por último – veja-se que está muito longe de qualquer último nessa história – Neymar se desentendeu com o técnico, revoltou-se porque foi impedido de bater um pênalti, bateu boca no vestiário - dizem que até atirou uma garrafa - vai-se lá saber o que de fato aconteceu. O técnico exigiu punição, a diretoria achou demais e o técnico foi demitido.

Se todos esses fatos forem colocados num liquidificador e, depois, batidos com boa velocidade, creio que teremos um estrato do que se passa na cabeça do Neymar. Jovem demais e dotado de prodigiosa familiaridade com a pelota, está ele agora naquela parte inicial do estrelismo, na qual a estrela pesa demais sobre a cabeça. Não dão a ele folga e todo mundo acha – inclusive eu – que se pode dizer alguma coisa a respeito, quem sabe interpretar tudo e achar uma explicação ou caminho que ponha as coisas em seus devidos lugares.

Neymar é, no momento, só um menino com acesso de rebeldia, de grau maior que a prevista para a idade por conta da fama de que goza. É ídolo de pés de barro, mas não adianta avisá-lo sobre isso porque, nesse caso, o aprendizado não se faz por via oral, fica por conta da vida. É bom lembrar que tudo o que Neymar sabe é chutar bola, aliás é bem isso que todo mundo espera dele. Então, se queremos de fato ajudá-lo, vamos deixar o rapaz em paz, parar com toda essa badalação, diminuir o espaço no noticiário, parar de correr tanto atrás dele, fazendo estardalhaço sobre tudo o que se relaciona a ele. Quem sabe tratando o rapaz como um ser humano normal ele possa descer das nuvens e jogar, jogar muito, fazer à perfeição o que ele sabe.

Simples assim? Pode não ser, mas pode ajudar.

Conversa no táxi

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Entro no táxi na esquina do canal. O taxista é um homem de cerca de 60 anos, muito sorridente. Mal me acomodo e lá vem ele com comentários sobre o calor e o inevitável papo sobre o campeonato brasileiro.

Atuação de juízes, resultados de jogos, classificação das equipes, pressão para o Flamengo ser campeão, sobre isso e muito mais fala o homem, pedindo a minha opinião. Até que passa uma moça bonita e o assunto muda para beleza e coisas boas de ver. É nessa altura que ele assume um tom grave e dispara alguns impropérios contra o destino.

É curiosa a teoria do taxista. Ele me diz que as mulheres bonitas são as mais sensíveis a problemas que afetem as suas aparências. Respondo que se isso for verdade talvez seja porque nas mais bonitas se percebe mais facilmente a ação do tempo sobre a beleza delas.

Ele não concorda e acrescenta que esse mundo foi feito para que tudo acabe lentamente, de modo que possamos presenciar a decrepitude. Nessa altura decido olhar para o espelho retrovisor, buscando a imagem do rosto do taxista: pode bem ser que eu esteja vivendo uma impossível experiência surrealista e tenha entrado num táxi dirigido pelo próprio Machado de Assis.

Machado ou não, o homem prossegue com a sua teoria:

- O senhor talvez não tenha prestado atenção, mas como explicar certos acontecimentos? Já disse ao senhor que o destino da beleza das mulheres é minguar dia-a-dia, irreversivelmente. Então, basta observar bem os fatos para concluir que algo de estranho acontece com certas pessoas, como se uma força maior quisesse afirmar a sua presença e o controle sobre todos nós. O senhor se lembra do João do Pulo? Ela era recordista mundial de salto triplo. O que aconteceu a ele? Ora um acidente no qual ele perdeu o que tinha de mais precioso: uma perna. Pode? E aquele locutor esportivo, o Osmar Santos? Pois num acidente de carro ele perdeu a voz que era o seu instrumento de trabalho. E quanto ao Lars Grael, campeão de vela cuja perna foi decepada durante um acidente em pleno mar? O que o senhor acha disso?

Eu ia dizer a ele que Jorge Luís Borges, cuja paixão era ler, ficou cego e um meu tio, matemático, sofreu um derrame que lhe roubou apenas a capacidade defazer contas. Também me ocorreu um amigo que casou-se com uma modelo lindíssima e sofreu irreversíveis problemas de natureza sexual, ele que sempre fora tão galante e mulherengo.

Mas não disse nada por que chegamos ao local determinado por mim. Já na calçada parei para olhar o carro se afastando e tive a impressão de que nada daquilo fora real, na verdade o motorista não dissera uma só palavra e eu imaginara toda a conversa.

Não sei dizer. Mas entrei no elevador pensando sobre a eterna discussão quanto à bondade de Deus. Lembrei-me das teorias que afirmam que Deus só seria realmente completo criando tudo o que existe, daí ter Ele criado também o mal ou não seria verdadeiramente Deus. Eu me interrogava sobre a bondade divina ao ferir pessoas tirando-lhes justamente aquilo que elas têm de melhor quando cheguei, finalmente, ao escritório e vi pela janela o mar, azul, lindo, maravilhoso, testemunhando com alguma insolência os contrastes deste mundo.

Domingo

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O dia começa sob intenso calor. Na fila da padaria um homem fala sobre a explosão demográfica prevista para o litoral, devida à descoberta do pré-sal. A Petrobrás vai ocupando espaços, o governo do Estado projeta obras, o mundo junto ao mar parece encolher-se diante disso que chamam de progresso.

Alguém se anima a dizer que tudo isso é muito bom, novos empregos serão gerados na região. Um senhor, idoso e provavelmente aposentado, interfere dizendo que já viu esse filme antes, no fim as grandes corporações ganham e para o bolso do cidadão comum nada.

Não deixa de ser interessante ouvir o que dizem as pessoas na rua. O jornaleiro da esquina, um sujeito meio fechado, de uns tempos para cá deu de puxar conversa. É louco por futebol, santista roxo e não gostou muito da candidatura de última hora do Teixeira para presidente do Santos. Para ele está na hora de mudar, gastar mais dinheiro com o time que com comissão técnica. O Luxemburgo… e por aí vai.

O porteiro do prédio onde moro é corintiano até o pescoço e tem um radinho de pilha sempre ligado em programas esportivos. Ele reclama dos cariocas que sempre mandaram em tudo e ainda hoje comandam o futebol.

- Pode? – pergunta ele.

A opinião do porteiro é a de que o detestável São Paulo – ele não gosta do tricolor – está sendo vítima de uma armação carioca. Um morador, homem de mais de 70 anos, ouve o porteiro e acrescenta:

- Isso não tem jeito. Carioca manda. Não lembra da seleção de 50? O técnico era o Flávio Costa. Ele escalou para a ponta esquerda o Chico que era parente dele. Enquanto isso, aqui em São Paulo, o Teixerinha comia a bola. E o Brasil perdeu, com Zizinho e tudo.

Deixo os homens falando, esperando não encontrar ninguém no elevador. Quando a porta se abre, surge o português do quinto andar que vive às turras com a irmã dele. A razão ele me contou outro dia, pedindo segredo: ela pinta quadros, gasta um dinheirão com tintas e não vende nenhum.

Passo pelo quinto andar imaginado um apartamento cheio de quadros e uma pintora empenhada em retratar o mundo para ninguém ver. Penso que numa de suas telas estará o irmão, com sua grande barriga, dedo em riste gritando: chega de quadros.

Depois disso não sei dizer o que mais acontece. É domingo, faz muito calor, de vez em quando cai uma chuva de verão que passa depressa e as pessoas continuam andando por aí, dizendo coisas, aplaudindo, reclamando, relembrando, amando, odiando, mostrando-se simplesmente humanas.

Ao meu tio Edésio - notícias sobre o futebol

com um comentário

Escrevo para dar noticias sobre o seu esporte favorito: o futebol.

Em primeiro lugar vou falar sobre o seu time do coração, o São Paulo, que o senhor em momento inspirado apelidou de “Colosso”. Pois o Colosso vai mais ou menos bem, obrigado. Depois de ganhar pela sexta vez o Campeonato Brasileiro, o Colosso se acomodou e deu para perder competições. Foi assim com o Campeonato Paulista e a Taça Libertadores da América. Agora o Colosso está na disputa do Campeonato Brasileiro, mas com tantos altos e baixos que o melhor é não acreditar muito que ele possa vir a ser campeão.

Na verdade, tio, o futebol mudou muito de uns anos para cá. Cada vez mais um grande negócio, o futebol de hoje globalizou-se no pior sentido do termo: os bons jogadores atuam fora de seus países e só se reúnem para jogar pelas seleções nacionais. Posso garantir que o senhor acharia realmente incrível o fato de a Seleção Brasileira entrar em campo, hoje em dia, sem nenhum jogador atuando no Brasil. Pois isso acontece muitas vezes dado que os jogadores estão mais para caixeiros-viajantes de sua arte que atletas de futebol.

Tudo muito diferente, tio, dos bons tempos em que sabíamos as escalações dos times e quem jogava nessa ou naquela posição. E olhe que isso tem afetado até mesmo o amor à camisa: acredite o senhor que, na última Copa do Mundo, o Brasil foi desclassificado e os jogadores saíram de campo como se tivessem participado de um jogo de várzea, alguns muito sorridentes. Atrás deles um país inteiro torcendo e sofrendo. Tio, eu não me envergonho de confessar: quando vi aquilo me senti um grande idiota por ter torcido pelo Brasil. Pode uma coisa dessas?

Mas, voltemos ao Colosso. O grande clube está envolvido com a realização da Copa do Mundo de 2014 que acontecerá aqui no Brasil. O senhor deve se lembrar bem do Morumbi, o campo sagrado dos tricolores. Lembra-se, também, da dureza que foi o período de construção do estádio durante o qual o senhor e outros tricolores fanáticos sofreram muito porque o Colosso não tinha dinheiro para montar um bom time. Anos e anos de luta e sofrimento da torcida resultaram na posse de um grande estádio, orgulho da cidade de São Paulo e palco de jogos memoráveis. Pois agora, o Morumbi é o estádio mais cotado para a realização de jogos da futura Copa do Mundo na cidade de São Paulo.

Entretanto, meu caro tio, não é que um tal Joseph Blatter, presidente da FIFA, deu de falar mal do  Morumbi, dizendo que não serve para a Copa e outras barbaridades? O mais triste é que tem muita gente de outros estados vibrando, o que é inaceitável – trata-se da velha rivalidade. A verdade é que Blatter rebaixou o estádio que tem o apoio do governo do Estado e da prefeitura da capital. Tem gente por aí falando em lobby de outros estados contra São Paulo. No final das contas o que a FIFA diz é que o estádio não tem condições de abrigar 65 mil pessoas e assim por diante. Os dirigentes do Colosso discordam, afirmando que o clube fará a sua lição de casa e atenderá às exigências da FIFA até a realização da Copa.

Aliás, tio, não custa nada contar para o senhor alguma coisa sobre a FIFA. Imagine que essa entidade negociou com “alguém” do governo - que ninguém diz quem é - a isenção total de impostos para patrocinadores, fornecedores, enfim todas as empresas ligadas à realização da Copa do Mundo. Trata-se de muito dinheiro, uma enormidade de negócios. Só que agora o pessoal da Receita Federal, que pelo jeito acaba de saber disso, está se opondo a esse absurdo. Ainda bem.  Imagine o senhor que todos nós aqui damos um duro desgraçado e o governo do país nos impõe uma das mais altas taxas de impostos do mundo. Ai vem para cá essa turma toda e, na cara dura, é favorecida. Pode? O senhor não acha um absurdo?

Pois é. Mas, tio Edésio, isso não é tudo. Veja que tamanha desfaçatez baseia-se numa exigência da FIFA para a realização da Copa no Brasil, exigência essa que foi aceita por “algum negociador” que certamente não agiu sozinho. Esse(s) negociador(res) deve(m) ter até um chefe, tio, embora nisso as coisas não tenham mudado porque “neste pais” ninguém sabe de nada quando a podridão vem à tona.

O que espanta é que a FIFA, presidida pelo tal Blatter (o Havelange deles), não é um negócio pequeno, muito pelo contrário. A entidade movimenta por ano cerca de metade do PIB da Argentina, país que faz parte do G-20, o grupo de países que conversa sobre a economia do mundo. É dinheiro prá caramba que a FIFA movimenta, muito mais que o PIB anual de inúmeros países.

Diante disso tudo, a alegria que resta é a de dar a louca nos jogadores e o Colosso vencer o campeonato deste ano. Se acontecer, prometo escrever contando tudo para que o senhor comemore aí.

Tio Edésio eu raramente escrevo cartas, o senhor sabe como é isso.  Mas hoje me deu vontade de enviar essas mal traçadas.  O senhor nos deixou há muito tempo e o mundo em que vivemos está bem diferente daquele que o senhor conheceu. Mas, não se preocupe: continuo o mesmo cara de sempre, talvez um pouco fora de moda por acreditar em valores que têm sido esquecidos por boa parte das pessoas.

Essas são as notícias aqui da terra que eu queria passar para o senhor que, tenho certeza, continua sendo um grande apaixonado pelo futebol.

Um grande abraço e muita saudade.