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O menino Lula

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Está em andamento no país um processo de mitificação pessoal com consequências imprevisíveis. Trata-se do movimento de que visa emprestar cores míticas ao homem que atualmente ocupa o cargo de presidente da República do Brasil. Fazem parte do movimento o filme “Lula, o filho do Brasil” e dois livros com o mesmo título. A tudo isso se acrescenta agora o livro “O Menino Lula”, escrito pelo jornalista Audálio Dantas e publicado pela Ediouro.

As resenhas de apresentação do livro afirmam que o texto foge ao espectro infanto-juvenil dado contar a história (triste) de um menino retirante que chegou à presidência da República. Audálio Dantas traduziu em texto a narrativa feita pelo próprio presidente sobre a infância que ele próprio diz não ter tido.

A história contada pelo presidente em nada difere da acontecida com milhares de outros retirantes que no passado empreenderam a viagem ao sul do país a bordo de um pau-de-arara. De fato, fugindo ao ciclo da fome e da miséria, Dona Lindu (a mãe de Lula) empreendeu com os sete filhos a incerta aventura de tentar a sorte em região mais próspera.

O livro consiste, portanto, de um memorial sobre a vida de uma criança cuja mãe, a certa altura, declarou: “esse menino vai longe”.

E ele foi. Daí que não há que se negarem a ele os méritos de sua trajetória realmente invejável, nem interpor qualquer mau juízo à sua força e determinação. O homem venceu, é adorado pelas multidões, louve-se o fato. Mas é justamente por isso que o atual presidente da República não precisa que à sua biografia sejam acrescentadas coisas como esse livro piegas cujo intuito, ainda que negado veemente pelo autor, é construir uma imagem de superação que sirva de exemplo aos jovens deste país e atenda a fins políticos bastante claros. Convenhamos que esse tipo de coisa – da forma que foi feita - fica bem aos homens públicos já falecidos cujas personagens passam a servir muito bem a roteiros de exaltação. E este não é, definitivamente, o caso do atual presidente da República.

Como sempre acontece nessas circunstâncias, ao depois do livro publicado pouco importam as opiniões do autor e, no caso presente, a da personagem apresentada por ele. Os livros, como se sabe, adquirem vida própria e desgarram-se de quem os escreveu, comportando-se como esses filhos que se afastam dos pais e passam a seguir o seu próprio destino.

É desse modo que o livro “O Menino Lula” passa a figurar na biografia do presidente como no mínimo desnecessário dado que relata uma história muito conhecida de retirantes, acontecida com tantas outras pessoas, muitas delas alcançando sucesso em seus empreendimentos futuros. Fará talvez algum sucesso no seio das famílias que buscam apegar-se até mesmo a fios remotos de esperança; não será impossível que venha a ser utilizado em escolas públicas seguindo a políticas que visem fazer a cabeça de crianças e jovens; mas jamais poderá ser considerada como obra necessária e despida de intuitos de auto-exaltação, fato que  decididamente a compromete  e aos homens que participaram da sua elaboração.

Por fim, vale lembrar que já vimos filmes como esse antes, nos quais o culto à personalidade determinou consequências de triste lembrança.