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Águas de março

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Enquete promovida pela em Rádio Eldorado em parceria com “O Estado de São Paulo” premiou a música “Águas de Março”, de Tom Jobim, como “o maior clássico da música brasileira”.  Embora a primeira gravação de “Águas de Março” seja de 1972, cantada por Tom Jobim, a que correu o mundo foi a de 1974 na qual Tom faz dueto com Elis Regina. Para quem ouviu, mas não viu, existe vídeo, no You Tube, com a dupla Tom e Elis cantando.

Não sei dizer quantas vezes já ouvi Tom e Elis cantando “Águas de Março”. O crítico de jazz norte-americano Leonard Feather considera esta uma das dez maiores gravações de todos os tempos. Não é por acaso: trata-se de momento no qual dois grandes nomes da música brasileira se entregam dentro de uma sintonia realmente sublime. A voz poderosa e encantadora de Elis completa-se com a de Tom, emocionando-nos com a execução de uma música maravilhosa. “Águas de Março” é dessas músicas que não cansam. Os anos passam e a cada vez que a ouvimos somos encantados por ela, observando detalhes que antes nos haviam escapado. Há sempre uma novidade a ser descoberta em “Águas de Março” escolhida na enquete para figurar como maior clássico da música brasileira.

Entretanto, a escolha não deve ter sido fácil e pode-se supor que se repetida em outra ocasião talvez o resultado não se repita. Acontece que a música popular brasileira é prodiga em criações de grande musicalidade e beleza. Basta lembrar que na mesma enquete o segundo lugar pertenceu a “Aquarela do Brasil” enormíssima música do não menos enorme Ari Barroso, o terceiro a “Construção” de Chico Buarque, o quarto a “Asa Branca” de Luiz Gonzaga e o quinto “Carinhoso” de Pixinguinha e João de Barro.

Se corrermos os olhos na lista das cinquenta escolhidas como melhores muitas vezes nos depararemos com músicas que nos levarão a perguntar por que, afinal , não se classificaram no topo. Que tal “Brasileirinho” de Waldir Azevedo e Pereira Costa que ocupa o décimo-quarto lugar? Grande música essa tocada no cavaquinho, exigindo virtuosismo do executante. Lembro-me que ali pelo final dos anos 70 eu costumava ir a um bar no bairro da Bela Vista, em São Paulo, onde um senhor de alguma idade arrancava sons do diabo ao cavaquinho. Seguia ele noite adentro até que alguém pedia que tocasse “Brasileirinho”. Então começava a primeira de uma série de pelo menos cinco repetições, dado  que as pessoas presentes pediam bis, bis do bis e assim por diante.

A lista com os nomes das cinquenta provova nostalgia dado despertar lembranças do tempo em que curtíamos essa ou a aquela música.  “Desafinado”, “Manhã de Carnaval”, “Ronda”, “Tico-Tico no Fubá”, “O bêbado e o equilibrista”, “ As rosas não falam’… quem resiste a isso tudo?

A vida passa e as grandes músicas permanecem bem como a lembrança de seus compositores. A esses grandes nomes que nos legaram tantos momentos de alegria só nos resta aplaudi-los e reverenciá-los..

A música segundo Tom Jobim

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Impossível assistir ao documentário assinado por Nelson Pereira dos Santos sem se emocionar. “A música segundo Tom Jobim” nos permite uma emocionante viagem ao passado através de uma sequência de clipes diante dos quais não há como não se lembrar de nós mesmos, impulsionados pelas composições do maestro Jobim.

O sonho começa quando surgem as imagens do avião da Panair sobrevoando a cidade maravilhosa, trazendo-nos de volta o pulso da vida dos cariocas naquela época. O veículo que percorre as ruas, passa pelo túnel e chega a Copacabana onde milhares de pessoas se movimentam em torno dos prazeres oferecidos pela praia converte-se num mergulho em nosso próprio passado. Não seriam em banco-e-preto as imagens que guardamos na memória sobre o tempo desfeito do qual também participamos?

Mas, as lindas imagens do Rio funcionam apenas como a introdução a um mundo no qual paulatinamente se revela o talento e a genialidade de Tom Jobim. Através de uma sequência de apresentações de suas músicas, interpretadas por artistas renomados que nos deixaram tantas saudades, podemos acompanhar a trajetória do maestro brasileiro que levou ao mundo a grandeza de sua arte. Desde logo se torna preciso dizer que Tom Jobim foi muito grande, grandíssimo. Suas composições avançaram pelos quadrantes do mundo, sendo interpretadas em várias línguas e por grandes personalidades do mundo musical.

Tom Jobim viveu para a música e conferiu ao mundo horas de prazer que ainda hoje prosseguem e talvez jamais se esgotem dado que suas composições continuam a ser interpretadas. Mas, quanta emoção ao rever e ouvir vozes, algumas delas hoje esquecidas. Como resistir aos encantos das interpretações de Agostinho dos Santos, Alaíde Costa, Silvia Telles, Maysa, isso para citar alguns dos nossos? Meu Deus que é aquilo, que ponto mágico Nara Leão atingiu com sua memorável interpretação de “Dindi”?

Não há como conter lágrimas diante das emoções revividas nesta narrativa sem palavras, dirigida por Nelson Pereira dos Santos. Em “A música segundo Tom Jobim” o diretor subverte a técnica narrativa das biografias cinematográficas. Não existem diálogos, não nos importa se Tom Jobim nasceu e morreu, nem quantas vezes se casou e mesmo quantos filhos teve. Dentro de tal ritmo, que seria impessoal, surge diante do espectador a mais profunda narrativa personalizada, aquela que apresenta a face do artista diante da grandeza de sua obra. Técnica narrativa perfeita que leva à tela toda a grandeza de Tom Jobim, mostrado em várias fases de sua vida, mas sempre em apresentações, tocando, cantando, sendo Jobim.

Este é um documentário que não poderia nunca terminar embora seja da vida colocar em tudo um termo. Dele permanecem as majestosas interpretações de Oscar Peterson, Ella Fitzgerald, Henry Salvador, Errol Garner, Dizzy Gillespie, para citar apenas alguns nomes maiores do cenário internacional que se renderam à música de Tom Jobim.

Fica Tom Jobim, ao lado de Frank Sinatra em memoráveis apresentações. Fica o Tom junto de Vinícius de  Moraes, o grande poeta que tantas letras escreveu para as músicas do maestro. Fica, ainda, o fantástico Jobim ao lado da não menos fantástica Ellis Regina naquela esplendorosa de “Águas de Março” que o crítico Leonard Feather classificou entre as dez maiores gravações de jazz da história.

O Brasil não tem o hábito de homenagear seus filhos exponenciais. Tom Jobim foi um gênio reconhecido internacionalmente. Nelson Pereira dos Santos, Miúcha e a família de Tom Jobim em tempo prestam inesquecível homenagem ao grande maestro brasileiro.

E chove

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Presença constante a chuva não dá sinais de partida. Chove muito e pra todo lado. Céu negro, nuvens mais que carregadas e a nossa vida no meio disso tudo, regada a inundações.

Todo dia se lêem nos jornais reclamações e protestos. Culpam-se as autoridades, os cidadãos que jogam o lixo que entope os bueiros e a própria chuva porque chove demais: em três dias do mês tal choveu mais que o esperado no mês todo.

Quando menino eu tinha medo da chuva. Lugar pequeno, cecado por montanhas, propício a relâmpagos, raios e trombas d´água. Certo dia soubemos do homem que chegou em casa durante uma tempestade e morreu ao colocar a mão na cerca para abrir a porteira. Um raio caiu longe, a carga elétrica correu pelo arame e encontrou a mão do homem que caiu morto. Nunca me esqueci disso, dos raios que cortavam a escuridão da noite, do medo de que o vento arrancasse as telhas. Talvez por isso eu tenha adquirido o receio de viradas abruptas do tempo e  tempestades.

Mas, tudo isso é confessional e não interessa muito. O que vale são esses morros em estado de atenção, as pessoas tão vivas enquanto as tragédias não vêm, a simulação de que tudo é como deveria ser, sem na verdade ser.

Amanhã de manhã a rotina se repetirá, as notícias correrão como se fossem comuns, saberemos de mortes e  desabrigados, veremos pessoas chorando porque perderam tudo e mesmo entes queridos.

Tudo conforme esperado, culpa da chuva, danada da chuva que não se toca, não se cala nos telhados.

Escrito por Ayrton Marcondes

1 março, 2011 às 7:05 pm

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Águas de março

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De vez em quando ouço “Águas de Março”. A gravação feita por Tom Jobim e Elis Regina é classificada por Leonard Feather, um dos mais renomados críticos de jazz, entre as dez melhores de todos os tempos.

Em “Águas de Março” Tom e Elis enfiam a mão no sagrado, sem a menor cerimônia. Eles simplesmente atravessam a fronteira do impossível e nos enviam as suas vozes de um oásis onde tudo é perfeito e absoluto. É de outra dimensão que nos acenam os dois artistas, atingindo o estado superior que o escritor Julio Cortázar traduziu em palavras:

“Se existe um dom divino no artista, esse dom não é a sua arte, conquista humana; esse dom é a entrega generosa que o artista faz de seu cosmos para que outros humanos possam se inclinar sobre ele, maravilhar-se e sentir-se um pouco acima do panorama cotidiano.”1

 Maravilhado: assim recebo a generosidade de Tom e Elis a cada vez que ouço “Águas de Março”.

1. Julio Cortázar, Papeles Inesperados. Editora Alfaguara, Buenos Aires, 2009.