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Funerais

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Houve tempo que eu frequentava cemitérios. O silêncio das alamedas e a observação de lápides parecia-me tranquilizante. Fulano de tal nasceu em 1923 e faleceu em 1959… Como teria sido a vida desse homem cuja foto membros da família estamparam em seu túmulo?

Os mortos não falam, mas são eloquentes. Tantas vezes esquecidos em suas tumbas, permanecem como advertência a nós, os vivos, de que a vida não só é precária como finita. A cada dia passam a fazer parte do mundo dos mortos pessoas surpreendidas pela visita inesperada da morte. Ao homem que es barbeia de manhã e sai para o trabalho no dia em que vai morrer a morte não passa de possibilidade muito remota.

Há cemitérios e cemitérios. Alguns particularmente interessantes. O cemitério da Recoleta, em Buenos Aires, é majestoso. Ali se encontram mausoléus realmente suntuosos. Turistas visitam o grande cemitério de Buenos Aires diariamente, atraídos pela suntuosidade do lugar.

Na velhice há quem perca o interesse por cemitérios. Talvez o afastamento se dê pela certeza de que, com poucos anos pela frente, o idoso não deseje vivenciar a presença da morte nos cemitérios. O mesmo acontece em relação aos funerais. De repente você constata que seus companheiros de idade devagar vão desparecendo. Fulano morreu, sicrano se foi, serei eu o próximo?

De muitos conhecidos guardo o semblante no último momento antes de se fechar o caixão. São expressões faciais inesquecíveis dado que nunca mais serão vistas. Lembro-me da face de um tio vista no momento quando sobre ele se fechava a tampa do caixão. Pude vê-lo, ainda, de viés no último instante. Essa face sem vida pertence às memórias para mim inesquecíveis.

Cada povo tem suas liturgias em relação à morte. Entre nós os velórios são marcados pelo silêncio e reverência. Os mexicanos encaram a morte de modo mais ameno, festivo. As katrinas mexicanas e as comemorações no dia de finados nos dão conta do modo como o povo do México se relaciona com a morte.

Entretanto, há culturas que nos figuram estranhas. Na China strippers e dançarinas são contratadas para acompanhar féretros. Elas desfilam sobre jipes durante o cortejo que segue aos cemitérios. Há hipóteses para explicar o estranho costume, entre elas a possibilidade de atrair mais acompanhantes o que seria uma honra para o falecido. Entretanto, o Ministério da Cultura tem combatido o hábito classificando-o como “ação não civilizada”.

O mundo é vasto como dizia o poeta. Tão vasto que abriga até mesmo ações que nos parecem estranhas em relação à morte.

Escrito por Ayrton Marcondes

27 fevereiro, 2018 às 11:05 am

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