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Ainda as biografias

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Nos últimos dias a discussão sobre as biografias autorizadas arrefeceu. Seguiu-se a lógica das notícias que envelhecem depressa demais. Novos acontecimentos ocupam espaços nas colunas dos jornais e direcionam a atenção: a morte de Mandela, o crescimento da economia do país aquém das expectativas, a despedida de um ano que se vai sem que saibamos se o novo será melhor ou pior, a incredulidade diante da violência absurda como a acontecida dias trás durante um jogo de futebol.

Mas, o assunto das biografias ainda não esgotado continua a merecer reflexões. Nesse sentido é muito útil reler algumas considerações de Hannah Arendt  que fazem parte de seu ensaio ‘Karl Jaspers: uma laudatio”. Ensina Arendt:

Somos todos pessoas modernas que se movem em público sem confiança e embaraçadamente. Presos em nossos preconceitos modernos, pensamos que apenas a “obra objetiva” separada da pessoa, pertence ao público; que a vida da pessoa por trás dela é assunto privado, e os sentimentos relativos a essas coisas “subjetivas” deixam de ser genuínos e se tornam sentimentais, tão logo  expostos publicamente … Para falar adequadamente, devemos aprender a distinguir não entre subjetividade e objetividade, mas entre o indivíduo e a pessoa. É verdade que é um sujeito individual que oferece alguma obra objetiva ao público, abandona-a ao público. O elemento  subjetivo, digamos o processo criativo que entrou na obra, não concerne de forma alguma ao público. Mas, se essa obra não é apenas acadêmica, mas se é também o resultado de “ter-se demonstrado na vida”, um ato e uma voz vivos acompanham-na; a própria pessoa aparece junto com ela. O que então emerge é desconhecido para quem o revela; não pode controlá-la da mesma forma que não pode controlar a obra que preparou para a publicação… O elemento pessoal está além do controle do sujeito e, portanto, é o exato oposto da mera subjetividade.

Obviamente Arendt referia-se á obras publicadas em livros, mas suas palavras são instigantes. A separação entre o público e o privado ora em curso transcende até mesmo o direito de livre expressão. Em essência o artista abre as comportas de sua própria existência no momento em que propõe uma obra à apreciação geral. Ainda que o incomode não se pode separá-la dele dai o empenho de biógrafos e o interesse público em devassar a vida e as circunstâncias que levaram o artista a produzir sua obra.

Escrito por Ayrton Marcondes

15 dezembro, 2013 às 1:24 pm

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