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A hora “H”

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Essas mal traçadas nascem da notícia da morte de um conhecido ator de telenovelas. Vejo a foto do ator, lembro-me de algumas atuações dele e constato que, paulatinamente, o mundo vai sendo despovoado. Melhor seria ter escrito: o “meu mundo” vai sendo despovoado. Falo sobre o “meu mundo” porque as pessoas que morrem e são minhas conhecidas despovoam o universo que conheço. Reparo que a minha geração e a anterior a ela vão desaparecendo sorrateiramente. Claros se abrem nas nossas fileiras e não há como negar que o tempo não deixou de passar embora tenhamos nos esforçado para fingir que a vida é eterna.

Soube de pesquisa recentemente realizada junto a idosos sobre os medos que os apoquentam no tempo final da vida. Destacam-se os medos da solidão e o da falta de dinheiro. Para mim o medo é o de ser atingindo por doença dessas de longa duração e muito sofrimento. Os antigos diziam que os que sofrem muito antes de morrer estão a pagar por males praticados durante as suas vidas. Não creio. Vi pessoas medularmente boas e corretas sofrerem muito antes de fecharem os olhos; também vi personalidades peçonhentas morrerem sem nenhum sofrimento.

Alarma a constatação do progressivo desaparecimento de pessoas com quem convivemos no passado. Dias atrás, por puro caso, deparei com o nome de um engenheiro que trabalhou no setor automobilístico e lutou por criar uma indústria genuinamente nacional nesse setor. No fim das contas foi abandonado e vencido pelas montadoras multinacionais e terminou fracassando em seus negócios.

Pois conheci esse homem quando estava no auge de seus sonhos. Participei da cerimônia de lançamento de seus carros nacionais, cerimônia essa realizada com toda pompa que sugeria um futuro promissor. E deu no que deu. Mas o engenheiro está morto e o que sonhou e realizou certamente esquecido.

Pelo que percebo existe para cada pessoa um momento no qual ocorre o desligamento entre o que se foi na vida e o que se passará a ser daí por diante. Esse momento – a hora “H” - não necessariamente está vinculado ao instante em que se vai morrer, havendo casos nos quais a demora da vinda da morte é significativa.

Relata a mulher do ator que hoje morreu que desde alguns anos o marido estava mal porque surgiram sintomas de doença e ele deixou de representar. Só agora, passados alguns anos nessa situação, o grande cobrador lembrou-se de levá-lo para sempre.

Escrito por Ayrton Marcondes

16 julho, 2013 às 2:12 pm

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