Prisioneiros at Blog Ayrton Marcondes

Prisioneiros

deixe aqui o seu comentário

Nunca estive preso e espero nunca venha a estar. Quem viveu no Brasil nos tais anos de chumbo da ditadura militar experimentou cerceamentos de liberdades individuais. O melhor era mesmo calar a boca e torcer para não ser enquadrado em alguma situação perigosa.

No início dos anos 70 aconteceu-me acompanhar parente a um pronto-socorro na região da Barra Funda, em São Paulo. A mulher estava desgostosa da vida e ingeriu um vidro de comprimidos tranquilizantes, talvez tentando se matar. Fizeram nela uma lavagem estomacal e lá pelas quatro da manhã pudemos trazê-la para casa. Entretanto, logo que saímos do PS o motorista atravessou dois sinais vermelhos dado que as ruas estavam completamente desertas naquela hora. Infelizmente uma viatura passava pelo mesmo lugar e imediatamente perseguiu o carro em que estávamos forçando-nos a quase bater na parede de uma casa. Segundos depois eu tinha uma metralhadora encostada na minha cara. Conseguimos nos safar porque estava conosco o pai da mulher, na época militar de alta patente. Assim se passavam as coisas em tempos de regime de exceção durante o qual as liberdades individuais não eram necessariamente respeitadas.

Outra coisa, porém, é a reclusão. Vez ou outra leio que alguém cometeu crime e, por razões de saúde, conseguiu a prisão domiciliar. Imagino o que seria ficar preso à própria residência, sem jamais colocar o pé na calçada defronte. Obviamente, muito pior é ser preso mesmo, condenado a viver numa penitenciária. Sinceramente, não consigo imaginar a extensão de uma situação assim, o desespero do afastamento total do mundo exterior aliado ao convívio com outros marginais. Pode ser bobagem, mas talvez a veiculação de um clipe mostrando à marginalia o que a espera caso venha a ser enclausurada talvez fizesse pelo menos alguns bandidos a pensar um pouco antes de praticar delitos.

Entretanto, creio que inimaginável mesmo seja a situação na qual viveram essas três jovens sequestradas por um maníaco que se definiu como predador sexual. Desafia à compreensão passar dez anos sequestradas, submetidas a toda sorte de abusos sexuais e violências. Uma das mulheres relata ter engravidado cinco vezes e abortado por passar fome e tomar socos na barriga. A polícia relata que as mulheres eram acorrentadas no porão e mantidas lá como cachorros.

O predador de Cleveland está preso e a promotoria quer condená-lo à pena de morte. Os vizinhos não conseguem aceitar como algo tão terrível tenha ocorrido durante tanto tempo ao lado de suas casas sem que jamais percebessem algo de anormal.

O sequestro de Cleveland ultrapassa o senso de humanidade que temos e revela, em toda a extensão, o lado animalesco a que podem chegar seres que na verdade nada têm de humanos.



Deixe uma resposta