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A história de um canhão

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Volta e meia me lembro de um conto de Borges no qual uma faca, antes utilizada para assassinatos, repousa numa gaveta. O escritor argentino transfere ao leitor a força contida de uma arma mortal que roubou vidas e pode voltar a roubá-las. As armas nunca dormem de verdade: elas repousam, silenciosas, prontas a retornar à sina de matar para a qual foram construídas.

O mundo seria melhor sem armas. Os EUA não conseguem levar a termo a proibição da comercialização e posse de armas embora os frequentes casos de assassinatos em massa geralmente ocorridos em escolas. Há quem não se sinta seguro sem a posse de uma arma em casa, ainda que nunca tenha aprendido a usá-la. Meu pai tinha um Smith & Wesson do qual muito se orgulhava e trazia em seu quarto de dormir. Naqueles anos 50 ele, de tempos em tempos, ia até o fundo do quintal de casa e gastava uma meia dúzia de balas, atirando em latas. Era o modo dele de se manter ativo em relação ao revólver que herdara de meu avô.

Não sei que destino teve o Smith & Wesson de meu pai. Confesso que caso estivesse comigo teria muitas dúvidas de entregá-lo às autoridades quando da mudança da lei relacionada à posse de armas em nosso país. Tratava-se de um bem de família no qual estavam impressas as mãos de meu avô e meu pai.

Aprendi na escola sobre a valentia de Caxias e a glória brasileira no Paraguai. A Guerra do Paraguai seria dos poucos momentos gloriosos de nossa história pregressa, importante para a manutenção da soberania do país. Só mais tarde foram publicados estudos mais minuciosos dando-nos conta do papel da Inglaterra no conflito e do massacre a que foram submetidas as tropas paraguaias pelos soldados da Tríplice Aliança (Brasil, Argentina e Uruguai).

Mas, a Guerra do Paraguai na verdade não acabou conforme nos informa o noticiário de hoje. Acontece que o governo paraguaio reclama ao Brasil a devolução do canhão “Cristão” utilizado pelas tropas paraguaias na batalha de Curupaiti. O “El Cristiano” é considerado herói paraguaio daí a tentativa de reavê-lo. Com o que não concordam autoridades brasileiras, afirmando que seria necessária, também, a devolução de armas brasileiras utilizadas na Guerra.

Estima-se que 300 mil paraguaios e 50 mil brasileiros tenham morrido na guerra realizada em 1870. O “Cristão” repousa calado no “Museu Histórico Nacional”, ele que teve seu momento de glória em campo de batalha. Já não é arma de impacto como teria sido na época da guerra. Mas, como pensa, Borges, é uma arma repousando à espera de ação.

Escrito por Ayrton Marcondes

18 abril, 2013 às 2:02 pm

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