2014 junho at Blog Ayrton Marcondes

Arquivo para junho, 2014

Cadê o entusiasmo?

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Veterano seguidor de copas e torcedor incondicional da seleção nacional me entristeço com o pelo menos aparente descaso com o início da Copa no Brasil. Mesmo naqueles anos de chumbo tínhamos bandeiras nas ruas. Tremulavam nos carros, nas janelas dos prédios, nos mastros. Era difícil, sim, separar o futebol da situação do país de então. Mas, que fazer se em campo jogava o nosso time, o nosso orgulho nacional sob a forma de mágicos da bola, enfim toda a tradição de um esporte que, ao longo do tempo, tornou-se a maior expressão de nossa nacionalidade?

Pois agora o que se vê é gente desanimada, gente até torcendo contra. Tanto fizeram, tanto mal administraram, tanto gastaram que conseguiram o quase impossível: converter grande parte da torcida, senão a maioria, em um bando de indiferentes.

Era de se ver o Aeroporto de Cumbica ontem. Levas e levas de estrangeiros munidos de bandeiras de seus países desembarcavam. Nas faces dessa turma a alegria e a esperança de que suas equipes consigam boa campanha na Copa, quem sabe o próprio campeonato.

Não sei como se passam agora as coisas nesse imenso Brasil. Estamos a poucas horas do jogo de abertura e o dia parece mais silencioso que de costume. As pessoas com quem conversei nesta manhã não demonstraram nenhum entusiasmo em relação à Copa. Pelo menos parte do Brasil aquieta-se diante da realização do maior evento de sua história.

Ontem o presidente da FIFA, Joseph Blatter, disse aos jornalistas que perguntassem a opinião dele sobre a organização para a Copa depois de terminada a competição. Vai dar certo? Resta-nos torcer por uma boa figura na condução do grande evento esportivo.

O Brasil conquistou o direito de realizar a Copa e comemorou-se o fato na ocasião. Passados 7 anos desde então o evento esportivo se inicia com obras inacabadas e muita apreensão. Inaceitável a decisão política de realizar a Copa em tantas sedes fato que se configurou grande erro. O Brasil é muito grande. Tivéssemos a Copa em poucos Estados menores seriam os custos e maiores as possibilidades de sucesso.

Deu no que deu. Quanto a mim não digo que esteja indiferente. Torcedor de raça não posso trair o meu passado. Mas, confesso algum desânimo. Confesso que se faltasse energia elétrica hoje eu não sentiria muito não assistir ao jogo do Brasil.

Favores sexuais no Brasil

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Como se vê no estrangeiro o Brasil enquanto paraíso do turismo sexual? O jornal “La Nacion” de Buenos Aires publica hoje notícia sobre a expectativa de bons negócios na área de prostituição durante a Copa.  Entrevistada, a assistente social da Associação de Amigos da Vila Mimosa disse que o que se espera é um clima de festa.

A Vila Mimosa situa-se a poucos metros do Maracanã e funciona 24 horas por dia. Ali trabalham cerca de 4 mil prostitutas que circulam, vestindo roupas menores, em bares nos quais oferecem seus serviços juntamente com doses de caipirinha e cerveja. A maior parte dos frequentadores é de brasileiros como taxistas, militares, caminhoneiros e estudantes. As mulheres se distribuem em quadras vizinhas que constituem a zona de meretrício.

O jornal cita o esforço do governo brasileiro em mudar a imagem do Brasil ligada ao turismo sexual. A profissão é regulamentada no país não podendo praticá-la menores de 18 anos de idade. No Rio as prostitutas cobram 22 dólares por um programa.

A Associação dos Amigos de Vila Mimosa empenhou-se em preparar as prostitutas para a chegada de estrangeiros através da prática de palavras em inglês e espanhol. A Associação também promove cursos e orienta as profissionais quanto aos cuidados em relação a doenças sexualmente transmissíveis.

O fato é que embora os esforços para mudar a imagem expõe-se a mulher brasileira a comentários sempre maldosos. O turista que chega ao país buscando favores sexuais nem sempre é propenso a distinguir entre as profissionais do sexo e mulheres que nada têm a ver com o comércio sexual. Não é incomum que uma senhora brasileira hospedada com a família em hotel seja vítima de olhares desrespeitosos a até mesmo de cantadas de turistas. Em várias ocasiões pude presenciar em hotéis do país cenas lamentáveis de incursões desrespeitosas junto a pessoas de sexo feminino, absurdamente tomadas como mulheres de vida fácil.

A notícia publicada pelo “La Nacion” traz os relatos de algumas prostitutas e as expectativas delas de realização de bons negócios durante a Copa. Trata-se de um viés perfeitamente dispensável de análise da situação brasileira, justamente no momento em que os olhos do mundo se voltam para o país pela realização da Copa.

As palmadas

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Na barraca de pastel a mãe conversa com a japonesinha. Ao lado da mãe a filha de 5 anos de idade. Amenina está ansiosa: quer um pastel. A mãe explica para a japonesinha que não vai dar o pastel porque nas últimas vezes a menina deu só uma mordida e jogou fora. A japonesinha olha para a menina e tem pena. Diz à mãe que a menina deve ter aprendido a lição talvez o melhor seja dar o pastel a ela. A mãe retruca que o dinheiro não está fácil, que o dinheiro do pastel servirá para comprar outra coisa. No fim vence a carinha de sofrimento da menina. A mãe sucumbe e pede o pastel. A japonesinha sorri diante do final feliz que não se completa porque a menina depois da terceira mordida avisa que não quer mais o pastel.

Vi uma mãe ficar brava com o filho manhoso, querendo algo que não podia ter naquele momento. Diante da negativa do mãe o pequeno se enfureceu: largou um tapa na mãe. Surpresa ela não pensou duas vezes: deu um tapa na mão do menino e o pôs de castigo. O pequeno chorou, mas logo se calou. Depois ficou sentadinho no sofá, fechado em si mesmo. Era só uma criança de 2,5 anos de idade, mas a mãe o corrigiu diante de ato considerado inaceitável.

Ninguém quer que crianças sejam maltratadas ou sofram qualquer ato de violência. Mas, é preciso separar o trigo do joio. Corre por aí a Lei da Palmada que acaba de ser aprovada no Congresso. Os pais estão em dúvida sobre o que é permitido ou não. Há quem discuta com veemência a interferência do Estado sobre a vida privada. Mas, há uma coisa que os pais sabem muito bem: tem hora que uma palmadinha é necessária para colocar as coisas nos trilhos.

Cresci numa época em que se apanhava - e muito - nas escolas primárias. Tive professores(as) especializados na educação pela porrada. Em casa minha mãe não dava mole: descia o cacete em qualquer situação que a desagradasse. Naquela época as surras não eram só dadas com as mãos. Havia a terrível vara de marmelo, um varinha fina que se levava para o padre da paróquia benzer. As surras eram, portanto, abençoadas. E pau na criançada que precisava aprender o respeito e a ordem para poder virar gente. Era assim.

Dos castigos da escola para mim o pior eram os minutos ajoelhado em grãs de milho. Aquilo doía. Acontecia quando o professor(a) mandava o aluno para a diretoria. Crianças impossíveis eram frequentadores habituais da diretoria. E nunca conheci uma diretora que não adotasse a linha de aplicação de castigos.

O mundo mudou e crianças não são surradas exceto nesses casos de inaceitável violência noticiados. Ainda bem. Mas que não se tolham os pais no direito deles de educar seus filhos. Sem violência, mas com os necessários ajustes.

Kapteyn b

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Desconfio que a permanente investigação do espaço não seja apenas motivada pela curiosidade científica ou possibilidade de descobertas cientificamente importantes. Nesse caso existe sempre uma boa pitada de interesse sobre a existência de vida fora do nosso planeta. Não entra na cabeça dos terráqueos que só aqui a vida tenha se manifestado, surgindo a civilização que hoje conhecemos. Teremos ou não alguns irmãos vivos perdidos na imensidão do Cosmos?

Não há semana em que os jornais não façam referência a algum tipo de pesquisa espacial. Trata-se de um encantamento diante do desconhecido, sentimento poderoso que não se pode domar. O homem quer saber sobre a existência de outro homem, ainda que desconhecido. Além do que a Terra foi se tornando pequena nos últimos decênios. Hoje em dia com a facilidade dos transportes aéreos o mundo parece ter encolhido. Pode-se chegar a qualquer ponto do planeta após algumas horas de voo, fato que contribuiu para a redução do mistério diante do desconhecido.

Agora chega a notícia de que os cientistas descobriram o planeta Kapteyn b. Localiza-se o planeta descoberto a 13 anos-luz da Terra e orbita em torno da estrela Kapteyn cujo diâmetro é 30% inferior ao dos Sol. O planeta descoberto é mais velho que a Terra: estima-se que sua idade seja de cerca de 10 bilhões de anos. Além disso, Kapteyn b tem cinco vezes a massa da Terra. Mas, o principal é que Kapteyn b reúne condições para a existência de vida pois recebe a quantidade certa de radiações para permitir a presença de água no estado líquido.

Eis aí um sistema completo para que nele surja - ou tenha surgido vida - nos moldes darwinianos que aceitamos tenham acontecido na Terra. Nos 10 bilhões de anos pode bem ter acontecido o surgimento e até esmo o desaparecimento de vida em Kaptein b. Ou, em hipótese remota, talvez o planeta seja habitado, fato que atiça a curiosidade dos cientistas.

Por enquanto a existência de extraterrestres pertence ao mundo da ficção. Embora relatos de contatos visuais com óvnis sejam comuns até hoje não se conseguiu prova definitiva de que seres de outras regiões do espaço tenham vindo até aqui só para dar uma olhada lá de cima sem fazer qualquer contato. Do espaço o que mais se teme é a aproximação de algum asteroide capaz de colidir com a Terra. A recente confirmação de que um grande asteroide caiu na Terra, fazendo levantar uma nuvem de poeira que impediu a chegada dos raios solares e causando o desaparecimento dos grandes répteis é aterradora.

Não sei se acontece a você vez ou outra observar o céu em noites sem nuvens. A imensidão incomoda. Ela faz pensar sobre quem somos e a nossa pequenez. Entretanto, a imensidão é fascinante. Ela nos faz sentir vivos, partes integrantes de um monumental sistema cujas ligações e reais dimensões nos escapam.

O universo é magnífico. Talvez um dia venhamos a saber se na imensidão que nos cerca existem outros seres dotados de vida.

Torcer contra o Brasil

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Um rapaz me perguntou se o melhor é torcer contra o Brasil. A ideia é a de que se o Brasil for derrotado os políticos não farão uso do ufanismo da vitória em benefício próprio. Alegria e festas anestesiam. De repente uma onda de confiança poderá varrer o país e toda essa situação de desmandos não será esquecida, mas minimizada e isso não é bom.

Eu me lembro da Copa de 70. Num país mergulhado no período mais violento da ditadura não havia lugar para a alegria. Gente cabisbaixa andava por aí, evitando opinar porque qualquer ato falho poderia resultar em interrogatório ou mesmo prisão. Naquela situação ouvi de muita gente que o melhor seria perder a Copa. Seria bom não torcer pelo escrete brasileiro, pois a vitória seria muito útil ao governo militar, jogando uma cortina de fumaça sobre um regime de torturas, etc.

Nas vésperas da estreia do Brasil contra a Tchecoslováquia tomei uma cerveja com um amigo engajado politicamente. Durante o nosso papo ele me cobrou posição firme em não torcer pela seleção. O amigo não podia admitir que eu fizesse de conta de que nada estava acontecendo. Torcer pela vitória brasileira seria ato irresponsável, senão traição aos ideais democráticos.

Se bem me lembro o primeiro jogo começou quando já era noite no Brasil. Fui ver a partida em casa de um amigo cujo pai comprara uma televisão de 29 polegadas o que era o máximo na época. Lá fora a cidade de São Paulo quieta: não se ouvia nada, era como se um cemitério gigante mergulhasse nas sombras da noite, silenciosamente. E veio o gol da Tchecoslováquia: 1 X 0. Melhor assim. Perderíamos o jogo, nossa consciência política ficaria em paz. Aí o Rivelino bateu uma falta e gol do Brasil. Naquela hora pudemos ver a camisa amarela do Brasil. Era o nosso país em campo. A tal pátria de chuteiras. De repente, ergueu-se um murmúrio que logo foi substituído por gritos. Não demorou a aparecerem os primeiros foguetes. No fim do jogo em que o Brasil fez quatro gols estávamos em festa.

Varei a madrugada num bar com o amigo em cuja casa assisti ao jogo. Mais tarde fui dormir feliz em sonhei com a mágica dos lances proporcionados pelos nossos artistas da bola.

O fato é que precisávamos daquela vitória e das outras que se seguiram até a conquista da Copa. No dia-a-dia difícil e sem margem para alegria a vitória do Brasil resgatava a noção de brasilidade e o amor à pátria. O governo de então usou como pode em seu favor o momento de euforia das massas. Entretanto, a vitória também era do povo, o mesmo povo que anos depois iria às ruas exigir as Diretas-Já.

Isso tudo eu disse ao rapaz que me perguntou se vou torcer pelo Brasil. Acrescentei que posso até tentar torcer contra. Mas, se tomarmos um gol e virarmos o placar… Aí falará mais alto o meu coração de brasileiro.

Meu caro, não tem jeito.

Tranco no trabalho

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O senhor sabe que, para mim, trabalhar como empregado representa ganhar pouco mais de mil reais por mês. Agora eu sei fazer, sei trabalhar. Por que ser empregado se posso ter o meu negócio?

Faz um ano e meio que abri a minha firma. Dou duro, tenho dois empregados. Moro numa casa de três cômodos, mas que não é minha porque fica no quintal da casa do meu sogro. Em um ano e meio consegui comprar uma televisão de 50 polegadas para o meu quarto, uma de 29 polegadas para os meus dois filhos e a geladeira. Também consegui a cama de casal king size e botei piso frio na casa. Tudo arrumadinho. Se eu fosse empregado nem pensar que conseguiria tudo isso.

Isso sem falar no carro e na caminhonete. Preciso da caminhonete para carregar material para a obra e do carro para visitar os clientes. Veja bem: a secretária da firma é a minha mulher, ela que atende ao telefone e isso diminui a despesa.

O senhor veja que as coisas iam bem. Mas, de tempos para cá começou a dar tudo errado. Um dos meus empregados procurava clientes e fechava serviços. Eu tinha confiança nele. Sabe o que ele fez? Pois o desgraçado fechou por preço baixo cinco obras e embolsou o dinheiro. Deu nota fiscal da minha firma e não me disse nada. Passados os dias para o começo dos serviços os clientes vieram cobrar e só aí eu fiquei sabendo.

O cara deu um golpe danado na gente. Em casa ficamos sem dinheiro até pra comida. Tive que contratar advogado, fazer BO e vou processar o desgraçado. O problema é que não tenho como pagar os clientes enganados pelo meu vendedor. Me disseram que o melhor é não pagar porque não fui eu que recebi o dinheiro. Não sei não. O que sei é que perdi a vontade. Não tenho fome. Quer saber? Pois tive até vontade de morrer.

Mas, agora estou bem. Mais dez anos eu vou ter a minha casa. Casa minha, num terreno meu. Vou ter um carrão, não um desses velhos como o que eu tenho. Quando chegar aos 48 anos vou me aposentar.

Disso tudo só me dói que esse bandido que me deu o golpe vai sair numa boa. Ele arrebenta comigo e não vai para a cadeia. Sabe o que ele diz? Que ficou com o dinheiro porque eu devia para ele. Pode uma coisa assim? Quem sabe depois de muito tempo um juiz condena ele a dois anos de prisão. Aí ela paga uma fiança e sai livre. Pois se quem mata fica livre por aí, o que pode acontecer com um vigarista como esse que me deu o golpe?

O homem que me conta isso tem cerca de 30 anos e sinais de cansaço na face. Mas, olha para o futuro com esperança. Digo a ele que na vida tudo passa. Ele me olha desconfiado. Será mesmo que passa?