2013 outubro at Blog Ayrton Marcondes

Arquivo para outubro, 2013

Ainda as biografias

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Há coisas que não se misturam. Deus e o Diabo por exemplo. Também existem coisas que, queira-se ou não, são excludentes entre si. Censura e liberdade de expressão, por exemplo. Nisso não há meio termo, diga-se o que quiser.

Daí que soam estranhas tantas declarações sobre a necessidade de autorização para a publicação de biografias. Não é preciso dizer que caso a autorização vigore as biografias serão laudatórias ou que Hitler não teria uma biografia publicada no Brasil exceto se fosse para falar bem dele. Também não adianta divulgar a tal história de que é preciso preservar as pessoas biografadas como quer o pessoal da música, por exemplo. Menos produtiva ainda é a ação criticada da mídia a qual se acusa de expor e publicar declarações fora de contexto pronunciadas por personalidades.

Enfim, tudo inútil quando se está diante de uma questão sobre a qual não existe acordo possível: ou vigora a censura ou vigora a liberdade de expressão. Eis aí uma questão semelhante à do sujeito que encontra em seu caminho uma bifurcação. Cada braço do Y o leva a uma região diferente e não existe ligação entre os braços. Resta ao sujeito escolher. No caso das biografias falará mais alto o entendimento pessoal de cada um sobre a questão. Nem por isso deixará de ser um ou outro.

Ao que parece o assunto tem ocupado tanto espaço porque envolve a vida de celebridades e gera notícias. Entretanto, não há muito que se discutir. Repito: aqui se trata do caso de um ou outro, nunca dos dois ao mesmo tempo.

Então, meu caro, escolha o seu lado. Só resta isso a você, nada mais do que isso.

Cobertor curto

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Fala da mãe que caiu e quebrou o fêmur. Estava em outra cidade quando recebeu o telefonema da filha muito aflita: que fazer com a avó que gemia no chão? A solução foi chamar o porteiro do prédio, sujeito de força que colocou a avó na cama.

A avó já vem doente faz tempo. Nefropata, cardiopata, sobrevive à custa de diálises. O fêmur quebrado é uma tragédia. Ainda mais quando se descobre que o osso quebrou em vários pontos e a cirurgia oferece risco de morte.

Conta que o médico a fez assinar papéis assumindo a responsabilidade senão não operava. Ela assinou chorando, como ficaria se a mãe morresse na mesa? Mas, Deus é grande e a operação foi um sucesso, agora resta cuidar dos curativos e continuar a vida de luta.

A mulher para de falar e abaixa a cabeça. Pensa um pouco, depois sentencia:

- O cobertor é curto.

Pergunto a ela o que quer dizer com isso. Já se levantando para sair responde:

- O senhor bem que sabe.

O meu múnus

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Você já cumpriu o seu “múnus” hoje? Não sabe o que significa? Pelo visto a palavra é mais utilizada no meio jurídico, pelo menos foi numa declaração da promotoria pública que eu a vi. Confesso que também não sabia o significado de “múnus” daí buscar sapiência no “Houaiss”. No dicionário fiquei sabendo que “múnus” é um substantivo masculino de dois números cujo significado é “tarefa, dever obrigatório de um indivíduo; encargo, obrigação”.

Assim. Portanto cada um tem o seu múnus nessa vida. Na verdade hoje em dia a vida anda complicada daí que podemos ter mais de um múnus a enfrentar. São tantos os encargos, as obrigações impostas pela vida em sociedade que haja paciência para tantos múnus.

Pois conheci um camarada que não teve múnus. Dirão que é impossível porque não existe quem não tenha pelo menos um dever obrigatório a cumprir. Ele decidiu não ter. Na verdade era um sujeito muito lido e a pedra de toque que o levou a uma vida sem compromissos foi o livro “Cândido” do Voltaire. Os conselhos do Dr. Pangloss a Cândido feriram fundo a alma do amigo de quem falo. À semelhança de Cândido o meu amigo se desiludiu ao experimentar as dificuldades do mundo. Como se sabe Cândido não chegou a rejeitar o otimismo de Pangloss para quem “tudo vai pelo melhor no melhor dos mundos possíveis”, mas substituiu-o por outro dizer: “devemos cultivar nosso jardim.” O homem de quem falo ficou entre os dois: não acreditava no melhor dos mundos e não se movia para cultivar nada. Desse modo viveu na casa que herdou dos pais e deixou de ir à rua. Uma irmã abnegada cuidava de trazer-lhe comida. Despediu-se do mundo silenciosamente. No enterro a irmã, o cunhado e eu que nunca deixei de acompanhar aquela rara experiência de vida.

Mas, ao meu múnus. Para mim o múnus tem sido um fardo pesado demais a carregar. Com o passar dos anos as forças já não são as mesmas, mas o fardo parece ganhar cada vez mais peso. Não sei se depois, no momento da morte, deixa-se o múnus para trás. Conheço uma mulher que acredita na continuação da vida após a morte, não só isso, mas no fato de que se continua a trabalhar no mesmo ramo ao se chegar ao outro mundo. Caso seja assim, o múnus será, Infelizmente, eterno. Mas, não é que se prega por aí que a morte é o repouso definitivo?

A ver.

Os “istas”

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Amigos é tempo dos “istas”. O sufixo “istas” é usado para caracterizar seguidores de uma pessoa, partido etc. Você reparou que de dias a este a mídia começou a falar mais intensamente dos “istas”? Pois veja: dilmistas, aecistas, campistas e marinistas. Esses são os “istas” da hora. “Istas” são legiões que acompanham os possíveis candidatos nas próximas eleições. Depois que Marina surpreendeu todo mundo aderindo ao partido de Campos “istas” de todas as cores passaram a se pronunciar. Há “istas” alegres, “istas” tristes, “istas” preocupados. O mundo é dos “istas” que a todo custo querem o poder.

Pois me lembrei de antigos “istas”. Aqui em São Paulo digladiavam-se em quase todas as eleições ademaristas e janistas. Jânio era o que era, o homem da vassoura. Professor de profissão entrou na política e subiu mais depressa que foguete. Ídolo arrastava atrás de si multidões inteiras que encantava com sua fabulosa oratória. Era um mestre na arte do convencimento, tipo diferente a quem não faltava um dedo de loucura. Chegou à presidência da República e surpreendeu todo mundo renunciando. Até hoje não se sabe ao certo o que levou Jânio à atitude que teve reflexos terríveis na vida do país. Seu vice João Goulart assumiu para depois ser deposto no golpe militar de 1964.

Adhemar era bem o que era. Fanfarrão, líder dos ademaristas a quem pregava o famoso “fé em Deus e pé na tábua”. Vi Adhemar num comício em cidade do interior. Era talhado para falar direto ao coração do povo. Prometia e apontava para a mulher, Dona Leonor, dizendo: “está aqui a Leonor não me deixa mentir”. Foi prefeito de São Paulo, governador, acusado de corrupção e a ele se atribuía seguir o famoso “rouba, mas faz”. Adversário de vida inteira de Jânio, Adhemar não se nega que foi político notável. Ainda que se condenem os meios que utilizava, não se pode ignorá-lo. Era do tipo que tem cara e coragem - há quem diga desfaçatez - coisa que hoje parece faltar demais à classe política.

Osvaldo Brandão quando técnico do Corinthians costumava dizer quando seu time estava em vantagem no placar: “agora é jogar o jogo”. Dilmistas, aecistas, campistas e marinistas: é hora de jogar o jogo. Quanto a nós assistiremos de longe as tertúlias dos candidatos que tão intempestivamente antecipam suas campanhas. Mas, o que chama atenção é o fato de que nenhum deles parece, até agora, reunir pelo menos um pouco da apaixonante magia que movia as campanhas dos velhos candidatos e seus “istas”. Comício era comício, sem gente cantando, olho no olho e isso não é saudosismo não.

19h26

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19h26. A comida simples sobre a mesa parece sempre igual aos olhos do menino. Tem o jiló que ele detesta, mas tem que comer um pouco porque criança deve ser obrigada a experimentar de tudo senão cresce cheia de mania.

A mesa de jantar - a mesma em que se almoça - fica na cozinha. É um espaço amplo no qual arde o fogo no fogão de lenha, há uma pia e, encostado na parede, o armário guarda-comida. O guarda-comida é envidraçado e deve ser mantido sempre fechado senão os mosquitos invadem atraídos pelo cheiro dos alimentos. Há o feijão que se requenta na hora das refeições, o resto do arroz que sobrou do almoço, umas folhas de alface num vasilha de alumínio e a carne salgada para não estragar. O ano é 1956, geladeira só em casa de quem pode.

O menino espera os pais e o irmão sentarem-se, a mãe serve o prato primeiro com verdura, só depois o arroz, o feijão e a mistura. O pai come depressa, o irmão parece um fauno atrás dos seus óculos de lentes grossas. A mãe é magra, fala bastante, reclama muito e acaba irritando o pai que emite um grito para que ela se cale. O menino pensa que vai começar de novo, afinal os dois brigam muito entre si, discutem sempre a mesma história do ciúme dela por ele ser tão mulherengo.

A luz é fraca porque a companhia fornecedora de energia é uma de Minas que parece não cuidar bem dos fios, isso é o que se diz. O menino engole como pode o jiló e logo passa ao arroz e feijão que são muito bons para encher abarriga. Comer depressa é o jeito de sair da mesa logo, fugindo da eterna disputa entre os pais que nunca vai ter fim. Quando termina, o menino corre até a pia, põe sobre ela o prato e enche um copo com a água da torneira. Bebe tudo e só então chega perto do pai para pedir 1 cruzeiro que é o preço  do docinho na padaria.

O pai resmunga, enfia a mão no bolso e, finalmente, passa ao menino a moeda. Hora de sair correndo, são 19h45 e a padaria fecha às oito.

Depois do doce - delícia açucarada - é matar o tempo pegando besouros para colocar dentro de caixas de fósforo. Besouro preso está montado o rádio que o menino encosta no ouvido para ouvir as rádios em ondas médias de lugares distantes.

Não são ainda 22h quando mãe sai à porta e o chama para dormir. Já na cama o menino pensa nos deveres da escola que não fez por preguiça. Amanhã, na aula, a professora que é uma mulher muito brava vai uivar, com sorte não ele tomará um tabefe pela falta. Mas, isso é problema do dia seguinte, agora é pegar no sono e sonhar os bons sonhos de menino.

Escrito por Ayrton Marcondes

13 outubro, 2013 às 7:59 pm

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Norma Benguell

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Sou do tempo da chanchada. Você que é jovem não viu, não riu. Ría-se do absurdo, de piadas que se espalhavam pelas ruas, caiam no gosto e na boca do povo. Oscarito e Grande Otelo: que dupla. E não adianta os intelectuais virem a público para dizer que chanchada é sinônimo de lixo. Tinha chanchada ruim, sim. Mas, as da Atlântida eram boas. E vieram o Ankito, o Zé Trindade e aquela mulherada que fazia a delícia da homarada sequiosa. Aliás, que tipo o Zé Trindade, não? Baixinho, meio esquisito com aquela voz estranha a repetir os bordões dele. Um deles era o tal “mulheres cheguei”, pode?

A primeira vez que vi a Norma Benguell foi na tela do cinema, numa chanchada em parceria com o Oscarito. Que mulher! Bonita como ela só, corpo escultural, delícia de se ver. Não se passou muito tempo para que ela ganhasse notoriedade nacional ao trabalhar no filme “Os cafajestes” do diretor Rui Guerra. Era um tipo de cinema diferente que antecipava o que viria a ser o cinema novo. Vinha na linha dos “Cahiers do Cinema” que nos anos 60 ditavam o modo de ser do cinema embora “Os cafajestes” não fosse inteiramente fiel às regras. E trazia a majestade do primeiro nu frontal do cinema brasileiro. Inesquecíveis as cenas de Norma Benguell nua correndo enquanto Jece Valadão dirigia o carro entre as ondas que quebravam na praia. Fazía-se ali história. Desafiava-se a moral vigente, a censura, o modo solene de ver a vida, jogando-se para baixo dos tapetes as perversões como se não existissem. O mundo era outro, era preciso manter as aparências a qualquer custo.

Agora que Norma Benguell morreu com mais de 80 anos de idade foi-me possível refazer, em parte, as emoções de principiante diante de uma inesperada nudez que contrariava o meu modo de ver o mundo naquele início da década de 60. Era outro o Brasil, outro o mundo, muito diferente deste em que hoje vivemos. Ainda não havíamos chegado à ditadura, a bossa nova caia no gosto das gentes e encantava. No país em que tudo parecia estar por acontecer aparecia a bela Norma que depois espalharia sua arte e encanto em filmes italianos e franceses.

Li que Norma Benguell reclamava da solidão no fim de sua vida. Os poucos amigos dela que compareceram ao velório censuraram a ausência de artistas, de tanta gente que trabalhou com ela e a conheceu. Na mídia fez-se questão de frisar a confusão econômica em que ela se envolveu com dinheiros que recebeu para produzir um filme. Nem todo mundo a tratou com o respeito devido a uma diva brasileira que fez parte do cotidiano e imaginário nacional ao longo de décadas.

Por isso, prefiro não levar em conta o último momento de Norma, este em que a doença corroeu seu copo e a morte a levou. Para mim Norma Benguell será sempre aquela mulher nua na praia e eu, se possível, o rapazote encantado com os olhos imantados à tela do cinema.

O suicídio do sequestrador

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Lembra-se daquele cara que prendeu três mulheres na casa dele e abusou delas durante 10 anos? O crime estarreceu o mundo. Quando uma das mulheres conseguiu, finalmente, chegar à porta e gritar pedindo socorro abriu-se para os vizinhos um período de espanto: como fora possível uma coisa daquelas acontecer na rua onde moravam - 10 anos de cativeiro - sem que ninguém jamais se apercebesse de nada?

Seguiram-se as histórias de sofrimentos inenarráveis relatados pelas prisioneiras tais como os espancamentos para provocar abortos em uma delas. Depois, a confissão do maníaco, evitando longo processo e a condenação à pena de morte para receber como punição a prisão perpétua.

Não durou muito tempo na prisão o sequestrador. Eis que o encontraram enforcado. Suicidara-se aquele que fizera prisioneiras durante 10 anos, mas não aguentara ele mesmo permanecer atrás das grades.

O suicídio do sequestrador de Cleveland colocou fim a uma história terrível, embora suas vítimas estejam condenadas a carregar para o restante de suas vidas as imagens das cenas de horror a que foram submetidas. Entretanto, parece não ser bem assim que as coisas se passaram porque surge agora a possibilidade de que o maníaco de Cleveland não tenha se suicidado.

Segundo se relata no momento em que foi encontrado morto o sequestrador de Cleveland tinha as calças arriadas. Suspeita-se que tenha se enforcado por acidente, pois estaria se masturbando no momento em que morreu. Considera-se a hipótese de que o maníaco estivesse praticando asfixia autoerótica que consiste na redução do aporte de oxigênio ao cérebro com a finalidade de aumentar o prazer durante o orgasmo.

Não sei se especialistas se interessaram em estudar a mente do maníaco de Cleveland. A ser verdadeira a possibilidade de que ele tenha se acidentado durante a masturbação o caso dele se tinge ainda mais de tintas macabras.

Há quem diga que o maníaco de Cleveland nem mesmo poderia ser considerado como verdadeiramente humano.

Vandalismo em açãovadalismo

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Acontece todo dia sob a forma de prolongamento de protestos. Determinada categoria de trabalhadores sai às ruas para protestar como acontece agora com os professores no Rio de Janeiro. Sem mais, nem menos aos que protestam se juntam vândalos cujo único intuito é agir violentamente, depredando o que acharem pela frente. A partir daí agências bancárias, telefones públicos, lojas, bancas de jornal, semáforos, vidros de qualquer espécie se convertem em alvos. Na batalha campal que se estabelece ninguém sabe exatamente quem é quem nessa história. A polícia reage e excessos são praticados. O mundo vem abaixo e parece não haver solução próxima para acontecimentos dessa ordem.

Vi imagens de um vídeo no qual um vândalo ensandecido atacou uma farmácia. Era de fato um louco, correndo, saltando até ser agarrado por policiais que tiveram muito trabalho para contê-lo. Mas, afinal, o que movia aquele espírito em fúria? Certamente, não protestava contra qualquer coisa, exercia livremente o vandalismo oportunista que acoberta ações de bandidos.

Também está na moda o incêndio de ônibus e virar carros. Protesto que é protesto parece não poder terminar sem cenas de agressão ao patrimônio particular e público. Desse modo movimentos de justas reinvindicações de algumas categorias passam a servir como estopim para atos de inexplicável vandalismo.

Entendo que o vandalismo em grupo se liga ao comportamento das multidões dentro das quais pessoas se despersonalizam a adotam um mesmo modo de agir.  O rapaz de invadiu a farmácia não faria aquilo caso estivesse sozinho. Era movido pelo sangue quente de um grupo enfurecido no qual a ação de um homem serve de estímulo para a ação de outro. No fim das contas a certeza de impunidade funciona como termômetro das ações irresponsáveis.

O tempo anda bom para os radicais que se mostram melhores na prática do que em teoria.

Biografias censuradas

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Você gostaria de ser biografado? Essa pergunta pode ser irrelevante caso você seja uma celebridade. O fato é que certas pessoas se destacam em suas atividades, tornando-se conhecidas a ponto de suas trajetórias despertarem interesse. Atores, cantores e compositores despertam atenção e podem amealhar legiões de fãs. No caso de artistas famosos acontece de não poderem sair à rua dado o assédio de seus fãs. As pessoas se identificam com seus ídolos, vestem-se como eles, passam noites inteiras em filas em busca do ingresso para shows, compram CDs, etc. Verdadeira religião se estabelece em torno de personalidades públicas que são elevadas a patamares diferenciados, acima do comum dos mortais. Escritores, políticos, esportistas, profissionais de televisão, modelos, enfim toda sorte de gente que é notícia não escapa à verdadeira fome por novidades a respeito de suas vidas.

É grande o interesse do público em relação a tudo o que acontece com seus ídolos. Revistas que trazem notícias e fotos de pessoas famosas, programas de TV, enfim tudo o que diz respeito às celebridades é consumido com avidez. Biografias que prometem trazer detalhes sobre a vida das mesmas celebridades são sempre bem vindas dado o interesse que despertam.

Nos países democráticos a liberdade de expressão é garantida subentendendo-se que biografias possam ser livremente publicadas. As leis em vigor protegem o biografado nos casos em que se sinta ofendido ou caluniado. Cabe aos biógrafos o compromisso com a verdade e  a seriedade em seus trabalhos. De todo modo gozam os biógrafos de liberdade de expressão, obviamente estando cientes de suas responsabilidades em relação aos trabalhos que produzem e publicam.

De tudo o  que  se disse acima pode-se concluir que nada impede ao biógrafo que trabalha em países onde existe  liberdade de expressão de escrever e publicar biografias sobre pessoas que a seu ver merecem a sua atenção. Entretanto, verifica-se no Brasil o estabelecimento de polêmica em relação a publicação de biografias: só podem ser publicadas aquelas que tiverem prévia autorização das pessoas biografadas.

A partir desse fato destacam-se dois grupos cujos interesses são opostos. De um lado os escritores que propugnam pela liberdade de expressão, ou seja, entendendo que a publicação de biografias não carece do consentimento das pessoas biografadas. De outro as celebridades que se movimentam no sentido de proteção de suas imagens, exigindo que só venham a público biografias autorizadas.

Nos últimos dias personalidades importantes do mundo da música divulgaram suas adesões em favor de biografias autorizadas. O fato não deixa de ser interessante num país que até 1985 enfrentou a censura que tolhia completamente a liberdade de expressão. Mais curiso ainda o fato de que alguns do que hoje se colocam a favor da autorização terem sido no passado justamente censurados por suas obras,  sendo alguns deles  verdadeiros baluartes na luta contra a ditadura.

Alguém me lembra de que os homens são assim mesmo, navegam sempre em acordo com seus interesses. Talvez seja demais dizer isso em relação  aos famosos que exigem a autorização, mas que não deixa de ser estranha a posição deles isso não se  discute.

Não sei dizer se…

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Caro amigo confesso que não entendi bem o seu e-mail. Sinceramente, não sei dizer se você tem ou não razão. Você reclama do mundo como está, do desencontro entre os homens. Ninguém se entende! Compara a atual sociedade humana a uma dessas experiências realizadas em laboratório nas quais animais são confinados em espaços delimitados e se oferecem quantidades insuficientes de alimentos. No fim a fome fala mais alto e surge até mesmo o canibalismo.

Digo que não entendi bem porque para mim o que acontece hoje não difere muito da história passada. O homem é de fato um animal que domou a custo seus piores instintos, mas a vida em sociedade domesticou a maioria de modo que me parece exagero a sua comparação com sociedades de animais confinados. A ideia de que estamos confinados num planeta que a todo o momento emite sinais de esgotamento de seus recursos também deve ser analisada com cautela. Lembre-se de que a ciência progride e o espaço sideral armazena riquezas que talvez no futuro o homem consiga alcançar. Para ficar só num exemplo um só asteroide armazena minérios em quantidade superior a tudo que se extraiu e utilizou na Terra durante toda a existência da civilização. Repare, ainda, na possibilidade de aquisição de isótopos que permitiriam a obtenção de quantidades inimagináveis de energia por fusão, isso sem o perigo de emissões radioativas.

Meu amigo o homem de hoje não é diferente, em essência, do guerreiro da época das cruzadas, dos que combateram na Guerra dos 100 anos, nem daqueles que se trucidaram nas duas guerras mundiais. Aliás, me parece que a despeito de tantas coisas terríveis que marcam a passagem do homem pelo planeta pode-se dizer que, de certo modo, houve uma evolução.  A verdade é que se teme globalmente o perigo de guerras totais e, no fim das contas, acaba-se sentando em torno de uma mesa para discutir algo que não é a paz, mas pelo menos arremedo dela.

Por essas razões não posso concordar com o seu pessimismo embora me faltem argumentos concretos para dizer que você está errado. Um dia talvez tudo se acabe e a civilização humana venha a desaparecer sem deixar vestígios. Mas, mesmo isso parece distante demais para que no curto período de nossas vidas nos deixemos levar por interrogações que nos conduzem a respostas funestas. Não sei mesmo dizer, portanto, se você está certo ou errado embora grosso modo me pareça que a sua visão mais se aproxime dos erros que dos acertos.