2012 maio at Blog Ayrton Marcondes

Arquivo para maio, 2012

A seca

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Lemos com alguma indiferença as notícias sobre a seca no Nordeste. Estamos no Sudeste, chove há três dias e pedimos para que a chuva pare, afinal tudo se complica com essa aguaceira a começar pelo trânsito.

O Brasil é grande, tão grande que as regiões distantes parecem pertencer a outro país. Seca no Nordeste? Ou na Indochina? Não, é aqui mesmo, no nosso continente, no nosso país, bem perto de nós, influindo na pele da nossa gente, de pessoas como nós mesmos.

As notícias sobre a seca são péssimas. Compara-se a seca atual à grande seca acontecida 47 anos atrás. Vários Estados estão sendo assolados pela falta de chuvas. Na Bahia mais de 200 municípios estão em situações de emergência. Mas, os especialistas alertam que ainda não é possível mensurar a extensão da estiagem até porque ela ainda está em andamento.

Os ciclos de seca no Nordeste não têm data marcada para acontecer. Relatos históricos falam sobre a grande seca acontecida entre 1877 e 1879 na qual teriam perecido 500 mil pessoas, vitimadas pela fome, sede e doenças. A seca de 1970 protagonizou a grande evasão de nordestinos que deixaram suas casas para tentar a sorte no Sudeste e Sul do país. E por aí vai.

Ontem vi, pela TV, imagens da seca. Pessoas empobrecidas em cujas faces lê-se, mais que desespero, a desesperança. Animais - os poucos sobreviventes - magros, deitados sobre as patas e sem forças para se levantarem. Então me lembrei do sertão da Bahia por onde circulei em meio à década de 1980. Voltou-me a inquietação diante de tantas vidas sem horizonte, passadas entre a trama de galhos secos das árvores da caatinga, poços sem água, sol inclemente, palmas, mandacarus, lagartos, cobras, solo seco, casebres, estradas de terra vermelha, casacos de couro curtido e gasto, facões na cintura e, uma vez na semana, o caminhão pipa de alguma prefeitura trazendo a água racionada para os lugarejos. Poeira. Nenhuma gota d`água vinda do céu. E eu me perguntando por que, afinal, aquelas pessoas continuavam ali, sem nenhuma perspectiva, sem futuro, vítimas da seca, de terem nascido num outro Brasil que desconhecemos e para o qual preferimos fechar os olhos.

Não é possível ficar indiferente às notícias sobre a seca, sobre a grande seca que mais uma vez assola e destrói a vida de brasileiros.

Vem à minha memória a imagem de uma vaca pendurada com cordas numa árvore. Magra. Tristonha, abatida, ali estava a vaca que não se incomodou nem um pouco com a minha presença. Mas, por que penduraram a vaca a uma árvore? - perguntei. Então veio o dono da vaca explicar-me que assim faziam por lá porque se o animal se deitasse, se as pernas arqueassem, ele não mais se levantaria. Era o esforço do dono para salvar o seu animal. Era a seca.

Ruas vazias

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Dia das mães. Tarde fria, céu encoberto, ruas vazias em São Paulo. Para onde foram todos?  Ando pela rua onde fica o Instituto Biológico, região próxima ao Parque do Ibirapuera. De repente, de uma travessa, saem três sujeitos com ares de poucos amigos. Arrepio-me. Eles vêm na minha direção, em sentido contrário ao meu, na calçada.

Trata-se de situação inusitada.  Não há ninguém por perto, nenhum som e raciocino que nada poderá me salvar. Ponho a mão no bolso da calça, apalpo as poucas notas de dinheiro que talvez venham a servir como passaporte para que eu continue vivo. Repito as instruções dadas pela polícia: não discutir, entregar tudo e, principalmente, não reagir.

Agora os três estão bem perto. Não têm mesmo eles jeito de gente pacata. Aquele do meio, mais velho, será ele o chefe? Estarão armados? Corro perigo de morte?

Num minuto os três estão bem à minha frente. É agora, penso. Entretanto, os três homens me ignoram. Passam por mim sem se dar conta da minha presença. Prosseguem, conversando animadamente.

Depois que passam, reparo que estou suando frio. Não se interessam por mim? Adivinharam que trazia comigo pouco dinheiro e não valeria a pena uma abordagem? Ou, simplesmente, não seriam bandidos?

No restante do trajeto até a casa onde vou almoçar com familiares eu me recrimino pelo mau juízo em relação aos três homens. Vestiam-se com simplicidade, é verdade. Tinham certo jeito arrogante de quem está no comando do pedaço e podem fazer o que lhes der nas telhas. Mas, não eram bandidos e me ponho a pensar na grande pressão que a violência excessiva faz sobre nós. De fato, não ouvimos coisa diferente que uma montanha de crimes terríveis que nos deixam de queixos caídos. A maldade humana parece ter-se extravasado ao limite de nossa tolerância. Daí que cada pessoa pode, pelo menos potencialmente, ser um inimigo, alguém determinado a nos atacar.

Tudo isso me passa pela cabeça, mas nem assim me perdoo pela enorme fraqueza e julgamento precipitado.

Aconteceu ontem. E era o “Dia das Mães”, o mundo parecia em paz, exceto por alguns instantes, no meio da tarde, numa rua deserta, na minha cabeça.

Fotos proibidas

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A semana que termina foi bem agitada. O noticiário político pautou-se pelas idas e vindas da CPI do Cachoeira, assunto  que ainda vai dar muito pano pra manga. Hoje se noticia que o PT desistiu de convocar o Procurador Geral da República para depor na CPI. O partido estava sendo acusado da intenção de constranger o procurador que, no momento, está envolvido com as denúncias do mensalão. Talvez por isso tenha desistido, de vez que com a atuação da mídia fica difícil encobrir outros interesses.

Também se festeja a indicação, pela Presidente da República, dos membros que farão parte da “Comissão da Verdade” cuja missão é esclarecer crimes praticados durante o período da ditadura. Colocando-se como premissas o respeito à Lei Geral da Anistia e a total ausência de revanchismo, o certo é que está mais que na hora de se colocar um fim nesse assunto pelo qual, ainda hoje, muita gente sofre.

O terceiro assunto que chamou a atenção foi o da queda do helicóptero na qual morreram policiais e o suspeito da prática de sete degolamentos em Goiás. Até agora não se sabe se o suspeito agiu sozinho e as razões que o moveram aos crimes de vez que ele, antes de morrer, apresentou mais de uma versão para os seus atos. Quando o helicóptero caiu os policias voltavam, com o suspeito, da reconstituição dos crimes. Mas, a polícia promete continuar a investigação no sentido de descobrir se mais alguém está envolvido com as degolas.

Mas, o grande assunto da semana foi o do roubo e divulgação, pela internet, de 36 fotos íntimas da atriz global Carolina Dieckmann. Não se sabe bem, até agora, como as fotos foram surrupiadas do computador da atriz. No meio da semana o advogado da atriz informou que ela foi vítima de tentativa de chantagem. Em outro momento divulgou-se que a atriz pretende processar o Google por não retirar s fotos de seu site, permitindo que os internautas as acessem. Briga judicial boa, mas que parece inútil porque todo mundo já viu as fotos, os maníacos por fotos de mulheres nuas já as baixaram em seus computadores e, daqui a alguns dias esse assunto terá sido esquecido.

Todo mundo sabe que na internet proliferam fotos de mulheres nuas. Basta digitar num site de buscas “mulher nua”, “bundas” ou qualquer outra coisa relacionada ao assunto para que, na hora, se obtenham inúmeras imagens. Isso sem falar em sites pornográficos que exibem vídeos de prática de sexo e assim por diante.

Isso quer dizer que Carolina Dieckmann não acrescentaria nada a esse universo se ela não fosse exatamente Carolina Dieckmann, ou seja, uma celebridade. O fato é que existe uma compulsão pública em relação ao que fazem as celebridades do momento, compulsão essa alimentada pelos meios de comunicação. Existem por aí centenas de paparazzi que outra cosia não fazem que tentar surpreender alguém famoso fora das telas. No fundo parece que o que está em jogo é uma confusão entre o culto à imagem e a tentativa de desmistificá-la.  A atriz que entra nas nossas casas através da televisão torna-se acessível, humana, igual ao comum dos mortais, quando surpreendia fora dela.  Isso sem deixar de lado a simples curiosidade.

Enfim, Carolina Dieckmann está mesmo é pagando a conta por ser uma celebridade, por transformar-se em ícone dentro das telinhas. A necessidade pública de ícones e a fome pela vida das celebridades sempre existiu e existirá, embora tenha crescido muito com a facilidade de se espalhar fotos e fofocas nessa infernal e crescente teia de comunicações.

A ver no  que isso vai dar.

O Chico

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O Chico morreu há alguns anos, vitimado por enfarte fulminante. Não consta que até então estivesse doente ou sofresse de algum mal. Coração tem dessas coisas, obedece ao previsto no DNA da gente sobre a hora de parar. Hoje em dia, com os novos recursos da medicina, tornou-se possível enganar o órgão: em casos muito graves e mesmo perdidos o transplante é a solução. Isso sem falar nos rotineiros implantes de safena que revigoram corações tecnicamente falidos.

Os médicos não se cansam de avisar sobre os perigos do fumo, mas vício é vício e muita gente não consegue safar-se dele. Conheço pessoas safenadas que voltaram a fumar tempos depois da alta hospitalar. Não sei dizer se é de desapego à vida ou incontrolável compulsão pelo cigarro. Tenho para mim que em matéria de parar de fumar, não existe outro remédio que não a decisão firme. Cheguei a fumar três maços de cigarros por dia até que, certa ocasião, disse não. Enfrentei o diabo a partir daí. Comprei maços de cigarros e espalhei pela casa porque senão seria tentado a ir busca-los. Era guerra diária, nervosismo, luta terrível na qual o que conta mesmo é vencer um dia de cada vez. Durante uns dois meses eu repetia inutilmente o movimento de colocar a mão no bolso, procurando o cigarro. Força do hábito, aliás perdido devagar e custosamente.  Depois de um ano eu ainda sonhava que estava fumando e tinha enorme prazer nisso. Mas, passou. Até hoje, decorridos vinte anos desde que abandonei o fumo, não coloquei um cigarro na boca. Tenho certeza de que me bastará apenas um, unzinho só, para que eu saia de casa e vá à padaria da esquina para comprar um maço.

Falo sobre cigarros, mas o meu assunto é o Chico. Bem, ele não fumava. Viveu na placidez de uma cidadezinha montanhosa da qual, a bem da verdade, nunca saiu. Herdeiro de terras fez os seus negócios e, se não chegou a ser rico, viveu com folga. Era comum vê-lo saindo de suas terras onde criava poucas cabeças de gado e mantinha plantações. Casou- se tarde e deixou, quando morreu, a viúva sem filhos. Mas, o que mais chamava a atenção nele era o curioso hábito de comprar coisas e estocá-las. O Chico tinha alguns fogões, geladeiras e outros eletrodomésticos que nunca chegou a tirar da caixa. Comprava-os como investimento. Tinha também um s poucos veículos, entre eles um caminhão.

Nunca entendi bem a lógica em manter um televisor dos anos 60 bem guardado na caixa, sem nunca ter sido usado, décadas a fio. Fazia sentido para o Chico que teria forma diferente de olhar essa vida.

Cada um tem direito a uma parcela, pequena que seja de esquisitice. O Chico tinha a dele, ininteligível para mim.  Eu gostava muito do Chico e senti demais quando ele morreu.

Saudades do Chico que, vez ou outra, prestava serviços de transporte de pessoas com o seu carro, embora não prestasse, habitualmente,  serviços de táxi. Saudades de um bom sujeito que morreu cedo, talvez por descuido, ou simples distração.

Escrito por Ayrton Marcondes

11 maio, 2012 às 11:32 am

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Por dias melhores

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É verdade que as coisas estão melhoradas no Brasil. Negar avanços fica do jeito que gostam os caras eternamente do contra para quem a cada novo dia há um abismo a se transpor. Os grandes problemas do país continuam a existir, sim, mas, cá entre nós, onde é que nesse mundo de Deus não existem problemas?

Entretanto, haja paciência para se conviver com escândalos. Parece até que o normal seja o aparecimento de um escandalozinho a cada semestre, isso para animar as conversas e dar assunto aos cronistas de plantão. Mas, para o cidadão, o cara que dá duro na vida, o que trabalha e de quem se exige que faça tudo certo, para esse o que passa é que não dá para aguentar tanta história de desfaçatez.

Acontece que não sabemos no que e em quem acreditar. Imagine um país em que uma CPI seja instaurada com regras estranhas e com a finalidade de roubar atenção ao julgamento de outro grande escândalo que há anos se arrasta nos meandros da Justiça. Essa situação não se assemelha àqueles roteiros enrolados de filmes norte-americanos nos quais você fica sem saber quem é do bem e quem é do mal? O que nos leva a perguntar: quem, afinal, neste Brasil é do bem e quem é do mal?

Pois aí está o Procurador Geral da República negando-se a comparecer á CPI do Cachoeira porque entende que o que querem mesmo é desviar a atenção sobre o próximo julgamento do mensalão. Também corre a notícia da intenção de converter a CPI em “CPI da imprensa”. E por aí vai. Quanto a nós, meros espectadores dessa balbúrdia diária, organizada com o nosso rico dinheirinho, o que nos resta é trabalhar para o bem do Brasil (e do nosso).

Assim passam esses dias que nos fazem sonhar com um porvir mais calmo, os tais dias melhores que talvez nunca venham a se consumar. Dias de boas notícias, de consenso, de justiça feita, das coisas em seus devidos lugares, bandido na cadeia, gente boa em cargos públicos etc.

Mas, o bom é que não se perde a esperança. A esperança está no DNA dos brasileiros, daí sobrevivermos a todas as desgraças.

Milagres acontecem, não é verdade? Então, quem sabe, a longo prazo, num futuro não tão distante…

Escrito por Ayrton Marcondes

10 maio, 2012 às 12:25 pm

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Mães e filhos

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Uma mulher é chamada à polícia após seus dois filhos pequenos – o menor com três anos de idade – terem sido deixados por ela, sozinhos, em casa. A denúncia partiu de um vizinho, penalizado com a situação as crianças. Agora as crianças estão num abrigo. Na polícia a mãe explicou que não tinha com quem deixar as crianças de vez que o pai está preso e ela começou a trabalhar como cobradora de ônibus. Disse, ainda, que não aguentava mais ver os filhos passarem fome e não ter nada para dar a eles.

As imagens do interior do apartamento onde mora a família são impressionantes. As crianças vivem, com a mãe, em condições subumanas.  Sujeira total, lixo acumulado, roupas sujas. As crianças dormem sobre um colchão sujo.

É bom lembrar de que o fato acontece na cidade de São Paulo, maior centro do país no qual, como em outras cidades, convivem a riqueza e a miséria absoluta. Por que é muito difícil encaixar nos padrões do bom senso a terrível história dessa família desmoronada. Pai preso, mãe e filhos em condições para lá de lamentáveis. Quem é o grande culpado nessa história? O pai preso? A mãe pelo desleixo? Os filhos por apenas existirem?

Ficam as imagens que não gostamos de ver, mas que acabam entrando em nossas casas inesperadamente. Chegam pela TV, abalam o nosso conforto e a placidez do café da manhã.

No próximo domingo será comemorado o Dia das Mães. Os filhos se reunirão com as mães no tradicional almoço em família. Tudo será como sempre. Até lá já teremos esquecido o pai preso, a mãe cobradora de ônibus e as crianças recolhidas a um abrigo.

Afinal, a vida é assim mesmo, não?

Crise internacional

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Nessa história toda de crise internacional o que resta ao cidadão comum é torcer para que as coisas sigam bem no país. Na verdade, por mais que se acompanhem as idas e vindas da economia, por mais atenção que prestemos aos noticiários sobre o andamento da crise na Europa e a lentidão da recuperação dos EUA, o fato é que não sabemos em quem e no que acreditar. No Brasil o governo anterior vangloriava-se pela situação do país que estaria imune à crise.  O atual governo baixou um pouco o tom da alegria, mas bate na mesma toada, embora sinais da crise estejam batendo às portas do país.

O grande problema em relação à crise está no fato de que não só não existe consenso sobre a solução como, em verdade, não se sabe bem o que fazer. Na Europa a bola da vez é a Grécia, acompanhada de perto pela Espanha. Sobre a Grécia ouvimos de tudo, na maioria das vezes que lá falta trabalho e as mordomias imperam. Para resolver os problemas desses e de outros países entra na moda uma palavra: austeridade. De repente, da noite para o dia, a austeridade passa à condição de remédio inquestionável para os problemas econômicos dos países. Há quem discorde, afirmando que austeridade só não basta e aí começa uma longa discussão de medidas gerais e locais para o saneamento das finanças dos países.

Estamos, pois, no meio disso. Lembro-me de que desde que me conheço por gente a palavra crise faz parte do meu cotidiano. O Brasil sempre esteve em crise, levando-nos a perguntar por que pagávamos altos juros ao mundo desenvolvido, isso às custas de nossos suores. Isso mais o fato de que o mundo tinha sempre o dedo apontado para o Brasil, exigindo-se que o país se emendasse, se corrigisse, era de arrebentar com os miolos. Agora a situação mudou, o Brasil passou de subdesenvolvido à condição de emergente, emprestador de dinheiro ao FMI, etecetera e tal. Mas, aqui dentro, longe do distante olhar de estrangeiros que nos aplaudem, sabemos que as patas do gato ainda não estão boas, daí ele andar meio aos solavancos porque a pobreza ainda é grande, o mesmo se dizendo da violência e da corrupção.

Mas, a crise tem derrubado líderes em vários países, fato que representa um não das populações à situação atual e o depósito de crédito em novos dirigentes que talvez possam melhorar a situação. Ontem foi a vez do presidente francês, Nicolas Sarkozy, ser derrotado nas eleições do país. Venceu um socialista, François Hollande, que já na próxima semana assumirá o governo. Trata-se do primeiro socialista a comandar o país desde 1995 quando o presidente era François Miterrand.

Hollande terá muito trabalho pela frente. Terá que contornar a crise econômica, controlar os gastos públicos e dar um jeito no desemprego. Se ele conseguirá ou não é outra história. O que vale agora é a ideia de mudança, a expectativa de sair do sufoco, enfim a esperança em dias melhores. Nisso os franceses têm muito a aprender com os brasileiros, povo que aposta no futuro e para o qual a esperança é e sempre foi uma muleta que nos fez e faz seguir em frente.

Idade e suas consequências

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O mundo do futebol declara-se indignado com a atitude tida como despótica atribuída ao presidente do São Paulo FC.  O presidente agiu diretamente na área do futebol, retirando da concentração um jogador que falhara no jogo do último domingo. A falha abriu caminho para a derrota do São Paulo, dai a punição aplicada pelo presidente do clube.  Essa medida afetou o técnico e o time de futebol que na mesma noite tinha jogo muito importante pela Copa do Brasil. Agora a derrota do São Paulo nesse jogo está sendo, pelo menos em parte, atribuída à atitude do presidente que teria contribuído para desestabilizar emocionalmente o time.

Desse assunto estão tratando os noticiários esportivos e torcedors, falando-se até mesmo sobre a humilhação infringida ao jogador que, aliás, estava escalado pelo técnico para jogar. Em meio aos falatórios chama a atenção o que atribui o ato do presidente à idade: avançado em anos já não reuniria ele condições para o exercício do cargo, daí as atitudes não acertadas que têm tomado.

Ninguém ignora a vala comum na qual se procura lançar tudo aquilo de inesperado e desacertado praticado pelos “velhos” , ou seja, aquelas pessoas que pertencem à tal “melhor idade” que de melhor não tem é nada. Então, assim parece, torna-se mais fácil explicar atitude que se julga condenável através de algum tipo de falha de comportamento atribuída à idade. Mais: em assim sendo torna-se mais que lógica a substituição do presidente que, em poucas palavras “já deu o que tinha que dar” e, portanto, não se mostra confiável para o cargo que ocupa.

Como se vê atrás de uma atitude errada e absurda - a ter sido como se relata – imputa-se a velhice como motor da ação. O que nos leva a perguntar se acaso devem ser impostos limites baseados na idade para exercício de cargos de comando.

A atitude do presidente do São Paulo desagradou muita gente e talvez tenha mesmo repercutido no rendimento do time no jogo contra a Ponte Preta.  Mas, provavelmente terá sido ela produto do modo de ser do presidente. Seria ingênuo, senão erro de julgamento ou até má fé, atribuir o afastamento do jogador à idade do presidente.

Baby Boomers

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Pois é, sou um boomer.  Se você não sabe boomers são os caras nascidos entre 1943 e 1960. Geração boomer, portanto, que sucedeu á geração silenciosa (de 1925 a 1942) e foi sucedida pelas gerações X (de 1961 a 1981), Y (de 1982 a 2000) e Z (de 2000 até hoje).

Cada geração tem as suas marcas, melhor dizendo características padrões. Os  boomers nasceram no auge da Guerra Fria e viram a  conquista da Lua; seus perfis são indicados como liberais, contestadores e espiritualizados;  o cinema dos boomers é o dos anos 60 e a era a do LSD. Então não adianta resistir a ser classificado em grupo ou o que seja porque você simplesmente não pode fugir aos estereótipos da época em que nasceu.

Entretanto, confesso que não me sinto inteiramente boomer. Mesmo deixando de lado o discutível jeito de ser – contestador, liberal, espiritualizado – o fato é que me sinto comprometido com a geração anterior à minha, bastando lembrar a minha inclinação mais pelo rock que pela música do Beatles, esses posteriores à era de Elvis Presley. Bem entendido, isso naquela época porque mais tarde passei a adorar os Beatles. Mas, isso já é outra história. Agora, de jeito nenhum eu me enquadraria na geração X constituída por pessoas caracterizadas como individualistas e pouco idealistas.

Bem, não sei bem para que serve essa caracterização como boomer ou como pertencente a qualquer geração.  Concordo que cresci num mundo pós-guerra em que o Brasil era pouco mais que nada entre as nações do mundo. Do que me lembro é da total submissão aos interesses dos EUA que faziam e desfaziam na América Latina. Quando eu era rapaz os artigos importantes do jornal “O Estado de São Paulo” eram assinados pelo James Reston, jornalista norte-americano, por aí pode se formar ideia de como as coisas se passavam então (escrevo isso e me dou conta de que só muito recentemente a colonização norte-americana começou a perder força).

A Guerra Fria foi o que foi. Naturalmente torcíamos pelo “nosso bloco” de vez que o comunismo nos era apresentado como o pior dos mundos. Isso até tomarmos consciência, rapazes que éramos, de que as coisas não eram bem do jeito que falavam. De todo modo os russos eram assustadores e Nikita Krushov um líder fanfarrão que metia medo. A toda hora se falava em guerra nuclear que acabaria com o mundo e isso, naturalmente, por culpa dos russos. Surgiam os norte-americanos como os salvadores da humanidade, dos “nossos” interesses.

Boomer que é boomer sabe disso e viu com interesse a corrida espacial, vibrando com a chegada dos americanos à Lua. Mas, no que toca aos assuntos internos a minha geração foi mesmo é tolhida de opinião devido ao regime militar pós-64. Odiávamos o regime sem ter muita noção de como participar para que ele um dia terminasse. Falávamos em voz baixa sobre política porque era perigoso, de repente você poderia ser confundido com algum extremista.

Tenho para mim que a minha geração foi politicamente tolhida daí essa crise no mundo político que hoje se observa. Grande parte dos boomers desviou sua atenção para atividades fora da política e o país perdeu uma geração de futuros líderes. Acho que se quisermos mesmo caracterizar os boomers brasileiros, o caminho é bem diferente dessa padronização proposta. Os boomers brasileiros são os caras que não influíram devidamente na formação do país, tolhidos que foram da iniciação política na época em que frequentavam os bancos escolares.

Dia do Trabalho

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O feriado de 1º de maio marcha para o seu final. Na TV notícias sobre o movimento nas estradas, como sempre com imagens de grandes acidentes com vítimas. Morre e nasce gente o tempo todo no mundo, mas dói assistir à bestialidade que rouba a vida de tantas pessoas no trânsito.

O Dia do Trabalho é comemorado com descanso. Neste ano de 2012 coincidiu de ele cair numa terça-feira, daí que a segunda serviu a uma emendada geral. Entretanto, o tempo não ajudou em várias partes: choveu muito, estragando pelo menos em parte a folga da turma que, com seu sangue, suor e lágrimas leva o país nas costas. Junte-se à chuva a onda de frio que está provocando as mais baixas temperaturas do ano até agora.

Houve tempo em que me parecia grande demais o número de feriados no país. Irritava-me o espírito alegre da população, sempre disposta à comemorações. Assim, por qualquer razão, não se trabalhava. Isso contrastava com a situação do país imerso em dívidas impagáveis e marejando em meio a uma inflação galopante. Hoje mudei de ideia e não porque a economia melhorou. É que, com o passar do tempo, vai-se notando como a vida é breve e até mesmo sem muito sentido. Enroscamo-nos em lutas terríveis, crentes na veracidade das nossas opiniões. Mas, depois dos 50 anos de idade, esse espírito revanchista é amortecido porque, devagar, nos apercebemos da realidade e ensaiamos dar o valor devido a cada coisa. Enfim, se a vida passa, que tal comemorar os bons momentos? Pois que venham os feriados.

Aliás, em matéria de comemoração bem mesmo está pessoal de Cascavel, no Paraná. Imagine que para festejar o Dia do Trabalho na cidade paranaense se realiza um churrasco com 17 toneladas de carne para atender a 15 mil pessoas. Essa festa acontece a 46 anos, sendo realizada pelo Seminário Diocesano São José. Trata-se da maior churrascada realizada no Brasil num único dia segundo informam os organizadores os quais já falam em transformar o evento em festa nacional e chamar o Guiness Book.

Do dia de hoje apenas me ficou a imagem de um homem em cima do telhado de uma casa, trocando telhas para evitar vazamentos. Quando o vi, ao longe, pensei que afinal os feriados não são para todo mundo, existe a turma que se ocupa o tempo todo, até mesmo no Dia do Trabalho. Então me vieram imagens de outros tempos, da grande trabalheira sem folgas em que muitas vezes me vi metido, mas depressa fugi dessas lembranças que me levariam a outras, talvez desagradáveis.